Caro Paulo Barata:
Agradeço, penhoradamente, o esforço que certamente terá feito para ler a ‘Carta à Tia Assunção’ tendo em conta o facto de se tratar de uma leitura que, conforme confessou, o terá deixado ‘perplexo, ou mesmo atónito sem reconhecer o sujeito do texto’; muito me apraz, no entanto, registar que tanto esforço terá, decerto, sido minimamente compensado pelo facto de o dito artigo, como recurso literário, o ter ‘deixado plenamente satisfeito ao ponto de ter conseguido deixá-lo mais enriquecido no final da leitura’.
E por isso, ainda que inexistissem outras razões, só esta, por si só, já seria bastante para que o paciente Job tivesse escrito à Tia Assunção!
Como há-de ter percebido, a dita carta é uma glosa que visou evidenciar a confusão lançada com a publicação da legislação relativa à reorganização administrativa territorial autárquica, plasmando posições em confronto e que são sustentadas por personagens ficcionadas (ou talvez não): a Tia Assunção que, a par dos seus primos (a maioria dos quais simbolizam os presidentes de junta) e de muitos fregueses (símbolos da população anónima), resistem à agregação das suas freguesias, assim representando a posição de todos quantos comungam da ideia que esta reorganização administrativa belisca o reconhecimento da identidade histórica e cultural das comunidades locais, cujas freguesias venham a ser agregadas; a outra personagem, o sobrinho Job, que pugna pela posição oposta e que representa todos quantos entendem que a matriz reformadora contribui para a homogeneidade da organização do território concelhio, sem afectação da identidade, da cultura, do património, das tradições e dos muitos anos de história das populações de cada lugar.
Relativamente ao subscritor do texto, esse
tem nome e rosto: chama-se Jorge Mendonça, é vereador não-executivo da câmara
municipal de Oliveira do Bairro, e em relação ao assunto em questão, já teve
ocasião de manifestar a sua posição numa reunião da iniciativa da Comissão Permanente da
Assembleia Municipal de Oliveira do Bairro, posição essa que
foi aqui publicada e da
qual se infere que a reforma do actual mapa administrativo é necessária e deve
assentar nos princípios da defesa do serviço às populações, da optimização do
investimento, do efectivo exercício das competências e do combate ao
desperdício.
Uma reforma que permita ganhos de eficiência,
e massa crítica, mas que não ponha em causa a identidade local, nem fomente a
acrimónia entre freguesias.
Aliás, Caro Paulo Barata, devo lembrá-lo que,
até ao momento, apenas um dos sete membros do executivo municipal tornou pública
a sua perspectiva sobre esta candente questão: e esse membro sou exactamente eu.
Quanto aos demais membros do executivo, nenhum
outro, para além do senhor presidente da câmara, manifestou publicamente a sua opinião sobre
a questão; e mesmo esta, a do senhor presidente da câmara, ficou confinada ao
conhecimento dos autarcas presentes na dita reunião, sem que da mesma tivesse havido
eco público ou transmitida qualquer nota de divulgação, fosse de que forma
fosse.
E por isso, não serei eu a dar visibilidade pública
a essa opinião, manifestada a título pessoal, numa reunião circunscrita aos
autarcas das freguesias e do município de Oliveira do Bairro.
Aqui chegado, sou forçado a concluir que foi intempestiva
e até estranha, a dúvida que suscita quanto à possibilidade de os ‘munícipes de
cada uma das seis freguesias do concelho de Oliveira do Bairro, conhecerem as interpretações
e os esclarecimentos de um dos sete eleitos para o executivo municipal, sobre este assunto tão magnânime para
o quotidiano de alguns oliveirenses’.
Desde logo porque essas interpretações e
esses esclarecimentos, depois de prestados no momento e no local próprio, foram
por mim tornados públicos num dos dias imediatos, publicando-os aqui.
Caro Paulo Barata:
Compreendo a sua preocupação com a questão, e
interpreto a sua intervenção nesta questão como um acto cívico e de cidadania;
e até reconheço o seu empenho e o seu orgulho, ou até mesmo devoção, para com Oliveira do Bairro, a sua
história e a sua gente.
E por isso mesmo, só esse irreprimível sentimentalismo pode ter turvado a lógica do seu raciocínio, ao ponto de confundir o pensamento de Job, o ficcionado personagem, com o pensamento do autor do texto, o agora subscritor.
E por isso mesmo, só esse irreprimível sentimentalismo pode ter turvado a lógica do seu raciocínio, ao ponto de confundir o pensamento de Job, o ficcionado personagem, com o pensamento do autor do texto, o agora subscritor.
