quarta-feira, 12 de outubro de 2011

IMAGINE

A insolvência da Grécia só não acontecerá por milagre.

A sua situação era, à partida, tão difícil que nem um esforço tremendo e sacrifícios inauditos chegariam.

Mais a mais, as medidas a adoptar teriam um carácter recessivo tornando a meta a alcançar num alvo móvel que vai fugindo, forçando medidas cada vez mais restritivas do lado da despesa e gravosas do lado dos impostos.

Como se não bastasse, não foi possível ter na Grécia um clima social que, ao menos, não agravasse a situação de partida com a multiplicação de greves e manifestações, mais ou menos violentas, que para além dos efeitos directos sobre o produto e o património, foram difundindo uma imagem de instabilidade, afectando o turismo, uma das bases essenciais da economia grega. A descer todos os santos ajudam. A desaceleração da economia mundial veio reduzir, mais ainda, a probabilidade de a Grécia escapar. A inércia dos "amigos" europeus acabou de cavar a sepultura. Só falta a Grécia saltar lá para dentro, abdicando de pagar a sua dívida. Se não o fizer será, tudo o indica, empurrada pelos "amigos" que dirão, a seguir, que foi sem querer.

Lá, como cá, a troika identificou muitos dos erros e bloqueios que impedem a economia de crescer, drenando os fundos para sectores económicos e sociais parasitários. Com a legitimidade advinda do seu estatuto de credores, estabeleceram prioridades, metas e sugeriram políticas, essenciais para alcançar a consolidação orçamental. Implícita ou explicitamente, admitiam que a plena consecução do plano dependia, criticamente, da capacidade que a economia tivesse, a partir de certa altura, de crescer. E aqui, perdoem-me a expressão, é que a porca torce o rabo. Embalada numa espiral recessiva, a única maneira de a Grécia, ou outro país com uma estrutura produtiva semelhante, conseguir alcançar os défices estabelecidos é cortando cegamente as despesas e aumentando vertiginosamente, a um nível quase da expropriação, a tributação sobre os rendimentos... tributáveis, isto é, os rendimentos do trabalho, os lucros e, quando muito, sobre o património imobiliário. A alternativa, dentro do quadro proposto, seria dar-se o milagre da economia mundial crescer tanto que permitisse uma evolução exponencial das exportações. Milagre é a palavra certa: nunca esteve previsto que a economia mundial crescesse tanto, nem é óbvio que a estrutura produtiva, ou a capacidade competitiva, de um país se transforme tão rapidamente que lhe permitisse cavalgar essa onda virtual.

A alternativa passa por uma evolução dentro do quadro proposto, uma forma de o gerir que potencie os seus propósitos. A Grécia deu, apesar de tudo, algumas provas de ser capaz de trilhar um caminho novo. Portugal está a dá-las. É importante que o faça. Mas este ritmo de consolidação é impossível de aguentar. Querem-nos no papel de "lebres" numa corrida de fundo. As lebres nunca a acabam. Vamos precisar de mais tempo e que haja uma mudança de ênfase nas metas a atingir a partir daqui. Os nossos problemas radicam numa falta de capacidade de competir nos mercados internacionais e num peso, económico, social e financeiro, excessivo do Estado. A dívida soberana só tem solução na economia. Focarmo-nos, em exclusivo, no imediato e no défice público conduz, na actual conjuntura, a uma sucessão de decisões em tesoura (menos despesa, mais impostos) incompatíveis com o crescimento. Não menos exigente, mais virtuoso, seria centrarmo-nos na despesa pública corrente primária (sem juros). Faça-se da reestruturação das administrações públicas e do Estado, essa sim, uma corrida contra o tempo. Continue-se o combate à fraude fiscal. Poderia haver mais incentivos fiscais ao investimento. A redução da TSU não obrigaria a um aumento do IVA. O ministro da Economia seria o protagonista mesmo que, em contrapartida, tivéssemos de abdicar de parte da soberania fiscal.

Um puro exercício de imaginação, incompatível com burocratas. A não ser que o falhanço na Grécia sirva de lição, vamos ver-nos gregos. Literalmente

Alberto Castro, aqui