quinta-feira, 12 de abril de 2012

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Há uns anos atrás, num dia mais ou menos como o de hoje em que sol espreita mas não brilha, resolvi fazer-me à estrada.

 
Empacotei alguns sonhos, encaixotei meia dúzia de ideias, enrolei o canudo,  guardei-o em cima do guarda-fatos da minha mãe e segui viagem.

Fui engolir sapos que falavam outras línguas, arregaçar as mangas, alargar a minha zona de conforto e, sem ter a certeza disso na altura, crescer por dentro.

Foi no tempo em que ainda havia fronteiras na Europa que quisemos entretanto que fosse uma grande aldeia. Foi no tempo em que ainda não havia equivalências de coisa nenhuma e muito poucos tratados de tudo e mais alguma coisa. Fui-me embora espreitar outras maneiras de ser e de estar sem que nenhum governo ou ministro me desse essa sugestão.  Fui porque estava à rasca para me safar aqui e queria ver se me desenrascava noutro lado.  Fui com os medos todos e com certezas nenhumas mas fui com vontade de voltar  mais tarde e contar o que tinha visto por lá.

Regressei há quase um ano, numa altura que dizem ser a pior de todas para alguém regressar de uma viagem que custa tanto a fazer. 

Os motivos do regresso foram muitos ou quase nenhuns, o que muito fácil de acontecer e muito dificil de explicar, merecem outro texto só para eles e só para leitura minha.

Ando a adiar fazer uma análise pessoal do estado da nação, tenho esse direito/dever, como toda a gente que aqui vive. Todos devíamos ser capazes de perder tempo com isso. Parar para pensar no que temos e no que vivemos. No porquê disto tudo e no que podia ser feito de outra maneira.

Estou cansada de ligar a televisão ou de folhear os jornais e ver campanhas de publicidade a empresas de fogo preso.  Os discursos são pirómanos e isso é grave em qualquer altura mas principalmente depois de um inverno tão seco.

Toda a gente se queixa e já não é só da ciática ou do preço da gasolina. É de tudo e mais alguma coisa  a todo o instante. Porque estamos sem subsídios, porque aumentam a electricidade, porque assim não dá, porque eles roubam e mentem e esfolam-nos porque cortam e mentem e dizem que sim e que não e que talvez para o ano ou quando calhar.

Diz-se por aí que a Europa não presta, que o euro não é boa ideia, que os chineses estão em todo o lado, que é tudo farinha do mesmo saco. Ouve-se a cada esquina que assim não vamos a lado nenhum, que está tudo pela hora da morte, que só se ouvem passos e que os Gaspares são fantasminhas maus que nos atormentam os dias e as noites. 

Há quem se balance para a esquerda e para a direita à espera de uma vírgula mal colocada ou de uma pausa no discurso de uns ou de outros para lhe dar um impacto desmesurado. Anda tudo à cata de palavras fora do sítio, de telhas de vidro ou de brechas no discurso.  A poluição sonora dos últimos meses enerva-me. Deixa-me fora de mim, sem saber se me hei-de rir às gargalhadas ou chorar de tristeza perante aquilo que não se faz pelo meu país doente.

Portugal meteu os pés pelas mãos. Os portugueses meteram os pés pelas mãos. Pelas mãos de uns e de outros e pelas suas próprias mãos. Portugal e os portugueses todos estão à rasca. Não é uma geração em especial, são todas. Estão à rasca por causa disto e daquilo. Mas estão e tiveram que pedir ajuda. Portugal sentou-se à mesa e comeu. Comeu do bom e do melhor nos últimos anos. Podia ter escolhido pratos mais ligeiros e mais saudáveis, podia ter pensado nas dores de estomago e nos níveis de colestrol. Mas não pensou em nada. Comeu e bebeu e na hora de pagar a conta não tinha dinheiro para isso. Resta-lhe arregaçar as mangas e ir lavar pratos. Muitos pratos.

E é certo que num rodízio há sempre quem coma mais que o vizinho do lado mas o preço é o mesmo. Eu nem me sentei a esta mesa nos últimos anos mas estou aqui para ajudar a arrumar a cozinha.

Portugal precisa de trabalhar. Mais e melhor, daquela maneira que só os portugueses sabem. Mas precisa dessa humildade, dessa força e desse espirito de sacrificio cá dentro dele.

Precisa de todos os jovens que queiram cá ficar e das ideias que outros possam ir colher lá fora. Precisa de todos juntos. De uma selecção nacional que queira ganhar competições e que acredite no seleccionador. Que se una na estratégia e que páre de se queixar das lesões.

Porque é agora que temos que jogar e é agora que precisamos de ganhar. Precisamos de nos incentivar uns aos outros e dizer palavras bonitas. De sorrir das nossas desgraças e de arrumar o mais depressa possível a casa. Está na hora. Para frente é que é o caminho.

Talvez seja ingenuidade minha, mas estou farta de lamúrias. Isto está pela hora da morte, sim senhora. Mas eu ainda estou viva. 

Chega de poluição sonora. Vamos dizer sorrisos. 

Cristina Gameiro, aqui