Uma
confusão que, no seu respeitável ponto de vista pode mesmo configurar incumprimento
da Constituição, resultante do facto de eu não ter esclarecido o que percebo e
com o que concordo.
Só
por estultícia da minha parte ousaria atrever-me a querer desrespeitar a Constituição
da República até porque, a realidade vai dando mostras que talvez não sejam assim
tão infundadas as dúvidas quanto ao decurso de uma suspensão temporária desse
magno texto.
É que esse gesto, o do incumprimento da constituição, porque demasiado nobre e importante, só está ao alcance de presidentes da república que se esquecem que juraram fazê-la cumprir, de membros do governo que fingem desconhecê-la ou de juízes do tribunal constitucional que a moldam politicamente; actos estes que, obviamente, não estão ao alcance de um humilde vereador não-executivo de uma autarquia local.
É que esse gesto, o do incumprimento da constituição, porque demasiado nobre e importante, só está ao alcance de presidentes da república que se esquecem que juraram fazê-la cumprir, de membros do governo que fingem desconhecê-la ou de juízes do tribunal constitucional que a moldam politicamente; actos estes que, obviamente, não estão ao alcance de um humilde vereador não-executivo de uma autarquia local.
Nesta circunstância, é irrelevante qualquer
evolução filosófica que atine com a correcta ou incorrecta transposição para a
lei em vigor, do compromisso assumido no memorando assinado pelo governo
português e pelos partidos políticos que representam o anterior e o actual
governo; como irrelevante é a alusão ao facto de estes três partidos políticos
estarem representados nos órgãos autárquicos
do município de Oliveira do Bairro; como irrelevante também é saber se há ou
não municípios deste país, que já manifestaram publicamente intenção de
reduzir o número das suas juntas de freguesia, se esse eventual acordo é ou não
alargado entre os seus eleitos locais e
os partidos que os elegeram.
Em bom rigor, o único facto que interessa
chamar à colação é a vigência de uma lei aprovada pelo órgão competente
(Assembleia da República) e que se encontra em vigor; o que, no entanto, não
significa necessariamente a irreversibilidade da reorganização administrativa
territorial autárquica nos termos em que se encontra legislada, uma vez que a
constitucionalidade da dita lei ainda poderá vir a ser posta em causa.
Aqui chegados, o que há que perceber é se,
enquanto vereador ou, para utilizar a sua feliz definição, enquanto ‘representante
livremente eleito em sufrágio universal’ posso ou não vincular com o meu voto um eleitorado que pensa o
contrário do que eu penso seja porque conhece mal a lei, seja porque a conhece
bem e dela discorda.
Bem sei que no seu superior entendimento, me
cumpriria a obrigação de provocar a troca de ideias e de promover conversações
para que o eleitorado tenha oportunidade de manifestar a sua opinião.
Mas, salvo melhor entendimento, essa é
uma obrigação que impende sobre quem aprovou
a lei que estabelece os objectivos, princípios e parâmetros da reorganização
administrativa da reorganização administrativa territorial autárquica e que simultaneamente
define e enquadra os termos da participação das autarquias na concretização
desse processo; e depois, porque é ao senhor presidente da câmara que a
hierarquia do poder atribui a representação do órgão executivo do município, e não
a um qualquer vereador, tenha ou não pelouro atribuído.
Como sabemos, a população do concelho de
Oliveira do Bairro entregou a gestão da nossa dúzia de freguesias a candidatos eleitos
pelas listas dos partidos que, em coligação, formam hoje o governo da nossa
república.
No programa eleitoral que apresentou para as
últimas eleições legislativas, um destes partidos (PPD/PSD) propôs-se avançar
para uma descentralização
administrativa defendendo que em relação à mesma é fundamental estabelecer
uma racionalidade participada pelos municípios e pelas populações.
Perante estes factos, meu Caro Paulo Barata,
responda-me se souber:
?Podem o vereador Jorge Mendonça e os demais
autarcas do concelho, em consciência, concluir que a agregação do número de
freguesias do nosso concelho foi previamente participada pelos fregueses do
concelho?
?E assim sendo, colocados perante esta
questão da agregação de freguesias, não será que o vereador Jorge Mendonça e os
demais autarcas de Oliveira do Bairro só cumprirão a sua obrigação se a sua posição
reflectir aquele que, em consciência, é o sentimento dos fregueses do concelho?
Por sua vez, no manifesto eleitoral que
apresentou, o outro partido (CDS-PP) defendeu que para a reforma do mapa
administrativo seria garantida a audição da população.
