Uma equipa científica luso-espanhola acaba de revelar a descoberta, no Mar Mediterrânico, do ser vivo mais velho da Terra, uma planta marinha que terá pelo menos 100 mil anos, disse hoje à Lusa uma das autoras da investigação.
A descoberta foi publicada na semana passada na revista Public Library of Science One e refere-se a um trabalho científico que decorreu entre 2005 e 2009, tendo por objecto a planta Posidónia oceânica.
«Descobrimos espécimes da Posidónia oceânica que poderão ter entre 10 mil e 100 mil anos e possivelmente mais. Nunca se tinha encontrado na Terra um ser com uma idade tão avançada», garantiu a investigadora Ester Serrão, do Centro de Ciências do Mar da Universidade do Algarve, que liderou a equipa portuguesa.
O trabalho científico tinha como objectivo medir a área abrangida por um mesmo indivíduo daquela espécie, de forma a calcular a sua idade, com base no conhecimento de que a taxa de crescimento da espécie é de 4 centímetros ao ano.
«A espécie conhece-se há muito tempo, mas o que nós conseguimos agora foi descobrir onde começa e acaba um mesmo indivíduo da espécie», explica Ester Serrão, observando que, «quando vemos uma pradaria marinha, não sabemos à partida se vem de uma mesma semente ou de várias sementes».
Assim, o estudo visava determinar se uma planta com um segmento em determinado local do Mediterrâneo era a mesma que tinha um segmento num outro local, investigação que foi feita com recurso ao estudo das características genéticas desses segmentos, feito posteriormente em laboratório.
«Através das características genéticas, podemos ver se as plantas que se encontram em determinado local vêm todas da mesma semente e portanto se é o mesmo indivíduo, que se vai reproduzindo, formando clones de si próprio», afirma Ester Serrão.
Sublinha que, nos casos em que se copia a si própria, um mesmo espécime de Posidónia oceânica «pode ocupar centenas de metros ou quilómetros, sem que se forme um indivíduo novo, pois é sempre o mesmo indivíduo a crescer».
Ester Serrão compara os métodos laboratoriais para determinar a «pegada genética» dos espécimes aos usados para fazer testes de paternidade em humanos ou nas investigações que se podem seguir a um crime, baseados nos marcadores genéticos existentes nas amostras recolhidas.
Assentes naqueles métodos, a equipa luso-espanhola descobriu vários indivíduos com cerca de 7 quilómetros e um mesmo indivíduo com um comprimento total de 15 quilómetros.
Contudo, a investigadora da Universidade do Algarve considera que os casos mais extremos «não são necessariamente o resultado da propagação por clones», pois alguns dos fragmentos dispersos ao longo do fundo marinho podem ter-se desprendido e sido arrastados pelas marés, enterrando-se nos sedimentos e crescendo a partir daí.
Daí que, e partindo de uma perspectiva conservadora, os cientistas não tenham considerado o maior espécime, de 15 quilómetros, como sendo contínuo, o que faria com que, aplicando-se a taxa de crescimento conhecida, a sua idade rondasse os 200 mil anos, optando por datá-lo em 100 mil anos, datação que Ester Serrão garante ser cientificamente fiável, como «idade mínima».
Ainda assim, há vários outros indivíduos com dezenas de milhares de anos, recolhidos nos 1.544 campos de amostras existentes em 40 pradarias marinhas ao longo dos 3.500 quilómetros de comprimento do Mar Mediterrânico.
A cientista lamenta que, apesar da sua resistência e longevidade, a Posidónia oceânica esteja a desaparecer a uma taxa que se estima em 10% nos últimos 100 anos, sobretudo devido à turvação da água provocada pela poluição marítima, lembrando que a erva marinha se alimenta da luz do sol, pois faz a fotossíntese.
Sublinhou que se trata de uma planta indispensável para o desenvolvimento da biodiversidade no sul da Europa, sendo essencial para o crescimento e desenvolvimento de várias espécies de peixe, como elo da cadeia alimentar oceânica.
O trabalho de campo do estudo foi efectuado entre 2005 e 2008 e os posteriores trabalhos de investigação laboratorial decorreu em 2009 no Centro de Ciências do Mar da Universidade do Algarve.
Contudo, a primeira publicação científica do trabalho só teve lugar na semana passada, encontrando-se gratuitamente acessível online à comunidade científica de todo o Mundo.
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