quarta-feira, 21 de julho de 2010

PAULO RANGEL TEM "SÉRIAS RESERVAS" À REFORMA DO SISTEMA POLÍTICO DE PASSOS COELHO MAS NÃO É O ÚNICO NO PARTIDO

Passos Coelho enfrenta hoje primeiro teste à sua proposta. Ontem tentou baixar o tom da polémica: o documento "não está fechado", é para discutir.

O principal adversário de Pedro Passos Coelho nas directas do PSD, Paulo Rangel, tem "sérias reservas" em relação à reforma do sistema político plasmada na proposta de revisão constitucional que a direcção do partido leva hoje a conselho nacional.

Depois de quatro dias de contestação, incluindo no próprio partido, Passos Coelho respondeu ontem pela primeira vez às críticas. Afinal, trata-se apenas de um anteprojecto que vai agora ser sujeito a um debate interno. E esse é um dos argumentos que deverá repetir no conselho nacional de hoje, em Aveiro. Em entrevista ao Jornal da Noite, da SIC, Passos Coelho foi questionado sobre a parte laboral do projecto e admitiu que este "não é um documento fechado". Por outras palavras, o projecto de revisão do PSD não será "o do presidente", mas sim o que resultar da opinião "da maioria do partido" e o que o foi hoje aprovado não é o projecto definitivo a apresentar na Assembleia da República.

E a verdade é que Passos terá hoje o primeiro teste no conselho nacional, a que pertence Paulo Rangel. "Ao contrário do que tem sido dito, o articulado não reforça os poderes do Presidente da República, até os diminui", afirmou ao PÚBLICO. Rangel faz a leitura conjugada das inovações relativas ao sistema de governo proposto: por um lado, "limita-se o poder de dissolução do Parlamento", por outro "impõe-se ao Presidente um primeiro-ministro" escolhido na Assembleia em resultado de uma moção de censura construtiva. Acresce ainda que "cria uma espécie de autodissolução do Parlamento" sem intervenção do Presidente.

Esvaziar poderes do PR
Para o eurodeputado e professor de Direito, com estas três intervenções "reduz-se drasticamente o poder arbitral e regulador do Presidente", acabando por "esvaziar aquele acréscimo de poder demitir o governo". Rangel alerta para o facto de estas soluções poderem criar alguns impasses, dizendo não fazer sentido que o Presidente possa "demitir um governo em cuja nomeação ele não interveio de maneira nenhuma", porque lhe foi imposto através de uma moção de censura construtiva. Em resumo, na proposta conjugam-se "soluções que são de sentido contrário: uma para presidencializar e outras para parlamentarizar", o que "não ajuda à clarificação constitucional".

Rangel, que salvaguarda considerar "perfeitamente aceitável" a parte ideológica, económica e social da proposta - "está de acordo com o que o presidente do PSD apresentou na campanha interna" -, vai hoje apresentar no conselho nacional "uma correcção de propostas na área do sistema político", retomando o poder de dissolução livre do Parlamento, "que sempre funcionou muito bem em Portugal", mas abandonando a autodissolução da Assembleia e a moção construtiva, "estranhos ao nosso sistema político".

Ao encontro do reforço dos poderes presidenciais veio ontem também António Capucho. O membro do Conselho de Estado e ex-mandatário nacional de Paulo Rangel nas directas considera que, "no mínimo, o Presidente devia ter a prerrogativa que tem o Presidente da República francesa, que também é um regime semi-presidencial, de, quando entende, presidir ao Conselho de Ministros", defendeu à Rádio Renascença.

O histórico social-democrata sustentou: "Temos de escolher quem manda e quem manda, sob a fiscalização da Assembleia da República, porventura até com poderes reforçados, deveria ter uma actuação com maior amplitude." António Capucho considera inevitáveis alterações, como o fim da saúde e da educação tendencialmente gratuitas para todos, ou uma maior flexibilidade nos despedimentos. E acredita que, a prazo e com outra liderança, os socialistas acabarão por negociar a proposta de Passos Coelho.

Leonete Botelho e Nuno Simas in http://www.publico.pt/Política/rangel-tem-serias-reservas-a-reforma-do-sistema-politico-de-passos_1448029