quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

BACALHAU E MENSAGENS

Passos lá cumpriu o dever de oferecer uma mensagem de Natal aos cidadãos.

A quadra impõe o bacalhau e a mensagem de Natal política. Ao contrário do bacalhau, que cumpre um fim muito concreto, a mensagem de Natal política não precisa de ser sólida nem líquida – é por definição um elemento gasoso.

É muito difícil de cozinhar convenientemente, uma vez que é obrigada a trazer “esperança”, um sentimento quase religioso, e “confiança”, uma coisa em queda no Portugal de 2012 e que ameaça esgotar-se com a entrada em 2013.

Passos Coelho lá cumpriu ontem o dever de desencantar uma mensagem de Natal para oferecer aos cidadãos esgotados pelas rabanadas. Tinha muito pouco para dizer, o que se percebe perfeitamente lendo os últimos números oficiais – com a devidamente assinalada excepção de os juros da dívida terem caído dos 7%, o número mágico inventado por Teixeira dos Santos.

Foi embalado por essa descida que Passos escolheu abrir uma fresta ao “optimismo” – mas de maneira que ninguém o possa vir a acusá-lo de ter apelado ao optimismo. Optando por uma estratégia diferente do dia em que anunciou a retoma e depois teve de recuar a todo o pano, Passos escolheu o discurso do “por um lado sim, por outro lado não”, que será sempre o mais politicamente conveniente em momentos difíceis. 

Por exemplo: segundo Passos, nós, portugueses, sabemos que “ainda não pusemos esta grave crise para trás das costas”, “mas também sabemos que já começámos a lançar as bases de um futuro próspero”.

Se “ainda não podemos declarar vitória sobre a crise”, “estamos hoje muito mais perto de o conseguir”. Não deixa de ser burlesco para um português comum levar no dia de Natal com a mensagem de que “para sermos vitoriosos sobre a dívida e sobre o desemprego”, o que temos a fazer “é acreditarmos em nós próprios”. 

Ou a de que a economia recupera se “encontrarmos a clarividência, a força e a tenacidade para ultrapassarmos este momento”. Ou que haverá saída para a crise “se renunciarmos de uma vez por todas ao pessimismo que marcou a nossa história recente”.

Passos reconhece que a nossa “clarividência” e “força” enfrentam “incertezas”, nomeadamente a crise europeia, mas tem uma solução: “Teremos de responder a essas incertezas com as nossas certezas, as certezas que partilhamos como povo [...] a certeza de que os dias mais prósperos e mais felizes do nosso país estão à nossa frente.” Valha-nos a todos a certeza do tempo que corre: “Estes anos difíceis irão passar, não tenhamos dúvidas.”

Ana Sá Lopes, aqui