sábado, 25 de setembro de 2010

PALAVRA DE HONRA

Governar um país não implica apenas tomar decisões acertadas, imprimir reformas transversais e fomentar o desenvolvimento e o bem-estar.

Para se governar bem um país, também há que saber dominar com eloquência a língua nativa. Fazer crer aos governados que mesmo as promessas que a sua intuição lhes diz poderem degenerar em tragédias gregas serão, afinal, marcos civilizacionais, balões de oxigénio sem os quais eles, o país, não sobreviveriam. O debate sobre a despesa e a receita do Estado português é disso exemplo.

Para quem governa, os gastos não são gastos. A despesa assume a dócil condição de investimento. E criticar quem gasta - perdão, investe - revela apenas uma desavergonhada tendência para o bota-abaixismo e uma confrangedora ausência de contra-argumentação válida.

Basta atentar na resposta que o ministro da Presidência, Pedro Silva Pereira, deu, ontem, a Cavaco Silva, a propósito do repto lançado pelo presidente da República ao Governo, no sentido de este repensar os grandes investimentos públicos. Afirmou Silva Pereira: "Governar é definir prioridades. O Governo tem as suas prioridades em conformidade com o programa de Governo e com os compromissos que assumiu perante os portugueses".

Ou seja: o Governo não só não exibe comoção com o recado presidencial, como garante que nada, nem mesmo a realidade, o desviará do objectivo final: o progresso, aliado à arrebatadora convergência com a Europa desenvolvida.

O drama é que a realidade parece querer escangalhar o ramalhete governamental. O TGV segue manco e agarrado, em desespero, a uma única ligação, por sinal vetusta, entre Caia e Poceirão. O concurso para a linha entre Lisboa e Poceirão foi, entretanto, anulado, mas, ainda assim, o ministro das Obras Públicas mantém uma firmeza de aço no projecto.

O novo aeroporto de Lisboa, outrora e sempre desígnio nacional, também parece atravessar incólume o olho da tempestade, mesmo quando os dados mais recentes comprovam que o tráfego aéreo em Portugal diminuiu significativamente. E julgar que o actual aeroporto, o tal que carecia urgentemente de um substituto, estava a rebentar pelas costuras...

Se à táctica expansionista do Governo subjaz a expressão "parar é morrer", à de Cavaco Silva pode ser aplicada a máxima "mais vale parar enquanto é tempo". E na fase em que estamos, a melhor forma de agir pode ser precisamente a de fazer nada. Ou, pelo menos, fazer apenas algumas coisas.

E não se preocupe o ministro da Presidência com os compromissos que o Governo quer honrar. Até porque, ao que se percebe, caminhamos perigosamente para uma terceira subida de impostos da era José Sócrates. Coisa que a honra e o programa do Governo não previam.

Pedro Ivo Carvalho, aqui