Depois de ter promovido várias nacionalizações de empresas portuguesas por
Estados estrangeiros, EDP e REN por exemplo, o Governo decidiu dar um outro
passo no caminho da colectivização dos meios de produção.
A estratégia consiste
em criar um banco público que ajude, nas palavras do Governo, as empresas.
Acaba-se com o mercado interno, mantém-se a electricidade, gás, gasolina, a
preços acima dos concorrentes europeus, não se mexe uma palha para acabar com a
burocracia e até se acabam com as poucas boas medidas nesse sentido do anterior
governo, acaba-se com o crédito, aumentam-se os impostos, fazem-se disparar as
taxas.
Estamos regressados ao
condicionamento industrial do Estado Novo: será o Estado a escolher quem deve
ser ou não financiado, qual a actividade a ser apoiada e, com jeito, quem devem
ser os gestores.
Diz que é um Governo liberal. Mas é mais um Governo que se comporta como um
bombeiro pirómano: vai tentar salvar as empresas que ele próprio se encarregou
de incendiar.
Esqueçamos o pormenor de passarmos a ter não um, mas dois bancos públicos.
Esqueçamos também que este era o primeiro-ministro que queria privatizar a CGD.
Façamos uma força extra e ignoremos que este era o Governo que tiraria o Estado
da Economia... O resultado é que acaba não só por fazer exactamente o contrário,
mas também por promover nacionalizações por outros Estados de empresas
portuguesas.
O facto é que a economia portuguesa está ainda mais dependente de decisões
políticas do que alguma vez esteve. Ou será que alguém pensa que a EDP não
seguirá à risca o que for melhor para o Estado chinês? Ou será que alguém sonha
que a REN não criará problemas graves a Portugal por um qualquer interesse de um
dirigente do PC chinês? Ou será que há ingénuo que imagina a IFD com critérios
gerais e abstractos quando tiver de escolher financiar esta ou aquela empresa,
sugerir este ou aquele gestor - os boys do CDS e do PSD devem estar a esfregar
as mãos de contentes e os do PS a afiar os dentes -, procurar um ou outro
fornecedor?
O resultado de toda a política que até agora tem sido seguida era previsível
e está a confirmar-se: uma economia destruída acaba por se tornar dependente do
único poder que permanece: o do Estado. A sistemática destruição económica dos
últimos anos deixou o tecido empresarial tão enfraquecido que se torna
praticamente inevitável a intervenção estatal.
Daqui até à intromissão do Estado em assuntos que não devem estar na sua
esfera, ao aumento do clientelismo, ao crescimento do poder arbitrário do
Governo nas mais diversas áreas, vai o passo dum anão.
Com a mesma lógica, não surpreendem os números, que esta semana vieram a
público, que mostram que meio milhão de crianças e jovens perderam o direito ao
abono de família em três anos e que há muito menos pessoas a receberem o
rendimento social de inserção e o complemento solidário para idosos (dados do
Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa). Não será preciso
lembrar que não haverá altura em que estes apoios seriam mais necessários. Por
outro lado, o Estado está a investir fortemente em cantinas sociais.
O que se está a tirar em direitos e apoios para que as pessoas mudem de vida
e se diminuam as desigualdades está a dar-se em esmolas. É o regresso da sopa
dos pobres.
Também diz que o Governo é apoiado por um partido social-democrata.
No fundo, o Estado sai de onde devia estar, diminui as suas funções
essenciais, reduz drasticamente os apoios sociais - que já eram dos mais baixos
da Europa - e aumenta muito a sua presença onde não devia estar e que quando
está só estraga. O Estado torna-se mais fraco onde devia ser forte, e
decisivamente forte onde devia ser apenas regulador e facilitador. É a inversão
total da lógica do funcionamento do Estado numa democracia que quer ter uma
sociedade civil forte e independente e uma economia mais livre e com mais
iniciativa.
O Governo não é nem liberal, nem social-democrata, nem nada. É apenas
incompetente e ignorante. O pior é que essa incompetência e ignorância está a
transformar o país num lugar em que apoiar as empresas é pôr o Estado a
financiá-las e a geri-las e os apoios sociais acabarão por ser apenas sopas para
os pobres.
Pedro Marques Lopes, aqui