O Governo não tem mesmo plano B.
Aliás, nisso segue os passos da troika,
cujos membros de cada vez que vêm dizer que se enganaram na receita para
Portugal - e já são tantas... - logo acrescentam que a dita receita, mesmo
errada, é para cumprir até ao fim e até para permanecer ativa depois do fim pelo
menos uma vintena de anos.
O Governo só tem plano A, que aplicará custe o que
custar. E esse plano é o de embaratecer o trabalho e transferir esse diferencial
para o lado do capital.
O relatório do Observatório sobre Crises e Alternativas, esta semana tornado
público na sua versão preliminar, mostra com clareza esse plano A a ser
executado. Em setembro de 2012 o Governo anunciou um desagravamento do pagamento
da taxa social única pelas empresas que pretendia conseguir um acréscimo do seu
rendimento de cerca de 2300 milhões de euros. Nos planos do Governo essa
diferença seria suportada pelos salários dos trabalhadores.
As manifestações
multitudinárias de 15 de setembro obrigaram o Governo a recuar. Mas eis que os
efeitos concretos das alterações na legislação laboral operadas em 2012, no que
respeita a remuneração do trabalho suplementar e supressão de feriados e dias de
férias, são precisamente os mesmos que os pretendidos com a defunta mudança do
regime da TSU: os trabalhadores perderam, em média, 2,3% da sua retribuição
efetiva, dando assim às empresas um ganho estimado em... 2300 milhões de
euros.
O mesmo, portanto. Mas mais forte: a redução do pagamento do trabalho
suplementar teve como resultado uma perda de receitas da Segurança Social entre
66 milhões e 252 milhões de euros, algo que nenhuma soma de encargos com
políticas ativas de emprego alguma vez atingiria. O plano A de empobrecimento é
também o plano A de privatização e as coisas vão de mão dada, como
inequivocamente se prova.
É esse o único plano que o Governo tem, mesmo se ele acelera o endividamento
nacional. Ou melhor, o Governo tem todos os planos B que forem necessários para
cumprir até ao fim o plano A. Porque quem manda no País o obrigará a isso, sem
margem para hesitações. E, de preferência, com um suplemento de sustentação
política como fica evidente no apelo - mais um - a um acordo entre esta maioria
e o Partido Socialista, desta vez pela voz de Alexandre Soares dos Santos.
Às mãos do Governo e da troika, a austeridade é esse modo de organização
económica que gere o País numa lógica de vasos comunicantes, em que o que se
suga ao trabalho se acrescenta ao capital. Uma alternativa digna desse nome só
pode ser aquela que inverta o movimento e traga de volta ao trabalho aquilo que
lhe está a ser retirado.
Esse tem de ser o plano A de uma alternativa ao plano A
da troika e do Governo. Para o levar a efeito, é preciso usar para com o capital
especulativo e para com o sistema financeiro a mesma lógica que tem sido usada
por eles para legitimar o embaratecimento do trabalho: invocar o estado de
necessidade e a excecionalidade deste momento do País.
Tributar devidamente quem
tem sido poupado a esforços maiores, resgatar a centralidade da contratação
coletiva, impor uma política de crédito que dê suporte à economia produtiva têm
de ser as apostas estratégicas deste outro plano A. Para ser assim, o plano A
implica um repúdio inequívoco do Pacto Orçamental e a coragem de mobilizar o
País contra a chantagem que se fará sobre a nossa permanência na zona euro ou na
própria União Europeia.
Entre o plano A do Governo e o plano A de uma alternativa a sério não há
transação possível. Escolhe-se um ou escolhe-se outro. E escolhas são sempre
escolhas, mesmo quando são disfarçadas em nome da razoabilidade ou da união
nacional ou da construção europeia.
José Manuel Pureza, aqui