quinta-feira, 5 de abril de 2012

O RELATÓRIO DA INSPECÇÃO-GERAL DE FINANÇAS: UMA QUESTÃO DE PERSPECTIVA

Na penúltima reunião do executivo municipal, na apreciação feita pelo presidente da câmara de Oliveira do Bairro sobre o relatório da Inspecção-Geral de Finanças que incidiu sobre o controlo do endividamento e da situação financeira do Município relativo ao triénio 2008 / 2010, e num momento em que nenhum dos vereadores da oposição tinha, sequer, conhecimento do documento, o que foi salientada foi a inexistência de aspectos relevantes a considerar.



Foi igualmente referido, quanto ao endividamento, que não obstante ter aumentado, continua a apresentar um nível adequado ao seu quadro financeiro, bastando a totalidade da receita do municípiode um exercício para solver toda a dívida municipal (como se fosse possível o município fechar a porta durante um ano, sem efectivação, sequer da respectiva despesa corrente!), e que, de acordo com o quadro legal, o município não se encontra numa situação de desequilíbrio financeiro conjuntural nem estrutural ou de ruptura financeira.

Em relação a este relatório, o que eu disse é que só me pronunciaria depois de conhecer o documento; e depois de o conhecer, o que tenho a dizer é que logo na capa, está aposto um despacho manuscrito pelo Senhor Dr. Luís Morais Sarmento, Secretário de Estado do Orçamento, com data de 22 de Fevereiro último, com o seguinte teor: “Visto com preocupação, nomeadamente relativamente (sic) à falta de informação financeira, e do empolamento do orçamento de receitas.

Analisando o documento com algum pormenor, verifica-se que em resultado da auditoria efectuada, há efectivamente muitos aspectos relevantes a salientar, os quais constam das seguintes conclusões:

a)      Os Balanços e as Demonstrações de Resultados de 2010 não reflectem com inteira fiabilidade, em algumas rubricas, a situação económico-financeira do município, tendo havido necessidade de efectuar correcções que ascederam a mais de 445 m€ no passivo exigível e a menos 2,9 M€ nos fundos próprios;

b)      Diminuiu o grau de dependência dos fundos próprios para financiamento do activo (passou de 71% para 64%), ainda que se tenha mantido o do passivo exigível em cerca de 21% (correspondente ao total menos acréscimos e diferimentos);

c)      Existe uma prática reiterada de empolamento na previsão de receitas de capital, com reduzidos índices de execução (no máximo 35%), o que contraria o objectivo visado pelas regras previsionais consagrado no POCAL;

d)     A execução dos orçamentos de 2008 / 2010 comportou um elevado risco ao possibilitar a realização / existência de despesa para além da efectiva capacidade do município para promover o seu pagamento atempado (em 2010, 8,8M€);

e)      A violação sistemática do princípio do equilíbrio orçamental em sentido substancial espelha a realização / existência de despesas acima da real capacidade financeira do município para fazer face aos compromissos assumidos;

f)       Em 2010, o valor global das receitas orçamentais encontrava-se comprometido em cerca de 70% face a um conjunto de despesas certas e com um elevado grau de inflexibilidade, pelo que a margem de actuação do município, ao nível da sua gestão financeira, era de apenas 30%;

g)      No triénio de 2008 / 2010 o município, na sua sua gestão orçamental, não adequou o nível da despesa (da sua realização e não somente o seu pagamento) à sua capacidade, tendo em conta a real cobrança da receita (e não a sua mera previsão orçamental). Assim, os documentos previsionais não reflectiram a real expectativa da execução orçamental do município, e por isso, não puderam ser utilizados como um eficaz instrumento de gestão pelos órgãos autárquicos.

h)      O endividamento global do município, não obstante ter aumentado no trénio 2008 / 2010 (21% e 2,6 M€), continua a apresentar um nível adequado no seu quadro financeiro, nomesdamente às receitas orçamentadas. Contudo, importa ter presente que a gestão orçamental dos exercícios futuros encontra-se, de certa forma, condicionada, nomeadamente, pela tendência crescente das ‘outras dívidas a terceiros’ (2010: 3,6M€), dos compromissos assumidos e não facturados (2010: 3,8 M€) e do peso da dívida de médio e longo prazo (2010: 76%);

i)        Enquanto a dívida de empréstimos de médio e longo prazo aumentou no triénio 2008 / 2010 (23% e 2,6M€), o respectivo serviço de dívida diminuiu, mas tenderá a crescer nos próximos anos, dado que existem empréstimos em período de carência (4,4M€);

j)        O município apresentou uma estrutura financeira de curto prazo pouco equilibrada (não existindo adequação entre as dívidas desta natureza e a correspondente liquidez do activo), com relevantes saldos reais negativos de operações orçamentais, de que resultou a dificuldade em solver atempadamente os seus compromissos, bem como a oneração indevida de orçamentos futuros (com a transferência de dívida assumida que devia ser paga por um dado orçamento anual para os subsequentes);

k)      O endividamento global do município, não obstante ter crescido para 15,2 M€ (mais 21% e 2,6M€), continua a apresentar um nível adequado ao seu quadro financeiro, nomeadamente às receitas orçamentais, sendo, no entanto, de salientar:
k.a) o peso da dívida financeira de médio e longo prazo (2010: 76%) e o seu previsível agravamento do inerente serviço de dívida;
k.b) a existência de uma situação financeira de curto prazo pouco equilibrada de que decorrem dificuldades para solver atempadamente os compromissos desta natureza com significativos saldos reais negativos de operações orçamentais, prazos médios de pagamento a terceiros superiores aos parâmetros legalmente previstos (2010: 92 dias);
k.c) o incumprimento sistemático da regra do equilíbrio financeiro mínimo.

l)        O valor de compromissos assumidos no exercício e ainda não facturados (ou equivalente) aumentou cerca de 1 M€, importando no final de 2010 em 3,7 M€.

m)    Todas estas situações repercutem-se e condicionam a gestão orçamental de exercícios futuros;

n)      O município contribuiu, de forma negativa, em 2010, para o deficit do subsector das autarquias locais, uma vez que neste ano aumentou o seu endividamento líquido em cerca de 1,6 M€.

o)      Não obstante a discordância apresentada pelo município, a Inspecção Geral de Finanças manteve todas estas conclusões, as quais obtiveram a concordância do Inspector-Geral de Finanças  e do Secretário-Geral do Orçamento.

Perante estes factos, apenas uma questão: será legítimo concluir, como concluiu o presidente da câmara, que neste relatório não há aspectos relevantes a considerar?