terça-feira, 4 de outubro de 2011

QUE FAZER QUANDO TUDO ARDE

Os europeus não vão comprar nada que se veja aos alemães nos próximos tempos.

Não há dinheiro em Portugal, mas também não há dinheiro na Europa.
 
Quando não há dinheiro nem ninguém empresta dinheiro, as pessoas não compram. Quando as pessoas não compram, as fábricas fecham.

E quando as fábricas – ou empresas, ou serviços – fecham, essas pessoas que já não compravam quase nada ficam desempregadas e passam a comprar zero.

É esta espiral que irá rebentar com a economia europeia no seu todo que Keynes queria evitar quando dizia que era melhor pagar a um cidadão para abrir e fechar buracos do que mantê-lo desempregado – ou seja, sem consumir produtos. Isto nem era uma posição moral que naquele tempo estava na moda e hoje não está, mas um imperativo essencialmente económico. A economia não crescia se o dinheiro não circulasse.

Hoje, o demencial status quo a que se chegou em Portugal e na Europa manda-nos “viver dentro das nossas possibilidades”. E quais são as “nossas possibilidades”? As de um país frágil, sem capacidade produtiva, a viver com uma moeda forte feita à imagem do marco alemão. São possibilidades fantásticas.

A solução em outros momentos de depressão económica foi a emigração em massa – Brasil, Alemanha, França e ex-colónias. Agora, os portugueses ainda têm uma nesga de oportunidade no Brasil e outra em algumas das ex-colónias. A Europa é para esquecer: a Alemanha e a França não vão precisar de trabalhadores e dentro de muito pouco tempo não terão emprego para dar aos seus. A Alemanha vive das exportações e não vai continuar a crescer porque o seu mercado privilegiado é o antigo mercado comum – e os europeus, portugueses, italianos, gregos e espanhóis e até ingleses não vão comprar nada que se veja, nos próximos tempos, aos alemães. Em consequência, também os alemães vão ganhar menos dinheiro, investir menos e despedir trabalhadores alemães. O Titanic era invencível e depois chocou com o iceberg – é neste ponto que está a Europa, a olhar para o icebergue e a tocar violinos.

A situação é tão grave que até os eurocépticos estão em transe. David Cameron, o primeiro-ministro britânico que antes de ocupar Downing Street propagandeava o seu antieuropeísmo excitado, disse à BBC este fim-de-semana que “a zona euro representa uma ameaça para si própria, mas também uma ameaça para a economia britânica e uma ameaça para a economia mundial”. Cameron gostaria de ver os “dirigentes europeus arregaçar as mangas e fazer funcionar o mercado único” e está assustado porque 40% das exportações inglesas são para a zona euro.

Chegados aqui é razoavelmente patético estar a discutir a paróquia. A paróquia era um país terceiro-mundista e tentou melhorar a sua vida. É verdade que desde o novo-riquismo cavaquista fizeram-se fortunas baseadas em endividamento ao qual nunca foi posto qualquer travão. Mas agora é tarde e Inês é morta. O problema português é um problema europeu: qualquer governo que se limite a ser um bom e passivo aluno está a condenar-se e a condenar-nos à forca.

Ana Sá Lopes, aqui