sábado, 2 de novembro de 2013

DO FIM PARA O PRINCÍPIO...

É o primeiro pensamento que julgo que a todos nos ocorre quando agora, oito meses depois do seu anúncio, nos é apresentado o guião para a reforma do Estado

E a principal consequência deste timing, dado o atual estado de desgaste da comunidade (social e política) é a rejeição liminar ou pelo menos a pouca atenção que se dará às propostas feitas.

É quase inevitável porquanto as condições de exequibilidade são muito pequenas.

Vejamos: a maioria está a braços com o enorme desafio de tentar sair do programa de ajustamento económico e financeiro (PAEF). Como bem se diz no guião "cortar é diferente de reformar". O problema é que temos mesmo de cortar e vai dar ainda muito trabalho a conseguir e a gerir os resultados provavelmente insuficientes.

A Oposição vai estar concentrada neste processo imediato de saneamento das contas públicas e a acertar baterias nos responsáveis pelas dificuldades associadas.

E, no entanto, o texto que agora nos foi proposto é diferente do habitual.

Para começar é mais claro e faz mais sentido. Sobretudo na primeira e última partes, quando se detém na reorganização da estrutura essencialmente da Administração Central e nas iniciativas a favor de um acesso e de uma resposta mais rápida aos procedimentos administrativos.

Será pena que a poeira parlamentar e os interesses partidários menosprezem e ignorem a possibilidade de avançar na concentração das funções de pagamentos, jurídico e contencioso, planeamento prospetivo, relações internacionais, ação inspetiva, compras ou gestão do património imobiliário.

A serem levados por diante, estes programas de racionalização teriam certamente ganhos de eficácia muito importantes e multiplicadores para outros níveis da administração.

Igualmente se deveria apoiar com vigor todas as ações de simplificação administrativa. Não resista a menor dúvida que a complexidade administrativa é dos mais persistentes e eficazes obstáculos ao crescimento económico do país.

Este objetivo de simplificação deveria ainda abranger desde já a proposta da continuação da revisão e aperfeiçoamento do regime de gestão dos instrumentos de ordenamento do território, igualmente responsáveis por um ritmo mais do que deficiente de concretização de intenções de investimento.

Estes, sim, são objetivos de curto prazo que tardam em ser levados à prática e têm peso específico e consequências mensuráveis.

O problema é que o documento avança em duas outras direções que têm implícitas um nível de exigência e de consenso social e político muito dificilmente alcançável no presente estado de crispação coletiva.

São estas as questões do papel do Estado na dinamização da economia e ainda a perspetiva comum sobre as estruturantes questões do modelo de Educação, Saúde, ou Segurança Social ou mesmo a reorganização administrativa do território pela concentração de municípios, passando pela própria revisão constitucional.

Quanto à dinamização da economia mais uma vez se remete para o famigerado plano de fomento nunca compreendido e muito menos executado, mas mesmo assim já a ser reformado. Este plano, o da dinamização económica, não é matéria de reforma do Estado. É matéria de gestão de uma crise que tendo começado por ser financeira é há muito económica e a precisar de clareza quanto à vocação do país e à seleção dos incentivos que devemos implementar. Como fez a Irlanda, num programa assumidamente paralelo ao PAEF e com bons resultados.

Por último, são tratadas as questões de fundo e desta vez clara e inteligentemente colocadas, mas que se perfilam como um verdadeiro índice para um documento de suporte a um pacto de regime para os próximos 15 anos e não como uma componente de um plano de racionalização ou reforma.

Que bom seria para todos que Maioria e Oposição percebessem a diferença destas três dimensões e se dispusessem para já e para o futuro a explorar as respetivas virtualidades.

Não é fácil acreditar. Muito menos num dia em que, assistindo ao debate sobre o OE para 2014 no Parlamento, se verificou a costumeira, irresponsável e pobre lide oratória que não responsabilizou nem ilibou ninguém, apenas deixou a imagem triste de ministros ao telemóvel ou ao computador ou de deputados visivelmente entediados e descomprometidos!

Retirada daqui