De longe a longe, surgem livros que se recusam a seguir as tendências dominantes, assumindo riscos que a maioria, por cautela ou défice de imaginação, se recusa a seguir. Com as naturais imperfeições e os excessos de uma primeira obra, Maria O. - de quem nada mais se sabe, através da editora, a não ser que “nasceu em Vila Nova de Gaia há mais de 20 anos. Tem escrito muito. Ainda está viva” - assina uma novela em que as convenções ficam à porta, trocadas de bom grado pela sátira e provocação.
Sem que porventura tivesse tal propósito em mente, o que a A Violação das Mulas (título cuja explicação surge só na parte final: “uma fiel representação do país – o povo a ser continuamente f... por todos os lados”) concretiza não é tarefa de somenos importância: um retrato do Portugal(zinho) em todo o seu esplendor, ou, para ser mais exacto, decadência.
Os contornos caricaturais das personagens e da narrativa servem para acentuar os excessos que Maria O. imprimiu ao livro: autarcas corruptos, mais interessados no próprio bem-estar do que na causa pública, artistas medíocres que justificam o fracasso com a incompreensão alheia ou vizinhos com propensões inatas para a bisbilhotice são alguns dos exemplares que abundam na história.
Nos percursos de Quim Tiliano Zibeta, Possidónia, Zimbelina, Deivid Uva e do filho ainda por nascer Isaac Zibeta – nomes que constituem, por si só, um verdadeiro tratado – reconhecemos o destino colectivo de um povo. Os sucessivos volte-faces que a história revela, polvilhados com delírio e non-sense a rodos, asseguram momentos de franco divertimento.
(Sérgio Almeida)
A VIOLAÇÃO DAS MULAS
Maria O.
Eucleia
10.60 euros