A concomitância com os fundos europeus ajudou a consolidar a
convicção. E assim se foi alimentando um modelo económico,
insustentável, centrado no imediatismo, na despesa, pública e privada,
sem racionalidade e no mercado interno.
Até ao dia em que as facilidades
acabaram. Incrédulos, entrámos em estado de negação de que alguns
persistem em não querer sair.
Pouco importa que, ainda há pouco tempo, os mesmos que tal
clamam tenham considerado uma descida da taxa social única de 4 pontos
percentuais, que baixaria os custos das empresas em cerca de 1200
milhões de euros, insuficiente para readquirir competitividade nos
mercados internacionais.
Agora parece que 200 milhões de rendas
excessivas que fossem, mais a mais distribuídos por clientes domésticos e
empresas, são a panaceia. Nas PPP, efabula-se como se as estradas, os
hospitais ou o que fosse pudessem voltar atrás. Nessa lógica, avançam-se
com números fantasiosos mas agora de sinal contrário. Quem decidiu,
inicialmente, olhou o futuro do lado dos benefícios. Agora,
apresentam-se os custos totais, como se de um esbulho se tratasse, como
se não houvesse sempre custos a suportar, mesmo que a alternativa não
fosse uma PPP. A radicalização da análise serve, quase sempre, para
distrair atenções e alijar responsabilidades próprias. Mistifica e não
ajuda, sequer, à negociação que só pode avançar assente em bases sólidas
e estudos não enviesados.
Ao contrário do que pode ser intuitivo e, sobretudo, conveniente,
quando se tem um grande problema, e Portugal tem um grande problema,
raramente o mesmo é da responsabilidade exclusiva de um número pequeno
de entidades que se conhecem, cujo poder se intui e escrutina. O
problema só se torna difícil de resolver por haver uma proliferação
difusa de pequenas rendas, propriamente ditas ou provenientes de
ineficiências e distorções as mais variadas, sem penalização no mercado.
Juntas, somam milhões. Resultam de grandes concursos e contratos,
apesar de tudo, cada vez mais sob vigilância pública. Resultam de
milhares de pequenos concursos, que passam incógnitos, com cláusulas
destinadas a favorecer alguém, impedindo ou distorcendo a concorrência.
Têm em comum o envolvimento de fundos públicos ou europeus mas não só.
Fazem parte de uma cultura, herdada do salazarismo e alimentada pelo
crescimento tentacular do Estado, que abomina o mercado. Passos Coelho
tem razão em a querer atacar. Se não ceder, vai ter guerra para mais de
uma legislatura com vastas frentes de batalha: interesses os mais
diversos que se habituaram a viver à sombra e à custa do Estado, as
corporações sindicais e patronais, as ordens profissionais, os grupos de
interesse não declarados, o nepotismo e o compadrio, a falta de cultura
de concorrência, a inércia. Sem um sistema de justiça eficaz
dificilmente será bem-sucedido e, nessa frente, as notícias não são
animadoras.
Existia a expressão ad hominem. A associação sindical dos
juízes inovou e criou os processos ad governum. Um precedente perigoso, e
um teste aos outros poderes. A reforma da justiça não é apenas uma
questão de organização. É, sobretudo, uma questão de pessoas. Se não se
pode fazer uma reforma contra os funcionários, com gente mesquinha e
medíocre a tarefa fica ciclópica.
Paula Teixeira da Cruz vai ter de suar
e ter arte.
Alberto Castro, aqui