A verdadeira dimensão da tragédia de Oslo estava ainda por conhecer, quando, anteontem, chegaram as primeiras notícias de um duplo atentado na capital da paz, onde todos os anos é entregue os mais importante e distintivo galardão de reconhecimento do mérito pessoal ou institucional: o Prémio Nobel da Paz.
Os jornais fecharam as suas edições dando nota de menos de uma vintena de mortos.
Ontem, o número subiu para perto de uma centena. Ainda que tivesse falecido uma só pessoa, seria sempre uma brutalidade. Mas o facto de o autor do atentado ter disparado mortalmente sobre cem transporta-nos para uma outra dimensão do horror.
Neutral e pacífica, rica por causa do petróleo, líder no índice de qualidade de vida no Mundo, culta, a Noruega era um dos mais improváveis alvos de ataques terroristas como o que anteontem sofreu. Esta verdade esconde, porém, uma outra bem mais dura e que os nossos olhos e cabeças naturalmente recusam: não há países imunes ao terrorismo. Acabou o tempo dos países tipo oásis, cujas políticas afastam tendências securitárias e privilegiam o bem-estar da sua população, sem comprometimentos excessivos com a beligerância.
Melhor: países como a Noruega são porventura os alvos mais fáceis do mais traiçoeiro terrorismo, aquele que justamente procura nas vulnerabilidades politicamente assumidas a injecção do medo e do terror. A lição é a de sempre: não há no Mundo qualquer lugar totalmente seguro. Isto é: não há no Mundo qualquer lugar em que a (nossa) liberdade esteja imune à loucura e ao horror que o terrorismo provoca.
Parece já claro que o atentando tem a chancela da extrema-direita norueguesa (curiosidade: as bandas de música com letras mais agressivas pululam na Noruega). Ou seja: há uma mensagem política e ideológica a acompanhar a catástrofe. E é essa mensagem que interpela os noruegueses e que nos interpela a nós: o que fazer agora? Continuamos a acreditar na bondade da razão humana? Cedemos ao medo? Fechamos fronteiras para proteger os nossos da maldade tresloucada dos outros? Aumentamos o orçamento da Defesa? Defendemos a pena capital? A defesa da liberdade faz-se melhor pela via securitária ou pela via humanista, na qual se incluem os que acreditam que esta ameaça é passageira e contornável?
O atentado que ceifou a vida a uma centena de pessoas em Oslo colocou em xeque um modo de vida tão especial como o norueguês. Para eles, nada será como dantes, a partir daqui. O medo mostrou-lhes a face arrepiante - e com isso é muito difícil viver. A Noruega está confrontado consigo própria. Deixou de ser um oásis. Como o resto do mundo.
Paulo Ferreira, aqui