domingo, 19 de abril de 2015

CRÓNICAS DO INFERNO

CRÓNICA ATAMANCADA

Li, em diversos jornais, que um senhor Juiz do Tribunal da Relação de Guimarães admitiu, num Acordão, que tinha “atamancado” esse texto.

Alegou que se vira forçado a fazê-lo por “não ter tempo para ir para bibliotecas consultar jurisprudência nem lhe sobrar dinheiro para comprar um livro só para um processo”.
Explicou, em adenda, porque “não fez citações de jurisprudência para sustentar a decisão vertida nesse mesmo Acórdão.”

A razão era simples: “"Não citei, porque só cito o que leio, e com o atual volume de trabalho não tenho tempo para ir para bibliotecas, nem me sobra dinheiro para ir comprar um livro só para um processo."

Todos os meus amigos criticaram esse Juiz mas nenhum deles se atreveu a dar uma solução para este caso.

Não é justo.

Quanto a mim quem critica deve dizer o que considera errado e propor um caminho que leve a que tais situações não se repitam.

É o que me proponho fazer.

O que é que eu considero errado?

O facto de um Juiz “atamancar” um Acordão. Estando em causa a resolução de um processo jurídico a Sentença deve ser uma peça devidamente estruturada.

Atendendo aos problemas indicados pelo Juiz que solução proponho?

Não uma, mas duas. Nestas coisas não gosto de um caminho único.

Primeira solução: O caso analisado pelo Juiz dizia respeito a uma “alegada” fraude para obtenção de um subsídio.

Se o Juiz tivesse analisado, com cuidado, o Processo, quem sabe se não descobriria uma maneira de conseguir, também ele, um subsídio para a compra do livro que confessou necessitar?

Ou para comprar um computador que lhe permitisse ligar-se à internet e consultar a jurisprudência sem ter de se deslocar à biblioteca?

Ou – se fosse mais exigente – comprar um automóvel com o qual se pudesse passear até à dita biblioteca?

No caso de considerarem esta “alegada” solução como inviável podem optar pela Segunda solução: O Conselho Superior da Magistratura deveria deliberar que os Acordãos de Sentença dos diversos Tribunais deveriam ser idênticos aos dos Tribunais de Execução de Penas.

Nos computadores dos Tribunais deveriam constar Acordãos já escritos com algumas opções à escolha para a absolvição ou condenação.

Se o magistrado optasse pela inocência do arguido bastaria colocar uma cruz no quadradinho atrás da palavra “Absolvição”.

Caso contrário, seria aposta uma cruz no quadradinho à esquerda da frase onde se indicariam os motivos da condenação:

1) – Consideramos provado que o arguido foi o autor do crime de (espaço em branco onde o Juiz, ou mesmo o escrivão, colocaria a palavra adequada: homicídio, agressão, roubo, furto, burla, etc.);

2) – A convicção do Tribunal é que o arguido deve ser condenado, apesar das provas não serem muito concludentes, pelo crime de (espaço em branco onde o Juiz, ou mesmo o escrivão, colocaria a palavra adequada: homicídio, agressão, roubo, furto, burla, etc.);

3) – O arguido deve ser condenado porque sim.

Depois bastaria completar a linha seguinte com a pena a aplicar.

Tipo: É, assim, o arguido condenado à pena de: (espaço) anos de prisão efectiva. (espaço) anos de pena suspensa.

Numa manhã um Juiz, que só teria de escrever o número de anos e assinar a folha, despacharia dezenas de processos.

Acabaria a burocracia, poupava-se tempo e dinheiro e evitava-se esta tortura dos magistrados terem de ler milhares de páginas em cada processo.

A Justiça seria célere e, com certeza, não se notaria uma diminuição na qualidade. A não ser na falta de frases em latim e na citação de adágios populares. Mas também teremos que fazer cedências…

Este tipo de Sentença tem anos nos Tribunais de Execução de Penas – onde até são os directores das cadeias, chefes dos guardas prisionais e as velhinhas dos serviços de edução e do Instituto de Reinserção Social a colocar as cruzinhas, em tardes de diversão e no intervalo das novelas – e não consta que haja uma grande revolta quer do Ministério da Justiça quer do Conselho Superior da Magistratura.

Assim sendo, aqui fica a minha modesta colaboração para a tentativa de resolução de um problema candente.

Se não a julgarem pertinente… paciência.

Considerem este meu contributo como uma Crónica Atamancada!

Dê Moníaco, no jornal 'Região Bairradina'