quarta-feira, 11 de maio de 2011

MÃOS LIMPAS

1."Fizeram mais em três semanas que nós em anos". Se aos partidos a crítica assenta que nem uma luva, para muitos economistas e analistas políticos a mesma é injusta.

Tanto assim que nada do que o memorando de entendimento contém é novidade para ninguém. A grande diferença, por exemplo, entre um Santos Pereira e a tróica, é que os segundos têm o dinheiro que nos faz falta. E quem paga a banda, escolhe a música.

Pelo menos para já, nós não estamos nisto por convicção mas apenas por interesse. Arrastámos a decisão e só quando já não havia alternativa cedemos e, mesmo assim, foi preciso Teixeira dos Santos impor-se. Essa irresponsabilidade teve como resultado chegarmos às negociações sem quase nenhum poder para... negociar - a tróica disse-o.

2. Não há programas perfeitos e este não será excepção. As medidas propostas têm as suas vantagens e os seus inconvenientes, os seus benefícios e os seus custos. Duas das preocupações consensuais, com o crescimento e com os mais desfavorecidos, parecem ter sido acauteladas. E a equidade? Quando se analisa com mais detalhe, a classe média parece ser a mais afectada - perde os mesmos benefícios e isenções que os mais ricos, para níveis de rendimento muito mais baixos. Mesmo que apenas emblemáticos, bens de luxo e mordomias empresariais não podem ser deixados de fora, sob pena de se comprometer a coesão.

3. Outras políticas, acertadas na lógica estrutural, não resolvem nenhum problema imediato, podendo, mesmo, criar alguns, exigindo medidas complementares. É o caso da redução, no tempo e valor, do subsídio de desemprego. A principal dificuldade, hoje, é não haver capacidade de criação de emprego. São muitos mais os que querem trabalhar e não encontram emprego do que o contrário. Ignorar isso, arriscando gerar convulsões sociais, é irresponsável. No mínimo serão precisos mecanismos compensatórios, ainda que com a contrapartida de trabalho, mesmo que comunitário.

4. Há alternativas ao proposto no memorando? A Islândia onde, se diz, se teria deixado os bancos falir, adoptando uma política de esquerda, tão acertada que já estariam a crescer? Todo o contrário da Grécia ou da Irlanda. Será assim? Poupo-os aos pormenores, recordando apenas que a Islândia também negociou o apoio do FMI e que o seu produto, expresso em dólares, caiu, de acordo com o Banco Mundial, cerca de 30%, na sequência de uma forte desvalorização. É verdade, este ano já crescerá. A desvalorização deu-lhes competitividade, penalizando os salários. É essa a alternativa da Esquerda?

5. À falta de exemplos, outros limitam-se reclamar terem as "mãos limpas". Será? Os principais responsáveis pelo crescimento desmesurado da dívida são, obviamente, os sucessivos governos. Era a eles que competia decidir. Multiplicaram institutos e fundações, fizeram maus contratos. Perderam o controlo da despesa, cuja fatia de leão resulta de sucessivas capitulações perante os grupos de interesses instalados no aparelho de Estado. Lembra-se de alguma proposta destes que não se traduzisse em mais despesa ou aumento de efectivos? Mãos limpas?

Alberto Castro, aqui