Na Sexta-feira passada, no final de mais uma Assembleia Municipal, proporcionou-se à entrada deste edifício uma momentânea tertúlia que versava acerca das responsabilidades do estado a que isto chegou, da falta cada vez maior que temos dos senadores da democracia e da urgência e dificuldade na criação de novos senadores que guiem as novas gerações.
Para quem, como eu, que militou na Juventude Centrista, ou Gerações Populares e agora Juventude Popular, teve como farol inspirador, um dos maiores parlamentares da história da democracia portuguesa: Adelino Amaro da Costa.
Adelino Amaro da Costa, que nos dizia que a Juventude não é instalada, deixou-nos uma forma de fazer política baseada no serviço. O serviço aos outros e nos outros, especialmente os mais desfavorecidos, o serviço ao país.
Ao aprofundar um pouco mais o seu percurso deparei-me com um dos seus discursos. A leitura que vos proponho é proferida há 35 anos. Infelizmente a análise poderia ser feita nos dias de hoje.
“Sem pretender dar um mote a esta sessão, também começarei dizendo que estamos sob o signo das sombras que se desenham sobre a vida dos Portugueses, mas também com a esperança que nos anima quanto ao futuro da democracia em Portugal.
São, na verdade, muitas as sombras que se projectam no nosso futuro. Muitas delas relacionam-se directamente, e cada vez mais, com a situação económica.
Não tenhamos ilusões: o problema económico português continua a ser, e sobretudo, um problema político.
Desde logo, uma primeira e importante questão interessa colocar: como pode haver recuperação económica sem a necessária estabilidade e coerência governamental.
É fácil compreender que o Governo não tenha sido capaz de formular, em concreto, uma política económica. Porque se o Governo tem uma política económica, nós não sabemos qual seja.
Até agora apenas assistimos à publicação de umas chamadas medidas de austeridade e umas normas de actuação do sistema de crédito. Que novos projectos vão ser lançados? Que iniciativas concretas vão ser desenvolvidas, apoiadas, estimuladas? Pensará o Governo que o problema mais importante da economia é o dos deficits do Orçamento Geral do Estado?
Julgará o Governo que os deficits orçamentais são ainda em Portugal uma causa importante da regressão económica e da inflação? Não se apercebe o Governo que é, a todos os títulos, errado atacar os efeitos sem ir em busca dos remédios capazes de remediarem as causas dos nossos males? Ou estará o Governo ainda convencido de que a busca do equilíbrio orçamental é o primeiro instrumento a utilizar no combate à inflação, na diminuição do desemprego, no relançamento da produção?
Por outro lado, o Governo está a favorecer a restrição ao consumo, e ao fazê-lo desencadeia propositadamente uma política que, mais cedo ou mais tarde, e a menos uma feroz contenção salarial, acabará por ser altamente inflacionista, com todos os sacrifícios que isso comporta para reformados, pensionistas e outras classes de rendimentos fixos ou de escassa elasticidade, assim como para as próprias classes trabalhadoras mais desfavorecidas, para já não falar das centenas de milhar de desempregados.
Entretanto, porque não procede o Governo a uma política prioritária de estímulo à produção de bens e de correlativo aumento de oferta? Só uma política deliberada de estímulo à produção e ao investimento poderia ajudar a reduzir o desemprego.
Aceitamos que o povo português está convencido de que seria um grave risco deixar ir mais longe os erros da política demagógica, durante tanto tempo praticada. Mas como poderá o povo português aceitar o aumento dos preços de bens de consumo normal, sem vislumbrar uma medida positiva, uma medida imaginativa que dê sentido e significado aos sacrifícios, puramente negativos, que tem de suportar?
O povo português, pela informação que lhe tem chegado, conhece os traços fundamentais do que durante muito tempo não foi, e continua a não ser, uma política económica. Perante este panorama, mais ou menos inalterado durante largo tempo, ganha-se a consciência crescente de que o País está afinal a financiar a inércia.
Os riscos desta política estão à vista.
Amanhã, quem será o bode expiatório? A democracia não é compatível com a teoria de bode expiatório ou com a agitação permanente de fantasmas. Quando as dificuldades se tornam próximas e os dramas se vivem intensamente em cada família portuguesa, não tem importância alguma, do ponto de vista da opinião pública, que se invoquem os fantasmas e os perigos que eles comportam.
Porque, por maiores que tenham sido as transformações estruturais da economia e da sociedade portuguesa, o povo português não tolera alterações aos seus padrões de consumo - mesmo baixos como, na média, eram - para além de certos limites. O monstro que é a insegurança familiar não se exorciza com fantasmas. Elimina-se com uma correcta prática política. É nessa prática que todas as forças políticas responsáveis se têm de empenhar.
Pelo nosso lado, estamos dispostos (…) a participar no diálogo necessário para a sobrevivência e consolidação da democracia.
Mas o Governo e as restantes forças políticas têm de compreender com rapidez uma política que, definitivamente, conduza ao desbloqueamento, psicológico das tensões que se estão a acumular em torno da nossa vida colectiva.
Os aspectos psicológicos e sociais do actual processo político não podem, na verdade, ser menosprezados. E isso leva-nos a considerar uma outra importante dimensão. Na verdade, mais do que nunca interessa sublinhar o papel fundamental que cabe ao quarto poder do Estado, a esse poder inorgânico que é constituído pelos órgãos de comunicação social.
(…) Na política económica, na clarividência dos partidos políticos mais responsáveis, na prática do sistema de informação, joga-se o futuro de Portugal.
Comecei por dizer que iniciávamos este ciclo com perspectivas sombrias. Julgo, porém, que a nossa esperança na democracia, na reconstrução e na reconciliação, tem sérias razões para sobreviver.
Acredito na capacidade do povo português para construir em Portugal a democracia.
Apesar de tudo e contra muitos.”
Será esta análise do Eng. Adelino Amaro da Costa reveladora de um destino cíclico que atormenta a política e a sociedade portuguesa?
Por mim, prefiro a sua mais inspiradora mensagem:
“A Juventude não é instalada”
Nem devemos ser nós.
Disse.
Oliveira do Bairro, 25 de Abril de 2011
André Chambel
(Membro da Bancada do CDS-PP na AM de OB)