domingo, 4 de novembro de 2012

A 'BANDA GÁSTRICA'

Tal como os seres vivos, as nações nascem, crescem e morrem

Quando jovens expandem a sua potência, não raro alargando o seu espaço vital para novas terras e outros continentes. Quando velhas ou enfraquecidas, tornam-se hedonistas e o resultado são amputações e a voragem da fruição de todos os prazeres e vantagens materiais, como se de direitos naturais se tratasse. E morrem, dando lugar a outras.

Isto ensina a Geopolítica.

A força, a dureza de carácter e a resistência são substituídas por fraqueza, pelo relativismo, pela rejeição de responsabilidades na cadeia de gerações de que se é, apenas, um elo.

Há 38 anos Portugal ficou reduzido a 4% do seu território, perdendo as riquezas naturais que lhe poderiam assegurar a viabilidade e a verdadeira independência no concerto das nações. Reduzido às fronteiras do século XIV, quase um Estado exíguo, pareceu depois o regresso à Europa o novo desafio que reinventaria a Nação Portuguesa.

Não soubemos aproveitar a oportunidade.

Ao invés de apostar no desenvolvimento tecnológico, na indústria de ponta e numa agricultura e pescas competitivas, muito devido à falta de visão das nossas elites, às características e ao escasso nível de especialização do nosso povo e ao próprio atraso geral do País, preferimos deixar destruir a economia nacional, ao mesmo tempo que criávamos uma gigantesca despesa pública e distribuíamos direitos a rodos como se os não tivéssemos um dia de pagar.

E foi assim que, pela terceira vez em menos de 40 anos, entrámos em bancarrota, impedidos de continuar a gastar mais porque já ninguém confiava que o Estado Português pagasse a enorme dívida que contraiu.

Os únicos estrangeiros que aceitaram dar a mão a Portugal – a mal amada troika – exigiram, como condição para nos emprestar o dinheiro de que desesperadamente precisamos, que o Estado pusesse uma ‘banda gástrica’, isto é, que reduzisse substancialmente o seu peso. E, por muito que custe, a exigência tem sentido, ou não consumisse este Estado gordo e anafado mais de metade da riqueza anualmente produzida no País e muito além dos impostos cobrados.

Claro que 80% dessa despesa se refere a uma panóplia de ‘direitos’ na saúde, na educação e na segurança social, muitos dos quais criados ao longo de décadas por sucessivos governos como forma de comprar o voto dos eleitores. As reformas inflacionadas relativamente à efectiva carreira contributiva, o rendimento mínimo garantido, a gratuitidade de medicamentos para idosos (medida demagogicamente aprovada antes das eleições de 2009 e retirada a seguir ao voto), bem como a gratuitidade do ensino secundário, são expressivos exemplos dessa demagogia que nos arruinou.

Agora, não cortar na despesa pública é condenar o nosso futuro colectivo e, pior, o das novas gerações. Assume, por isso, especial gravidade a atitude daqueles que recusam discutir ou contribuir para a sustentabilidade do designado Estado social, já que a consequência de tal atitude será o corte de todos ou quase todos os direitos aos nossos filhos.

É certo que, numa primeira fase, o actual Governo optou principalmente por aumentar os impostos ao invés de diminuir estruturalmente as despesas, sendo certo que também as reduziu já em largos milhares de milhões de euros (só na Saúde foram cerca de mil milhões), ao contrário do que alguns pretendem fazer crer. Mas o que sucederia se, logo em 2011, o Governo tivesse proposto uma redefinição séria das funções do Estado? No mínimo caía o Carmo e a Trindade, a julgar pelas reacções ao projecto de revisão constitucional que, há pouco mais de dois anos, uma equipa liderada por Paulo Teixeira Pinto preparou para Passos Coelho.

De resto, é fácil dizer-se que o aumento de impostos falhou. Mas, pergunta-se novamente, que sucederia se esse aumento não ocorresse? Como estaria o País se o défice estivesse nos 10% ou ainda acima? Será que quem nos emprestou dinheiro o teria continuado a fazer? Haja pois um mínimo de seriedade.

A verdade, agora, é que precisamos de reformar estruturalmente o Estado, definir quais são as funções que este deve assegurar, quais as que pode partilhar com a sociedade e quais ainda aquelas que deve simplesmente abandonar.

Não contribuir para este urgente debate nacional é simplesmente trair Portugal. Se de comunistas e bloquistas não tenho dúvidas, será verdadeiramente dramático se o PS continuar a sua deriva populista, irresponsável e de terra queimada. É que é disso que se trata quando se não apresenta qualquer ideia séria para a necessária reforma global do Estado ou o tão propalado crescimento económico.

E não se duvide: ou o Estado gasta menos ou teremos de pagar ainda mais impostos. É que não podemos mais continuar a viver de crédito malsão, como sucedeu nas últimas décadas. A escolha é então simples e dura: ou nos adaptamos ou morreremos.

Dito isto, como compreendo todos quantos se sentem enganados pelos políticos, ainda que culpem erradamente os responsáveis do presente pelos erros dos irresponsáveis do passado…

Rui Crull Tabosa, aqui