QUEM JULGA A JUSTIÇA?
Tem-se falado, ultimamente, da facilidade com que se decreta prisão preventiva em Portugal.
As Associações que analisam o Sistema Prisional português não têm feito outra coisa ao longo dos últimos anos.
A comunicação social, como habitualmente, pega no assunto quando está implicado algum “VIP”.
O facto de haver muitas centenas de presos por uma interpretação abusiva das leis, ou pelo excesso de poder que os magistrados detêm neste país, tem sido, para a maioria dos nossos jornalistas, indiferente.
Conseguiram fazer passar a ideia de que Portugal tem das melhores polícias do mundo e que os magistrados têm uma preparação extraordinária.
Nada de mais falso quer num caso quer noutro.
As investigações são, na imensa maioria das vezes, ao nível do maior amadorismo (no mau sentido da palavra) e os acordãos de sentença (como se prova pelas constantes correcções nos tribunais superiores) fundamentados em pressupostos, na convicção de quem julga e escritas num português de escola secundária.
Os mais atentos à problemática conhecem esta realidade.
Mas será que, mesmo esses, têm um conhecimento exacto dos números que podem demonstrar, inequivocamente, o caos a que chegou a Justiça Portuguesa?
Analisemos, então:
“Das mais de 533 mil investigações realizadas pelo Ministério Público, em 2013, só 70 mil acabaram com a acusação do arguido pelo crime de que era suspeito.
Destes, 40% não foram condenados”.
Ou seja, houve 533.000 arguidos com o seu nome posto em causa e somente 42.000 condenados.
Oito por cento.
“Mais de 86% das investigações que o Ministério Público realizou em 2013 acabaram por ser arquivadas e apenas 13,2% resultaram numa acusação do arguido sob suspeita da prática de um crime”.
“Esta tendência já se verifica há anos, com algumas variações, e o ano passado a percentagem de acusações face aos inquéritos abertos voltou a descer. Olhando em específico para a realidade da corrupção, o número de acusações que resultam das investigações abertas é ainda menor: 12%”.
“O departamento do Ministério Público, que tem a cargo a criminalidade económico-financeira e ainda os casos mais graves e complexos, trabalhou em 2010 em mais de 700 investigações mas só 20 resultaram na acusação dos arguidos, isto é 2,7%. O DCIAP queixava-se de falta de meios para investigar”.
Estes dados – entre aspas - são os últimos conhecidos e constam do relatório anual da Procuradoria Geral da República (PGR) no capítulo do DCIAP – Departamento Central de Investigação e Acção Penal -, que tem em mãos as mais complexas investigações, nomeadamente dos crimes de corrupção.
Depois, mais grave, é a análise que o DCIAP, que se “queixa de falta de meios para investigar” faz às prioridades.
Havendo uma suspeita de fuga ao fisco, ou burla, por parte de um qualquer pequeno empresário a máquina judicial cai-lhe com todo o peso na firma.
Já a denúncia feita pela Associação Sindical dos Juízes, na sua revista oficial, de que as Cadeias tinham gasto 19 milhões de euros sem controlo, em ajustes diretos, que as cantinas tinham lucrado 680 mil euros num único ano, mas tendo entregado, aos serviços, somente 600 mil, e que uma auditoria revelara má gestão nos Serviços Prisionais, resultou em quê?
A última informação veiculada pelos jornais (ver “Público” de 31.12.2014) era a de que “a Inspecção da Justiça a negócio das cantinas nas cadeias fora interrompida por falta de verbas”.
E acrescentava que “uma auditoria recente da Inspecção-Geral dos Serviços de Justiça (IGSJ) aos negócios das cantinas nas cadeias esteve parada na primeira quinzena de Junho por falta de verbas para as deslocações dos inspectores. A garantia é dada pela equipa de inspectores no relatório preliminar, concluído no final de Novembro, ao qual o PÚBLICO teve acesso. A inspecção ocorreu na sequência de uma auditoria anterior que revelou o risco iminente de ruptura nos serviços das prisões”.
Ao que parece “a interrupção do trabalho [de campo] durante a 1.ª quinzena de Junho deveu-se ao facto de o orçamento da IGSJ não dispor de verbas para custear as imprescindíveis deslocações e se encontrar ainda a aguardar um reforço orçamental”, lê-se no documento, que, ao longo de 107 páginas, traça um retrato caótico da organização da contabilidade e facturação das cantinas nas cadeias, algumas em funcionamento sem técnico oficial de contas e sem pagar IVA”.
“Abençoada falta de verba!”, dirão alguns.
“Pobre país, este!”, dirá a maioria.
Dê Moníaco, no jornal 'Região Bairradina' de 14 de Junho de 2015