Assim sendo, meu Caro Paulo Barata, esclareça-me
se souber:
?Podem o vereador Jorge Mendonça e os demais
autarcas do concelho, em consciência, concluir que a reestruturação
administrativa aprovada, foi precedida da audição das populações de Oliveira do
Bairro?
?E por isso, não estando o vereador Jorge
Mendonça e os demais autarcas do concelho a emitir opinião sobre um normal acto
de gestão corrente, não terá a sua posição que ser firme e sem margem para qualquer
dúvida?
Ignoro completamente qual é o entendimento
que tem sobre ‘representatividade eleitoral’ ou até mesmo se a considera alguma
minudência irrelevante.
No que à minha pessoa diz respeito, faço
questão de cumprir escrupulosamente o princípio segundo o qual quando sou chamado,
enquanto autarca, a tomar posição sobre qualquer situação, a minha obrigação é
manifestar a vontade de quem me elegeu, e não a minha própria vontade…
Bem sei que há quem assim não pense e actue; quanto
a mim, faço absoluta questão de pautar a minha intervenção política na estrita
defesa dos interesses dos fregueses e munícipes que me elegeram.
Afinal, foi a isso que me comprometi quando,
na minha tomada de posse, jurei solenemente e pela nossa honra, desempenhar com
lealdade as funções que me foram confiadas.
E por isso, pela minha parte, honrarei esse
juramento!
Ainda que para isso tenha de renunciar,
àquela que é a minha perspectiva pessoal, de necessidade de reforma do actual
mapa administrativo, e à qual, em consciência, não posso aderir porque não
sinto que seja essa a vontade de quem represento.
Basta aliás, recordar que quando em 2009 o eleitorado
de Oliveira do Bairro conferiu ao vereador Jorge Mendonça e aos demais autarcas
do concelho o mandato que agora exercem, nenhum desses eleitores depositou nos
seus eleitos o seu voto de confiança para participar e decidir sobre a organização
administrativa do país, e de uma forma específica do concelho de Oliveira do
Bairro.
Caro Paulo Barata:
Espero ter conseguido ilucidá-lo sobre o
fundamento da expressão “Eu, por mim, dispenso a explicação; porque já
percebi e concordo; no entanto, enquanto autarca, não posso vincular com o meu
voto a um eleitorado que pensa o contrário do que eu penso seja porque conhece
mal a lei, seja porque a conhece bem e dela discorda”.
Aqui chegado, importa que lhe refira que na
minha qualidade de vereador, estou vinculado ao dever de lealdade para com os demais
autarcas do concelho, e principalmente para com o eleitorado das freguesias e do
município de Oliveira do Bairro.
E por isso, será ao senhor presidente da assembleia municipal com conhecimento ao senhor presidente da câmara que apresentarei, em primeira mão, a minha perspectiva pessoal sobre a questão da reorganização administrativa territorial da autarquia de Oliveira do Bairro.
Uma reforma que, do meu ponto de vista, não deve cingir-se ao estrito cumprimento de critérios matemáticos ou numéricos, de régua e esquadro, antes deve ter-se nesta reforma uma oportunidade para atalhar eventuais assimetrias nivelando a escala, a massa crítica e a dimensão humana de todas as freguesias do concelho, como forma de aumentar a qualidade de vida das suas populações.
E por isso, será ao senhor presidente da assembleia municipal com conhecimento ao senhor presidente da câmara que apresentarei, em primeira mão, a minha perspectiva pessoal sobre a questão da reorganização administrativa territorial da autarquia de Oliveira do Bairro.
Uma reforma que, do meu ponto de vista, não deve cingir-se ao estrito cumprimento de critérios matemáticos ou numéricos, de régua e esquadro, antes deve ter-se nesta reforma uma oportunidade para atalhar eventuais assimetrias nivelando a escala, a massa crítica e a dimensão humana de todas as freguesias do concelho, como forma de aumentar a qualidade de vida das suas populações.
Uma reforma que, na minha modesta opinião, ouse
promover dinâmicas económicas e sociais, e que tenha na devida conta a
tipologia predominante das actividades económicas, o grau de desenvolvimento
das actividades geradoras de fluxos significativos de população, bens e
informação, a dimensão e o grau de cobertura das infra-estruturas urbanas e da
prestação dos serviços associados, nomeadamente, dos sistemas de transportes
públicos, de abastecimento de água e saneamento de distribuição de energia e de
telecomunicações e o nível de aglomeração de edifícios.
Depois disso, terei todo o gosto em
transmitir-lhe a alternativa que defendo, e a posição que, face à perversidade e iniquidade da lei em vigor, entendo que deve ser assumida.
Receba um abraço do
Primo Job
(ou antes
do vereador Jorge Mendonça)