segunda-feira, 1 de agosto de 2011

JÁ CHEIRA MAL TANTA HISTORIETA SECRETA

Só num país do terceiro mundo acontecem estas novelas com espiões de pacotilha.

Um cidadão vindo de Marte ou Neptuno aterra em Portugal e deve ter imensa dificuldade em entender o que vai na cabeça de muita gente numa altura em que andam por aí uns estrangeiros a vigiar as contas nacionais, regionais e locais, a justiça, a educação, a legislação laboral, a reforma do Estado, os calotes das empresas públicas, o preço dos transportes, os buracos na saúde, a taxa social única, os despejos lentos, as rendas condicionadas, os créditos manhosos dos bancos e mais uma série de desgraças acumuladas ao longo de muitos e bons anos de regabofe, de dinheiro muito fácil e barato, obras sumptuárias, desnecessárias e ruinosas, de festa democrática, de modelos económicos obsoletos e de políticas de faz-de- -conta.

A ideia generalizada é que anda muita gente a disfarçar o abismo, o risco de bancarrota, a tragédia social e a fazer a sua vidinha como se nada tivesse acontecido no mundo, na Europa e nesta terrinha de Santa Maria. Os temas quentes destes dias são os 11 administradores da Caixa Geral de Depósitos, o site das nomeações do governo e, qual cereja no topo do bolo, as secretas e os espiões assinalados. É patética, triste e muito miserável a novela em curso em torno do sistema de informações da República, do SIS e do SIED, dos espiões que passam ou não informação para empresas privadas, das guerras intestinas de poder no reino das secretas que, como toda a gente sabe, é tão secreto como um pátio das cantigas com as suas mulheres do soalheiro.

Quem pára, escuta e olha para este espectáculo tem de ficar necessariamente espantado. Em primeiro lugar, os serviços de informação portugueses nunca primaram pela competência, a eficácia e o prestígio. São, aliás, protagonistas de algumas histórias verdadeiramente hilariantes. Tanto interna como externamente não gozam de uma grande reputação e, obviamente, não são interlocutores privilegiados dos principais serviços de informação. Resta- -lhes este pequeno e patético pátio das intrigas, que obviamente é interessante para quem tem projectos de poder domésticos, tanto a nível político como económico. Saber que um espião que dirige uma meia dúzia de antenas no mundo, muitas vezes sem qualquer informação relevante para os interesses da pátria, passa informação a um grupo económico revela uma triste realidade: esse grupo não terá um futuro muito risonho se baseia a sua estratégia internacional e os seus negócios nos sábios relatórios da contra-espionagem lusa.

Saber que alguém do governo ou próximo do governo pede informações ao SIS sobre um putativo secretário de Estado revela que o Estado continua a funcionar com base na coscuvilhice desta grande aldeia que se chama Lisboa e, já agora, Portugal. Quem, por sorte ou azar, já leu algum relatório do SIS percebe não só a incompetência e a falta de informação como o primarismo das análises e a demência de muitas conclusões. Dito isto, chega de nevoeiro.

Os serviços secretos não são nenhuma prioridade da pátria. São apenas palcos em que se travam guerrazinhas imbecis de poder e de coscuvilhice entre homens e mulheres que adoram andar de avental às escondidas.

António Ribeiro Ferreira, aqui