Não, não me refiro a este tempo de inesperada canícula outonal que anda a incomodar os agricultores.
Refiro-me ao tempo que nos escapa por entre os dedos, ao tempo que não conseguimos esticar, ao tempo de que precisamos como de pão para a boca para conseguirmos pôr as contas em dia - as do país, as das empresas e as das famílias.
À medida que o tempo passa, fica cada vez mais evidente que o dinheiro emprestado pela troika a Portugal, por troca pela aplicação de duríssimas medidas de contenção dos gastos e de obtenção de receitas, dificilmente chegará para atingir os objectivos no prazo de tempo estipulado pelas partes.
António Borges, actual director do FMI e voz ouvida com frequência na altura em que Manuela Ferreira Leite liderava o PSD, tocou na ferida há dias, ao dizer que corremos o risco de entrar num perigosíssimo círculo vicioso: "quebra da riqueza produzida pelo país (PIB), seguida de maior austeridade fiscal, a que se segue maior quebra do PIB". Quer dizer: a cura desenhada pela troika pode bem matar a economia. E sem economia não há país.
O reaparecido ministro da Economia sabe bem do que fala António Borges. É por isso que defende um reforço da competitividade das nossas exportações, com TGV ou sem ele. Problema de monta: não há tempo para esperar o efeito positivo dessa boa aposta. E como não há tempo, a solução, provisória, tem de vir do lado da receita.
Eis um emblemático exemplo. Há dias, um empresário contava--me que um seu concorrente tinha duplicado, no espaço de um ano, a exportação do seu produto (de 15 milhões para 30 milhões de euros). Fantástico resultado! Acto contínuo, recebeu um telefonema do Fisco. Para lhe dar os parabéns? Não - para lhe dizer que as centenas de milhares de euros que tinha a reaver de IVA ficavam cativas, até que chegasse ao fim um processo de averiguações cujo objectivo é perceber como pôde o empresário, numa época destas, duplicar as exportações! É a isto, creio, que se chama matar a economia. A culpa disto é do tempo que não temos e do modo estúpido que temos para tratar fiscalmente quem arrisca e, felizmente, petisca. O Fisco taxa - e muitas vezes maltrata - tudo o que mexe, porque todos os cêntimos são precisos para ajudar ao cumprimento do défice.
Sim, o défice será alcançado, porque ainda há para aí receitas extraordinárias para tapar os buracos. Isso é, contudo, meramente conjuntural. Sem uma economia que produza e liberte riqueza (coisa que o empresário aqui referido fez no último ano), não abandonaremos o buraco. Andaremos às voltas dentro dele, com mais ou menos ajudas. Mas não sairemos de lá. É uma questão de tempo.
Paulo Ferreira, aqui