terça-feira, 24 de julho de 2012

UMA VISÃO, OU A FALTA DELA

"As coisas práticas são fantásticas, mas devem corresponder a uma visão, a uma ambição".

A frase é de Augusto Mateus, tão bom economista quanto comunicador. O ex-ministro usou-a há dias, durante a apresentação de uma parte da estratégia que o Minho pretende desenhar - e pôr em prática - para aproveitar o próximo bolo de fundos comunitários.
A crítica que uma parte dos municípios da Região Norte dirige à reprogramação do atual QREN (Quadro de Referência Estratégico Nacional) feita pelo Governo tem muito a ver com a sentença de Augusto Mateus. Basicamente, os municípios reclamam mais dinheiro para concluir projetos em curso (sob pena de deixarem as obras a meio) e/ou para lançarem outros que estão mais ou menos contratualizados. A pergunta que se impõe, em tempos de vacas muito magras, é: essas obras, por muito fantásticas que sejam, correspondem a uma visão?
O passado recente mostra que não. Os dados do presente mostram que não.
A lógica do minifúndio institucional, do olhar para a árvore em vez de fitar a floresta, manteve-se, tristemente, como fio condutor do uso dos fundos comunitários. As autarquias preferiram a rotunda e a piscina, de preferência grandes e vistosas. Claro: quando a economia começou a derrapar e o crédito a faltar, os problemas começaram a saltar como pipocas no micro-ondas.
Sem liquidez e com endividamento galopante, a taxa de execução dos fundos comunitários começou a baixar drasticamente. Resultado: hoje, há mais de mil milhões de euros de verbas comunitárias para gastar nos próximos três anos. Vale o mesmo dizer: os municípios terão de duplicar o ritmo da execução para absorver a totalidade dos fundos que lhes estão destinados. Ou ficam simplesmente sem eles! Como o farão, se uma boa maioria não consegue já cumprir o serviço da dívida, ou sequer pagar as contas a tempo e horas? Eis a pergunta que vale um milhão de euros.
A culpa é toda dos municípios? Não, não é. Os autarcas podem ter muitos defeitos, podem permitir que a vaidade da obra fácil lhes encurte as vistas, mas não são tolos. Quer dizer: se avançaram com obras, recorrendo a empréstimos bancários para garantir o seu arranque, foi porque alguém lhes abriu a via para o investimento, foi porque alguém lhes prometeu mundos e fundos. Talvez não fosse mau que os autarcas dissessem quem os animou...
O ponto mantém-se: o recurso a fundos comunitários faz tanto mais sentido quanto mais estruturantes para a Região Norte forem os projetos (daqueles que criam emprego, por exemplo). Para isso é preferível o diálogo entre os atores, que abre portas, à mera posição sindical, que as fecha.

Os tempos são de exigência: económica, financeira e política. Ter "uma visão, uma ambição" para enquadrar os problemas ajuda muito. Acho eu. "

Retirada daqui