São narrativas breves mas não fugazes as que compõem Contos do efémero, primeiro livro de Rui Sousa Basto. Lê-las equivale a entrarmos num universo alternativo que, por improvável que possa parecer, é revelador da animalidade associada à condição humana. Evitando as fáceis armadilhas da gratuitidade e do moralismo, o autor colou a essas narrativas uma notável contenção estilística que apenas aumenta o seu impacto.
Os exemplos dessa atracção particular pelo sombrio ou insólito atropelam-se. Há políticos internados de urgência por terem sucumbido às garras da honestidade, agentes da autoridade escrupulosos no cumprimento das leis severas mas apenas fora das horas de serviço, octogenárias que, por recusarem os sinais do tempo, não abdicam do uso de máscaras...
Na derradeira micro-história, um escritor vê-se forçado, a pedido do editor, a resumir cada vez mais o seu romance de mil páginas, por razões relacionadas com as solicitações do mercado. No final, após sucessivas intervenções, o livro é condensado a uma única frase, escrita “na lápide da campa onde enterrou o editor”.
Num parágrafo, Rui Sousa Basto consegue descrever situações-limite, reveladoras do frágil equilíbrio em que assentam as supostas regras civilizacionais. A escrita seca, despida de artifícios, revela-se a mais indicada para traduzir estes estados de alma, à semelhança dos desenhos de Pedro Aires, cujos traços elegantes impressionam pela sobriedade.
(Sérgio Almeida)
TÍTULO: Contos do efémero
AUTOR: Rui Sousa Basto
EDITOR: Opera Omnia
PREÇO: 13 euros
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