É muito curioso ver como o discurso dos media, dos comentadores e de alguns políticos portugueses mudou - um pouco - em relação ao Syriza desde a vitória do partido "radical" de esquerda nas eleições gregas.
É muito curioso ver como o discurso dos media, dos comentadores e de alguns políticos portugueses mudou - um pouco - em relação ao Syriza desde a vitória do partido "radical" de esquerda nas eleições gregas.
Acusam o Syriza de ter recuado quando quem recuou foram eles. Escrevo - acusam - porque é isso que muitos fazem. Por incrível que pareça, é apontado como um defeito. Ou seja, as mesmas pessoas que diziam "escondam as crianças e as virgens que vêm aí os radicais" dizem agora, com desdém, que estes radicais até negoceiam e recuam.
É como se os que não querem chatices dissessem, com sobranceria, que aquele bêbedo que - diziam - sempre que ia as festas, bebia que nem um javardo e batia nos convidados, afinal, esteve a noite toda à conversa e bebeu um Sumol. Faltou o - "até eu sou mais radical que ele e bebo uma mini numa tarde".
Torna-se muito complicado explicar a posição dos nossos media, etc, sem ser a relaxar, em posição de ioga, dentro de um tambor de máquina de lavar roupa em centrifugação máxima. Vejamos. O Syriza é agora acusado de ter recuado, e de já estar a faltar às promessas de caos que fez aos eleitores, pelos mesmos que rezavam para que o novo governo grego não fosse constituído por uns malucos radicais e que as promessas não passassem de bluff e contos para crianças em campanha eleitoral. E o tom é de quem diz, com um sorriso: "Vêem? Eles também não são nenhuns santinhos. São tão maus como nós."
O que lhes vai valendo é ainda não terem posto gravata ou, então, seriam acusados de recuo completo. Aquela chatice deles irem sem gravata, de mochila e mota, para as reuniões é que continua a ser demasiado radical para a nova imagem de recuo que os media, comentadores e políticos, querem fazer passar. Não foi por acaso que o primeiro-ministro italiano, Matteo Renzi, no meio dos elogios, ofereceu uma gravata a Alexis Tsipras. A liderança europeia parece aqueles restaurantes em que nos emprestam um blazer para podermos jantar na sala. A seguir, Angela Merkel vai-lhe oferecer um Mercedes e Passos Coelho um motorista - não desistem enquanto ele não for um deles.
Na realidade, o discurso oficial começou por avisar, aos berros, que vinham lá os malucos dos sem gravata e que ia ser a desgraça e que eram uns inconscientes com promessas para crianças. Depois, finalmente, ouviram o que os gregos tinham para dizer - que era exactamente o que tinham dito até ali - e, afinal, os malucos tinham algum sentido. Sendo assim, só podiam ter sido os malucos a ter o bom senso de recuar.
Numa ânsia de salvar a face com o papão do Syriza, que afinal até é giro, camuflaram a mentira com outra mentira e começaram a dizer que eles é que tinham recuado. O problema é que, apesar de tudo, eles "recuaram" para uma alternativa à alternativa que não tinha alternativa nos últimos cinco anos.
Para quem nos últimos anos fez carreira a dizer que não havia alternativa é bastante peculiar, que perante uma alternativa, diga: "ok, afinal essa alternativa até é fixe. Ainda bem que vocês recuaram e não foram para a outra alternativa, que era a mais alternativa das alternativas, à nossa alternativa que não tinha alternativa. É preciso lembrar que se construíram carreiras a ter imaginação para pensar, e afirmar, que não havia alternativa.
Malditos gregos que fizeram um Governo em dois dias, uma alternativa em seis e não estão com ar de descansar ao sétimo. A não ser que o BCE lhes faça a missa.
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Top 5
Varoufakis
1 "Ministro da Defesa diz que lei prevê 40 milhões de euros iniciais para compra de aviões KC-390 - São aviões que combatem a hepatite.
2 Passos Coelho. "Portugal é dos países na Europa que mais tem ajudado o povo grego" - Isto são canções de embalar.
3 "Jesus pede 6 milhões ao SLB para renovar" - Deviam ter dito que eram 5 milhões de portugueses.
4 "Mobiliário português em Hollywood decora cenário de 'Cinquenta sombras de Grey' - É a secretaria onde se assinou o memorando. Nunca tantos foram abusados em cima de uma peça de mobiliário.
5 Passos Coelho: "uma fortuna para aceder ao medicamento não nos parece uma coisa equilibrada" - Se o medicamento for para te dar juízo, compensa.
João Quadros, aqui