O cibernético Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora
contém desde o início do ano o registo de uma nova palavra: entroikado.
O neologismo resulta das preferências de 32% dos cidadãos nacionais sobre a
palavra mais ilustrativa do ano de 2012 e retirada de uma lista concebida por um
grupo de linguistas. A escolha de "entroikado" relegou para os outros lugares do
pódio "desemprego" e "solidariedade". Assim como assim....
Sonoro, o novo vocábulo é decifrado segundo duas perspetivas. A primeira, mais nobre e utilizável nos areópagos das grandes discussões entre grupos a puxar dos galões da inteligência (mais ou menos artificial) traduz-se por "obrigado a viver sob as condições impostas pela troika" - equipa formada por Comissão Europeia, Banco Central Europeu e Fundo Monetário Internacional, entidades determinantes das condições do resgate financeiro de Portugal. A segunda versão - coloquial, assim definem os linguistas - aplica-se ao que "está numa situação difícil; tramado; lixado".
Não é difícil admitir qual o principal sentido da escolha dos
portugueses.
Uma minoria de votantes considerarão estarem "entroikados" por obra e graça
da necessidade de cumprimento de um memorando imposto em socorro à bancarrota do
país. E nas reuniões chatas e compridas de alguns decisores do país até se
adivinha o enquadramento, a exposição em PowerPoint (e em Excel! E em Excel!)
dando conta do panorama "entroikado" de Portugal em consequência das flutuações
dos juros da dívida e correlativos financeiros. Conceda-se uma tal bondade.
A maioria dos usuários da palavra dão-lhe, entretanto, uma utilização bem
mais terra a terra; trocam bem os colóquios pelo tom definido como coloquial e
em uso a uma cadência cada vez mais alucinante.
Os portugueses apelam a um estado de alma entroikado para as situações do dia
a dia. O aumento do preço da água e da luz põem-nos entroikados; novos e mais
taxados escalões de IRS ou de IMI deixam-nos entroikados; e os cortes nos
subsídios de desemprego, nas pensões e reformas ou nas indemnizações, conjugados
com outros agravamentos e esboroamentos do chamado Estado social agravam o tal
espírito de quem se sente entroikado. Enfim, a panóplia de situações é vasta e
inclui os discursos e as posturas dos políticos, situem-se eles na Presidência
da República, no Governo ou na Assembleia da República. E todas as projeções,
incluindo as orçamentais segundo um padrão de sacrifícios em desmultiplicação de
agravamentos, adjetivam-se sempre da mesma maneira: são entroikadas, isto é,
difíceis, tramadas, lixadas e por aí fora nos sinónimos, incluindo o mais usado,
menos escrito e começado por um "f".
Estando o ambiente nacional vincado por sombras negras, muito negras, é até
possível vislumbrar uma palavra mais votada já para o ano de 2013 - e no caso de
se admitir o uso de prefixos. Tudo aponta para o agravamento da tendência atual
ao longo do ano: a esmagadora maioria dos portugueses sentir-se-á
"reentroikada"! Ou seja: retramada; relixada. Já agora: usará o "f" com o tal
prefixo. Não lhe faltará vontade de mandar reentroikar o Governo, a troika, os
decisores políticos e os simples carteiros das decisões!
Retirada daqui