Hoje, às 22h22, vai para o ar o último programa de humor político em Portugal. Ao fim de 15 anos, os bonecos vão para paradeiro incerto.
Bimbo da Costa, a figura mais popular do "Contra Informação", inspirada em Pinto da Costa, teve um início de vida difícil. Ao fim de três meses na RTP, queriam acabar com a sua carreira. A ameaça era clara. Se não parassem de gozar com Pinto da Costa a transmissão dos jogos de futebol estaria em causa.
"Foi um dos momentos mais importantes. Bimbo da Costa era muito popular e quando ligaram para a RTP na tentativa de acabar com a brincadeira, o Joaquim Furtado, na altura director de programas, nem hesitou. Percebemos que trabalhávamos sem pressões", diz Nuno Artur Silva, fundador das Produções Fictícias e um dos pais do "Contra Informação" que termina hoje.
O guionista criou a equipa que ia celebrizar figuras como Acabado Silva, Regressado Silva, Cassete Cunhal ou José Trocas-te e escolheu José de Pina e Rui Cardoso Martins para darem vida a estas personagens. "Criámos um universo paralelo e mantínhamos características de personalidade, o que dava continuidade às personagens. Um ano depois Pinto da Costa confessou que achava graça."
A produtora do "Contra Informação", Mandala, tinha produzido um programa semelhante na SIC, "Cara Chapada", inspirado no "Spitting Image", mas sem sucesso. Acabou por se mudar para a RTP e o nome "Contra Informação" foi uma sugestão de Joaquim Furtado, que lhe deu o horário nobre – a seguir ao telejornal. Passado pouco tempo, todas as figuras públicas queriam um boneco.
Herman José conta que adorava o seu Armando José. "Primeiro porque me senti homenageado aquando da sua criação, e depois porque foi sempre usado com muito humor", diz ao i. Mafalda Mendes de Almeida recorda que foi chamada a uma empresa, porque o administrador queria um boneco. "Foi difícil explicar-lhe que não era assim tão conhecido para aparecer. O boneco dava estatuto", diz a directora-geral da Mandala.
José de Pina, um dos guionistas, diz que escrever para Santana Flopes (Santana Lopes) era "fantástico" porque a vida real dava-lhe muitas piadas e que o mais difícil era o de Durão Barroso. "Não havia grande coisa em que pegar, mas com a ida para a Comissão as coisas melhoraram." Os tiques de linguagem eram o forte dos bonecos. O "Ganda Nóia", Marques Mendes, nasceu numa aula de José de Pina. "Os meus alunos surfistas diziam aquilo, então sugeri esse nome porque ele fazia bodyboard." Quem se lembra do "Carago, ai, não, carago"? Pertencia a Ferrenho Gomes (Fernando Gomes, ex-presidente da Câmara do Porto) e foi recriado com ajuda do próprio. "Numa festa do programa, ele veio ter connosco e disse: ‘Olhe, mas eu não digo carago.’ Foi assim que nasceu o bordão: "Não, ai, não carago", diz o guionista.
O fim do "Contra Informação" não foi surpresa, confessa Mafalda Mendes de Almeida. "O director de programas da RTP, José Fragoso, expôs a questão de forma delicada. O formato estava esgotado." Em Abril fariam 15 anos, mas Mafalda Mendes de Almeida não fala do fim dos bonecos: "Chame-lhe um feeling, o que quiser, mas os bonecos hão-de regressar, não sei é em que formato. A RTP não fechou a porta. Vejo isto como umas férias dos bonecos. Olhe, foram para as Maldivas." No último episódio escrito por Rui Cardoso Martins, Filipe Homem Fonseca e José de Pina que vai hoje para o ar às 22h22, na RTP1, Mário Só-Ares e Manuel Triste vão fazer tudo para entrar no Panteão Nacional. José Trocas-Te vai avaliar as potencialidades de negócio na Feira da Ladra. Seja como for, quer estejam no cemitério dos prazeres ou nas Maldivas, o certo é que com o "Contra Informação" terminam os programas de sátira política na televisão nacional. "A televisão fica mais pobre. Faz falta ao país um programa de sátira, com bonecos ou pessoas", conclui.
Funeral ou Maldivas?
Bimbo da Costa
O mais popular. Ganhou o Bobi e o Tareco, porque disse que só admitia que se rissem dele a filha, o cão e o gato. Os argumentistas não perdoaram.
José Trocas-te
O primeiro-ministro José Sócrates era um dos personagens mais requisitados nesta última fase do programa. Tanto que foi apresentado numa conferência como "José Trocas-te"
Jorge Coelhone
O homem do sistema, equiparado a Don Corleone, o padrinho. O antigo ministro socialista gostava do Contra e disse que a classe política aprendeu a rir-se de si mesma.
Toneca Guterres
"António Barreto disse que uma das razões que precipitou a queda de Guterres foi o ar indeciso (‘é a vida’) do boneco que amplificava as características de político", diz Nuno Artur Silva.
Vanda Marques, aqui