Tivemos Isabel Jonet humilhada por dizer que o povo não devia comer bifes
todos os dias.
Tivemos o jovem Martim Neves, graças a uma confusão televisiva no
Prós e Contras da RTP, endeusado como empreendedor do ano por aos 15 anos de
idade vender camisolas estampadas.
Tivemos Cristina Espírito Santo, da família
banqueira, a ser copiosamente insultada por contar que nas férias levava uma
vida mais simples a, cito, "brincar aos pobrezinhos".
Tivemos a jornalista
Judite Sousa a saborear o fel das redes sociais depois de perguntar na TVI a um
jovem herdeiro, Lorenzo Carvalho, se não achava que podia ser visto como uma
pessoa fútil e se a forma como gastava dinheiro não podia ser considerada
ofensiva.
Jonet disse um disparate mas merecia crédito pelo trabalho que faz no Banco
Alimentar Contra a Fome e direito a ser desculpada por, no fundo, repetir, em
modo cru, o discurso da altura de Passos Coelho e companhia - afinal ela é só
uma entre mais de dois milhões e meio de portugueses que votaram a favor da tese
estupidamente suicida "gastámos acima das nossas possibilidades, agora temos de
pagar".
Martim faz muito bem em colocar em prática as suas ideias, e o paternalismo
com que foi tratado, quer pelos seus prós quer pelos seus contras, é tão triste
como o erro paterno em deixá-lo ir à televisão.
Cristina, tal como outros membros das atuais gerações da família Espírito
Santo, não aprendeu com os avós o valor imenso, que faz e desfaz fortunas, da
discrição, de nunca revelar ao mundo a sua verdadeira natureza...
Judite Sousa fez a pergunta pertinente num caso pertinente e se algo esteve
mal naquele Jornal das 8 foi a reportagem que antecedeu a entrevista, desmentida
factualmente em vários aspetos fulcrais, sem protesto, pelo simpático,
provavelmente boa pessoa mas efetivamente ostentativo, Lorenzo.
Muito do que se escreveu nas redes sociais e nos jornais sobre estes quatro
casos revela mais inveja e cupidez, escondida sob um manto moralista, do que
verdadeira consciência social. Outros fizeram a egoísta defesa de interesses
pessoais, de grupo ou de classe, ensombrada sob uma hipócrita luz de defesa das
liberdades individuais ou do direito à reserva da vida privada. Duas vergonhas.
Mas necessárias.
A riqueza é um bem escasso e finito, que tem de ser sabiamente repartido para
pagar o trabalho, o mérito individual, o investimento, o empreendedorismo ou as
necessidades sociais.
Esperar dos cidadãos e do jornalismo que não discutam a origem e a
distribuição da riqueza, o comportamento dos ricos, de forma livre e incisiva,
mesmo se eventualmente injusta, é defender, simplesmente, a podridão que nos
levou até aqui.
Pedro Tadeu, aqui