sexta-feira, 18 de abril de 2014

SUGESTÃO DE LEITURA - PORQUE O FIM DE SEMANA ESTÁ AÍ

A arrepiante história de Diogo Alves, o homem que aterrorizou Lisboa no século XIX, é uma viagem no tempo até uma cidade violenta, em que todos os dias se registam dois roubos - e em cada dois dias há um assassinato.  

Não espanta, pois, que a malandragem tenha permanência assegurada nas conversas de gente de bem, que não se aventura a andar à noite em ruas mal iluminadas, onde a cada esquina se pode tropeçar num gatuno de maus fígados, azedados pelo álcool, e não ter tempo para dar sebo aos calcanhares.

As pessoas que habitam O assassino do Aqueduto, o primeiro romance histórico de Anabela Natário, vivem em tempos inseguros e já sofreram muito. Assistiram à fuga para o Brasil do príncipe regente e da corte - cerca de cinco mil pessoas, mais do que a população de muitas cidades portugueses. Aguentaram o saque das tropas de Junot e as humilhações da regência britânica. Viveram a Revolução Liberal e uma terrível Guerra Civil. E agora, que os anos 30 se aproximam do fim, a inexperiente rainha D. Maria II e “governos instantâneos na formação e na queda” (página 94) não lhes dão motivos para olharem o futuro com esperança.

Lisboa tem 200 mil habitantes, dos quais 10% são galegos que enchem o português de xis, alguns que ganham a vida honestamente, como aguadeiros, carvoeiros ou boleeiros, outros que nem tanto, como Diogo Alves, que entrou no imaginário como o assassino do Aqueduto, mas cometeu bem mais macabros, como os descritos neste livro e que o levaram à forca, após uma competente investigação dirigida pelo juiz Bacelar.  

Diogo Alves, 28 anos, “aquele de quem se fala” (página 20) é “um facínora espertalhaço, galego de má raça, rouba e mata, e escapule-se sem deixar rasto” (página 42), é de Lugo mas veio moço para Lisboa onde começou como boleeiro, profissão onde não se demorou, pois um dia caiu abaixo do cavalo, aterrou com a cabeça no chão, num acidente que “lhe terá chocalhado os interiores e invertido o senso” e lhe deu a alcunha de Pancada.

Amante de Gertrudes, a Parreirinha,  Diogo “Pancada” Alves é o cabecilha de um gangue, onde se destacam o Beiço Rachado (sapateiro e desertor do exército onde foi o rapaz do bombo), o Pé de Dança (transmontano, ex-barbeiro e fanático por teatro), e João das Pedras ( conhecido por o Enterrador pois nas horas vagas ajuda os coveiros a troco de uns pintos) patifes da vida real imortalizados numa ficção que além de uma viagem do tempo é também uma crónica de maus malandros, que não foi construída como um thriller e por isso se deve ler devagar, saboreando palavras, frases, ambientes, situações e personagens, tudo cozinhado em lume brando, como convém a um produto gourmet. 
(Jorge Fiel)

Rerirada daqui