quinta-feira, 3 de outubro de 2013

O HOMEM E AS MÁQUINAS

A vitória de Rui Moreira no Porto é um dos factos mais significativo da vida política e partidária nacional dos últimos anos

Pelas causas e pelas consequências: as primeiras fáceis de detetar; as segundas fáceis de prever, se certos pressupostos forem cumpridos.

Vamos às causas. É verdade que a candidatura de Rui Moreira nasceu com um propósito claro: derrotar Luís Filipe Menezes e o modelo fontista preconizado pelo ex-autarca de Gaia. Mas esse pendor negativo, digamos assim, da candidatura foi paulatinamente ultrapassado, porque Moreira soube rodear-se de gente inteligente, soube ler os sinais que o país dava e, sobretudo, soube compreender o que queriam (e não queriam) os portuenses.

A prova faz-se pelos números: a candidatura do PSD perdeu cerca de 40 mil votos em relação às autárquicas de 2009. A candidatura do PS perdeu perto de 20 mil votos. Por junto, os dois maiores partidos deixaram escapar 60 mil votos. É uma brutalidade! Que diz bem do afastamento crescente entre eleitores e máquinas partidárias. 

Os partidos derrotados podem disparar razões para ali e para acolá, podem fazer contas de somar e subtrair até encontrarem um número que lhes alivie um bocadinho a alma, podem distribuir culpas entre quem queria este e quem desejava outro candidato, podem andar à caça de bodes expiatórios: será pura perda de tempo. O problema não está fora dos partidos, está dentro deles - e é grave, para eles e para a democracia.

Em tempos de desesperança, Rui Moreira sobrevoou as máquinas partidárias e, sempre comedido nas palavras e rigoroso no cumprimento da estratégia, apareceu ao eleitorado como uma lufada de ar fresco. 

Quem procurava penalizar o Governo encontrou nele a alternativa certa. Os resultados obtidos nos grandes centros urbanos (com exceção de Braga) mostram exatamente isso: a mira estava apontada a Passos e companhia. Se, ainda por cima, havia entre as escolhas gente igual à gente que votou, gente que não cresceu e viveu ligada à máquina partidária, como Rui Moreira, tanto melhor.

Agora as consequências. É óbvio que as candidaturas de independentes vieram para ficar e frutificar. Mas elas frutificarão tanto mais quanto melhor for o exemplo dado por quem, como Moreira, chegou ao Poder. 

O Porto é a segunda cidade do país, tem graves dificuldades para ultrapassar (desertificação, desemprego, pobreza, luta contra o centralismo...) num contexto em que os euros não sobram e tem, inevitavelmente, que carregar o peso de uma cidade que representa e representará sempre os interesses da Região Norte, dentro e fora do país, num modelo que só pode ser policêntrico e nunca portocêntrico.

A tarefa de Rui Moreira é árdua. O seu sucesso, ou insucesso, ajudará, em boa medida, ao tão desejável alargamento da cidadania.

Retirada daqui