quinta-feira, 22 de agosto de 2013

A MAIS ANTIGA DEMOCRACIA ADOECEU

Os súbditos de Isabel II ancorados em Gibraltar decidiram voltar a dar umas alfinetadas nos espanhóis e, desta vez, atiraram para o fundo do mar qualquer coisa como 70 blocos gigantes de betão armado.

Foi - disseram eles - para criar um recife artificial e potenciar a biodiversidade da zona. 


Os mastodontes subaquáticos foram colocados mesmo junto à linha que separa o rochedo sob administração britânica do molhe usado pelos pescadores da vizinha espanhola La Línea de la Concepción, impedidos de fainar na área. 


No fogo cruzado de acusações, há ainda lugar às queixas dos controlos - cada vez mais apertados - na fronteira que une Espanha ao pequeno território entregue aos ingleses em 1713. Os espanhóis justificam as restrições alfandegárias: o Reino Unido não faz parte do espaço Shengen. E, alegadamente, deixa sair do rochedo rumo à península Ibérica uma quantidade apreciável de tabaco traficado.


Enquanto os políticos esgrimem argumentos, os pescadores de Algeciras e Cádiz fizeram-se ao mar para protestar nas barbas dos ingleses. As flutuantes manifestações têm sido travadas pela forte presença da frota militar britânica estacionada em Gibraltar. 



Embarcações da Guarda Civil espanhola também estão na zona, mas só a observar todas as movimentações. A 300 quilómetros de Vila Real de Santo António decorre uma batalha naval surda. Ainda sem tiros nem embarcações ao fundo, é certo. Mas este jogo está muito longe de ser uma brincadeira.



Consciente da gravidade da situação, David Cameron atirou a batata quente para Durão Barroso e apelou à mediação de Bruxelas neste conflito entre nações da Europa. Transformado numa espécie de secretário-geral de uma pseudo ONU europeia, Barroso apressou-se a ligar ao presidente do governo de Madrid e a prometer a Rajoy - e a Cameron - o envio de uma comissão técnica para analisar as queixas de ambos. 



O mais certo é que o assunto morra sem que a classe política seja capaz, pelo menos por agora, de normalizar um diferendo que todos sabemos como vai acabar. Afinal, Londres ainda se deve recordar do que lhe aconteceu em Hong Kong. Tal como Espanha deveria observar o que se passa nos enclaves de Ceuta e Melilla. No entanto, não foi só em Gibraltar que a mais velha democracia do Mundo andou a meter o pé na argola por estes dias.



No início da semana, David Miranda foi retido no aeroporto londrino de Heathrow durante nove horas sob a acusação de terrorismo. Mas, afinal, quem é Miranda? Ao que parece o único crime cometido pelo brasileiro é ser namorado de Gleen Greenwald, o jornalista do diário "The Guardian" que tem revelado os documentos secretos do ex-analista informático norte-americano Edward Snowden. Miranda denunciou pressões das autoridades britânicas para que revelasse palavras-passe do computador e do telefone, entretanto apreendidos na capital inglesa.



Ontem foi a vez da Amnistia Internacional ter denunciado publicamente que as autoridades do Reino Unido estão a pressionar o "Guardian" para destruir documentos fornecidos por Snowden ao diário. Como bem referiu um responsável da organização não-governamental, forçar desta forma a destruição pura e simples de material de uma investigação jornalística, ao arrepio de qualquer decisão judicial, é uma grosseira ameaça à liberdade de imprensa. Vinda da mais antiga democracia do Mundo, onde esse princípio deveria ser particularmente sagrado, é uma pressão ainda mais inadmissível.



Alfredo Leite, aqui