A CEGUEIRA DO PRÍNCIPE
Veio esta história de longe, da Índia, que é terra fértil em histórias de encantar.
Aí se conta de um príncipe filho do poderoso marajá (que era um rei da Índia, de antigamente), aí se fala de um príncipe cego.
Inexplicável doença roubara-lhe a luz dos olhos e nenhum sábio ou médico dos mais eminentes conseguia atinar com a cura do seu mal.
O rei (o marajá) só vivia para o seu desgosto e toda a corte mergulhara também em grande tristeza.
Mas, um dia, apresentou-se no palácio um peregrino que disse:
- Sei do remédio que cura o príncipe.
O marajá chamou-o logo à sua presença:
- Diz-me o que precisas para livrar o meu filho da cegueira, que tudo se fará como tu ordenares.
- Preciso apenas de uma taça de cristal - respondeu o peregrino - e que Vossa Majestade me acompanhe numa viagem, através do reino.
Rei e peregrino desceram às ruas e aos campos miseráveis do reino. Por onde passavam, onde houvesse lágrimas vertidas pelo povo, lágrimas de sofrimentos, de misérias, de injustiças sofridas e caladas, o peregrino colhia-as na sua taça de cristal.
Quando tiveram a taça quase cheia de lágrimas - o que não foi difícil, porque o povo daquele reino era pobre e vivia abandonado, no meio da sua pobreza -, quando deram por finda a viagem e regressaram ao palácio, o peregrino banhou os olhos do príncipe com o conteúdo da taça. Que ninguém se admire com o que sucedeu?
Imaginem que logo, naquele instante, o príncipe voltou a ver.
A história não conta se o rei, depois desta viagem, passou a cuidar melhor dos assuntos do reino nem se o príncipe, uma vez rei, foi bom e justo para o seu povo. A história não conta, mas nós acreditamos que sim, que foi tal e qual como nós desejamos que tudo passou a acontecer.
António Torrado e Cristina Malaquias, aqui