Nuno Crato anunciou este sábado que vai convocar o Conselho de Reitores, o Conselho Coordenador dos Politécnicos e as associações de estudantes do superior para uma reunião esta semana, em Lisboa.
O que pretende o ministro com este encontro ao mais alto nível? Discutir as trapalhadas com que se depara hoje a educação em Portugal? Não. Analisar seriamente a problemática em volta dos duvidosos critérios de atribuição de bolsas? Não. Crato quer, com esta investida reativa, debater as praxes académicas. E porquê?
Porque o ministro, de quem não se conhece ainda uma posição sobre estas práticas aberrantes, embarcou na histeria coletiva e na especulação que insiste em relacionar com a praxe a morte de seis estudantes varridos por uma onda traiçoeira. Sobre isto temos apenas os factos. Os seis foram mortos por uma onda. Um sétimo escapou. O resto é, com os dados conhecidos hoje, um exercício inqualificável de crucificação de um sobrevivente que, ao que se sabe dos registos de socorro, por pouco também não terá sido engolido pelo mar.
Apesar da prudência a que este delicado caso obriga, o ministro veio a público e, pela sua ação, relacionou duas coisas cuja causa e efeito ainda não foram apurados pelas autoridades policiais ou judiciais. Dir-se-á que mais vale tarde do que nunca e que a iniciativa do ministro deve ser louvada. Poder-se-á igualmente referir que a política da "casa roubada, trancas à porta" não é boa conselheira de governantes. E, no caso da praxe, convém não exercitar uma amnésia seletiva.
Sobretudo quando se sabe que foi a maioria parlamentar PSD/CDS que rejeitou, em dezembro de 2011, um projeto de resolução do Bloco de Esquerda que pretendia justamente recomendar ao Governo daquelas duas cores partidárias a adoção de medidas com o objetivo de desencorajar as praxes reconhecidamente violentas.
Convém recordar agora o que pretendia então o Bloco, para se perceber melhor o que vai Crato fazer. Em linhas gerais, propunha a criação de uma equipa multidisciplinar para efetuar o cadastro das práticas de praxe em todas as universidades nacionais. Os dados recolhidos seriam posteriormente tornados públicos online. Além do conhecimento profundo de cada um daqueles rituais, era ainda sugerida a criação de uma rede de apoio a estudantes vítimas deste inqualificável bullying universitário, quase generalizadamente aceite por estudantes, professores e, convém não esquecer, pelos pais.
Tratando-se de uma temática em que a autonomia universitária se sobrepõe às hipotéticas vontades da tutela, que margem de ação tem Nuno Crato? Quase nenhuma. A menos que o Executivo olhe agora com outros olhos para as recomendações do BE que fez questão de recusar. Faltará muito para concluirmos que a desumana tradição da praxe violenta não se pode, em nenhuma circunstância, sobrepor aos direitos de cada um?
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