domingo, 6 de setembro de 2015

SÓCRATES CHEGA À CAMPANHA

São mais as perguntas do que as respostas no caso que envolve José Sócrates.

Há apenas duas certezas, como aqui se escreveu aquando da sua detenção: um ex-primeiro-ministro não tem mais direitos do que um cidadão normal, tem mais deveres, especialmente de índole moral, o que não o menoriza à luz da lei.

A segunda certeza tem que ver com a atuação da Justiça. A coragem na prisão de um chefe de Governo não iliba as magistraturas da responsabilidade de o fazer com base em sólidos indícios, fundados na factualidade da investigação e não na moralidade ou imoralidade dos alegados atos praticados.


A não ser assim, em última análise são os fundamentos do Estado de direito que ficam em causa. E nenhum Estado de direito resiste a uma Justiça que não trata os seus cidadãos por igual. Ou deixa instalar a dúvida sobre motivações políticas.

A alteração da medida de coação do ex-primeiro-ministro não o torna nem mais inocente nem mais culpado perante os factos que lhe são imputados. Mantém-no no domínio da presunção de inocência. Mas também aqui se exige que a acusação seja clara e transparente, mais ainda quando pela primeira vez juiz de instrução e Ministério Público evidenciam publicamente contradições na justificação para alterar a medida de coação.

Desde a detenção, o processo conheceu uma montanha russa de factos e alegados factos, que caíam à medida que outros surgiam. Conhecer a acusação, e tão breve quanto possível, é absolutamente fundamental. Porque não bastam juízos de valor moral e políticos para se condenar seja quem for. Esses são julgados numa outra tribuna. Se é que já não foram.

Os factos imputados têm, pois, essas duas dimensões: uma política e do domínio da moral, e uma judicial. E não há na sociedade nenhum tema tão candente quanto esta sobreposição dos planos da justiça com os da política, por estarmos perante atos que terão sido praticados no exercício das funções de um governante.

Não se trata aqui da figura de José Sócrates em concreto. Trata-se de apurar a verdade sobre a atuação de alguém que, no exercício das suas funções, insiste-se, terá, ou não, usado os seus poderes e dinheiros públicos para benefício próprio.

O receio de contaminação entre os planos político e judicial fez vingar a estratégia de tentar que o tema passasse como um fantasma pela campanha eleitoral. Mas se não entrou, vai entrar agora. Sócrates é mais do que um fantasma. E já só corre em pista própria.

Domingos de Andrade, aqui