A crise social e política deveria, pela sua dimensão, ser um
enorme convite ao rigor recatado dos atores políticos - sem exceção. Por três
simples razões: a de que não estamos em tempos de promessas vãs, nem de folclore
demagógico, nem dos "sound bytes" para teleconsumo.
Presumo que o presidente da República tenha estado calado mas procurado
também exercer uma magistratura de influência no sentido de esvaziar a crise
política instalada há 15 dias, quando Paulo Portas resolveu tornar públicas as
objeções do CDS. Pois ontem, a escassas horas da reunião do Conselho de Estado,
Cavaco Silva resolveu divulgar a sua posição sobre a crise.
Se já achara mau que um conselheiro de Estado com o estatuto de pai da
democracia, como é Mário Soares, não tivesse esperado para dizer, em primeira
mão, ao presidente e aos seus pares, que em sua opinião Passos Coelho deveria
demitir-se, pior achei que Cavaco Silva tivesse soçobrado à tentação de falar
publicamente e também ele acabasse por desvalorizar o Conselho de Estado. E para
dizer o quê? O contrário de Soares: que, para ele, a estabilidade estava acima
de tudo.
Talvez pressionados pelo clima de contestação, os atores políticos chegam a
perder a razão que lhes possa assistir na interpretação do que seja melhor ou
pior para o povo, ou até na bondade mais oculta das suas próprias propostas.
Também ontem, ao socorrer-se de um cenário sobre impostos noticiado pelo
"Correio da Manhã", Seguro colocou-se à mercê da chacota do primeiro-ministro,
que lhe respondeu o óbvio: que não é o diretor desse jornal.
E estava o país mergulhado no olho do furacão da TSU, quando o secretário de
Estado adjunto do primeiro-ministro tornou pública a sua incompreensão quanto à
oposição dos empresários à descida da TSU. Moedas explicou, sem pestanejar, que
os mais pequenos e ágeis passariam a poder disputar mercado aos tubarões
instalados. Esquecendo que entre grandes, médios e pequenos empresários, 90 por
cento do tecido empresarial vive, e sobrevive, do que a classe média consegue
consumir - ou não.
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