“É uma honra estarmos aqui
para homenagearmos um oliveirense e bairradino que foi e é um dos mais elevados
vultos culturais do nosso concelho”, afirmou António Capão, no último sábado,
durante a sessão que decorreu no auditório da Biblioteca Municipal, tendo como
pretexto o lançamento do livro “Acúrcio Correia da Silva e a Bairrada”, do
escritor mealhadense, Breda de Carvalho.
Abriu a sessão solene, presidida pelo presidente da Câmara, Mário João
Oliveira, ladeado por Mons. João Gonçalves Gaspar e pela vereadora da Cultura,
Laura Sofia Pires, o presidente da ANOB, Victor Pinto, que se mostrou
satisfeito por ver concretizado um sonho que vinha sendo alimentado há 10 anos.
Inquietava-o o alheamento e o desconhecimento desta figura da freguesia,
principalmente pela juventude Precisamente, desde a altura em que a Associação
entendeu depor aos pés do monumento, erguido no largo Padre Acúrcio, um ramo de
flores. Aí (2002) germinou a ideia da edição de um livro com a sua vida e obra.
Ao fim dessa década, sopraram ventos favoráveis: havia livro e a ANOB encontrou
um parceiro, a AJEB (Associação de Jornalistas e Escritores da Bairrada, hoje
em banho-maria…) que apoiou a edição.
“Estamos aqui para lembrarmos
uma personalidade, nascida no Cercal “Verde”, [como dizia o padre poeta] que
personalizou um verdadeiro líder, lutador por profundos valores espirituais e
humanos, regionalista talentoso, de inquestionável carácter e humildade”,
referiu Victor Pinto.
Tolerância e compreensão.
O orador António Capão começou por relevar a
importância do “contributo [do autor do livro] para a honorabilidade de um
oliveirense e bairradino ilustre que, às vezes, parece esquecido, o padre
Acúrcio” que, em 1925, deixava a terra dos vivos, “mas os frutos do seu
trabalho ficaram para a nossa atracção, encanto e alguma especulação”.
António Capão que muito se
“enfronhou” na vida do autor de “Sonetos do Sul”, revelou que “terei passado, papel
a papel, os registos quase abandonados do seu espólio singular… à volta de
quinhentos registos do mais variado cariz que nos obrigaram a percorrer os
caminhos privados do nosso autor do Cercal”, mas o seu número aproxima-se do
milhar. Graças a um trabalho de recolha por parte do Museu de S. Pedro da
Palhaça a quem se deve a exposição de uma pequena parte do espólio do padre
Acúrcio, que irá permanecer patente ao público durante as próximas três semanas
na Biblioteca Municipal. Tendo sido doada a sua biblioteca à Universidade de
Aveiro, após o oferecimento à Câmara Municipal (Outubro de 1973), não aceite, a
verdade é que “a alma”, felizmente, ficou em Oliveira do Bairro.
Abordou largamente a
proximidade de Acúrcio com Gomes Leal, depois do regresso deste à matriz cristã.
Tal como Gomes Leal, defendia os trabalhadores e os oprimidos, os mais fracos,
a liberdade de todos “como grande bandeira universal que se perpetua, embora de
outro modo”. Lendo tudo - a sua Biblioteca é prova disso, soube “fortalecer-se
ideologicamente” e “construir-se a si próprio e conseguiu sublimar-se tanto
quanto pôde, entre uma sociedade muito agitada e uma situação política que se
encontrava longe de estar estabilizada”. “Alimentado pela benéfica ternura do
amor cristão, padre Acúrcio soube sustentar, durante toda a sua vida, essa
chama brilhante da tolerância e da compreensão”, reforçou António Capão, conseguindo
assim “ultrapassar o mar encapelado de uma sociedade emergente, ligada a
idealismos transversais”.
Concelho mais rico.
Por sua vez, o autor da obra, Breda de Carvalho, justificou por que,
sendo ele da Mealhada, tanto o cativou a figura do padre homenageado. Por um
lado, foi o facto de pertencer à AJEB e, por outro, o seu “envolvimento com a
Bairrada”, “a sua/nossa pátria regional”. Disse mesmo: “o que eu lia ou ouvia
acerca do padre do Cercal era consensual quanto à sua importância, enquanto
pensador e dinamizador de uma ideia cultural da Bairrada… Todos sabiam muita
coisa, mas essa coisa esprimida não deitava sumo que satisfizesse a minha
curiosidade. Eu queria saber concretamente o que tinha sido Acúrcio Correia da
Silva, enquanto homem, escritor, pensador; eu queria saber com a minha sede
bairradina o que representava a Bairrada para o padre poeta e cronista”. E
tomou a decisão de estudá-lo e “colocá-lo num pedestal consentâneo com o seu
real valor”.
Encerrou Mário João Oliveira.
afirmando que “ hoje o concelho ficou mais rico. Passou a dispor de um
instrumento cultural que responde a perguntas sobre quem é padre Acúrcio”.
Declarou ainda toda a disponibilidade e apoio na área da cultura e não
descartou a ideia de a câmara tentar diligenciar no sentido do regresso da biblioteca
do padre Acúrcio ao concelho.
Armor Pires Mota, no 'Jornal da Bairrada' de 19 de Abril de 2012