quarta-feira, 28 de setembro de 2011

UM POVO VICIADO EM ADRENALINA

O meu pior vicio foi o tabaco. Comecei tarde, já na faculdade, mas recuperei rapidamente o atraso em nicotina, pois nos dias em que o trabalho seguia pela noite dentro cheguei a fumar três maços de SG Gigante.

Ter passado cinco dias num sítio onde era proibido o consumo de tabaco (o hospital) por causa de um problema de coração (sempre fui precoce) ajudou-me muito a deixar de fumar, em 1992.

Por medo de uma recaída, nunca mais peguei num cigarro, cigarrilha ou charuto. Curei-me do terrível vício do tabaco, mas tenho outras dependências, que classifico de menores (somos sempre muito indulgentes connosco) como ver séries de televisão, ler thrillers e policiais, comer queijos e enchidos ou enrolar o papel dos pacotes de açúcar - mania que não é tão simples de alimentar porque tomo o café sem açúcar.

Se me perguntassem, assim de repente, qual o vício de que eu gostaria de me livrar, não hesitaria em responder: a adrenalina.

Partilho com a imensa maioria dos meus compatriotas o mau hábito de deixar para amanhã o que podemos fazer hoje, em que nos viciamos ainda catraios (pagando com pingas nas cuecas o pecado de deixar para a última a ida à casa de banho) e depois transportamos pela vida fora, estudando só nas vésperas dos exames e fazendo noitadas para cumprir os prazos.

Nós, os portugueses, somos todos viciados em adrenalina. Deixamos as coisas andar alegremente até o stresse obrigar as glândulas supra-renais a bombar para a corrente sanguínea enormes quantidades de adrenalina, um doping natural que dilata a nossa performance para além do normal.

Somos um povo de viciados em adrenalina, que se agiganta em momentos de grande stresse nacional, principalmente se conduzidos por uma liderança esclarecida e mobilizadora (como na época das Descobertas) ou reunidos em torno da prossecução de um grande objectivo mobilizador - vejam-se os casos recentes da Expo 98 e do Euro 2004.

Estamos a começar a tentar contornar a mais difícil esquina da História do Portugal que encontrámos durante as nossas vidas. Para se sustentar , o país precisa de mil milhões de euros por semana. Já todos percebemos que vai haver menos rendimento para gastar e pagar dívidas, que acabou o crédito fácil e barato, que vai haver muito menos investimento público, mais desemprego com menos subsidio, que vamos ter serviços (electricidade, transportes, saúde e educação ) mais caros e impostos mais altos.

Neste dia em que Governo comemora 100 dias e a crise pôs a adrenalina a circular-nos nas veias, só nos resta acreditar que Passos Coelho vai ser capaz levar este bom povo católico e viciado em adrenalina a acreditar no milagre regenerador do grande sacrifício nacional.

Jorge Fiel, aqui