Estar a milhares de quilómetros e a vários fuzos horários do epicentro da crise greco-europeia só tem vantagens.
1.
Por um lado é uma mini-sabática temporária em relação àquilo que se
assemelha a uma gaiola de ferro de onde não parece haver fuga possível. É
que situação grega não é grega: é europeia. Por cada país
super-deficitário tem de haver um super-excedentário. São posições
recíprocas, certo?! Se na UE cerca do 80% de todas as relações
económicas são internas então não é possível toda a gente ser ganhadora…
ou é?! Num campo de obsessão ordo-monetarista nem
todos conseguem ser “alemães” e nem todos estão condenados a ser
“gregos”, correcto? Dentro de um inflexível espartilho alguma parte do
tecido mole tem de dar de si, certo?! Enfim…
3.
Estar fora e tomado a tempo inteiro por assuntos técnicos faz com que a
atenção alocada seja escassa para o que se passa nesse continente
anteriormente-conhecido-como-Europa. Portanto, só se acompanha por
lampejos e “flashs” a deprimente situação euro-grega: que dá a sensação
de ser um veículo a embater a alta velocidade contra uma parede mas em
câmara-lenta … a Grécia é apenas a primeira parte a despedaçar-se contra
a dura realidade, o resto da estrutura vai a caminho do mesmo fim.
4.
Estando em várias paragens da América Central e do Norte fica-se com
uma sensação de alívio temporário em relação aos vários problemas que
afligem o velho continente. Mas, claro: há problemas em todo o lado.
E o “novo mundo” não é excepção. A inenarrável fuga de um alto
criminoso de uma prisão de alta segurança no México é algo estonteante
que dá uma sensação de fim-de-ciclo ao momento político que se tem
vivido nos últimos anos nesse importante país (aviso à navegação:
atenção aos próximos tempos!). A contínua situação de crise política,
económica e social vivida nas Honduras, país desestabilizado e inseguro,
dá uma sensação de preocupação imensa quando outros países já
conseguiram ir fazendo a sua emancipação da pobreza crónica (como até a
Nicarágua). O facto da admirável proporção de parques naturais sobre o
território nacional (um “record” internacional!) conviver na Costa Rica
com uma esmagadora dependência de combustíveis fósseis (instigada por
grupos de pressão) é uma situação altamente e profundamente frustrante.
5. Porém, atenção: com os Estados Unidos a crescerem os efeitos de arrastamento económico irão produzir os seus resultados em toda a meso-América e Caribe,
a começar pelo vizinho México. Com o distender das relações
cubanas/estado-unidenses as expectativas de desenvolvimento da região
são indutoras de novos dinamismos ao nível de investimento, trocas
comerciais e fluxos turísticos. Com o robustecimento das indústrias de
exportação e logística da Colômbia e do Panamá temos efeitos de
sinergias fortes a animarem as localizações e as actividades limítrofes.
6.
Por outras palavras: este espaço centro-americano/caribenho está em
contraposição à “Europa”, e não apenas em termos geográficos. Isto
interessa, isto importa. Esta região (desde os EUA até à latitude
equatorial) merece atenção especial de quem quer olhar para fora da
camisa de sete varas em que foi metido. Isto é: os actores
económicos e institucionais em Portugal precisam de diversificar as
apostas e ir monitorando as bolsas de desenvolvimento, os mercados de acolhimento e os agentes-parceiros de alto potencial para o médio prazo onde quer que eles estejam.
7. Note-se ainda uma coisa: os bons exemplos que ultimamente têm vindo dos EUA não são apenas económicos.
Se os há, então, vale a pena notar (pois não é todos os dias). O arrear
da bandeira pró-esclavagista da Confederação, os telefonemas do
Presidente a tentar meter juízo nos Europeus a respeito da gestão da
crise euro-grega, o empenhamento numa resolução pacífica que inclua o
Irão na normalidade internacional são todas elas iniciativas
inteligentes (em primeiro lugar para o interesse próprio norte-americano
… mas obviamente não só).
8.
E até a candidata a próxima Presidente dos EUA faz alguns ruídos
positivos. Hillary Clinton apresentou uma agenda económica com uma
articulação racional e progressista: i) acabar com a impunidade dos
criminosos económicos de Wall Street; ii) dificultar a evasão fiscal das
multinacionais; iii) incentivar a remuneração mais justa das classes
trabalhadoras; iv) melhorar a participação feminina no mundo do
trabalho; v) priorizar os serviços educativos e médicos à primeira
infância, vi) baixar o custo de acesso e frequência ao ensino superior;
vii) reforçar os padrões sociais que condicionam a celebração de
tratados comerciais inter-continentais, etc. Eis pelo menos um discurso que faz sentido. Já não é nada mau nos tempos que correm.
Sandro Mendonça, aqui