terça-feira, 31 de agosto de 2010

UMA LONGUÍSSIMA REFLEXÃO SOBRE O REORDENAMENTO ESCOLAR NO CONCELHO DE OLIVEIRA DO BAIRRO


Depois de inauguração do novo pólo escolar da freguesia de Oliveira do Bairro, foi confirmada na última reunião de câmara, a inauguração do novo polo escolar da Palhaça no próximo dia 5 de Outubro, quem sabe se inspirada no aqui deixei escrito no passado dia 11 de Agosto.

Depois de na última reunião ter sido aprovada a adjudicação do novo pólo escolar de Oiã poente, e de na antepenúltima reunião ter sido igualmente aprovada a adjudicação do novo pólo escolar de Bustos, importa fazer pelo menos duas reflexões sobre o reordenamento escolar do concelho.

Desde logo, importa começar por referir que a construção de nóvos pólos escolares não é uma ideia peregrina do presidente da câmara no forte investimento na área da educação; essa construção traduz-se, isso sim, na implementação, ao nível concelhio, daquilo que pelo país inteiro vai sendo feito por inúmeros executivos municipais, na sequência de uma recomendação que a OCDE (Organização para o Comércio e Desenvolvimento Económico) já vem fazendo a Portugal há mais de uma década, uma vez que a partir do Conselho Europeu de Lisboa (Março de 2000) a educação passou a ser encarada como um novo objectivo estratégico da União Europeia.

Recomendação esta com uma lógica muito simples: sendo as pequenas escolas dotadas de parcos meios, com professores que indiferenciadamente leccionavam os programas curriculares e extracurriculares, com um número reduzido de alunos, e sem estímulos por parte das comunidades locais, quer em Oliveira do Bairro quer em qualquer concelho do país ou da União Europeia, as ditas escolas não passavam de potenciais centros condutores ao insucesso escolar e à desqualificação profissional futura.

E por isso, esta medida acabou por ser implemantada depois de ultrapassada a questão do financiamento via QREN da novas construções, só possível depois de o Estado português conseguir verbas europeias para levar por diante este projecto de nível nacional.

Segundo a FENPROF, «esta é uma medida que se enquadra na política economicista de um governo que decidiu encerrar serviços públicos, independentemente dos seus custos sociais e das consequências para o futuro de um país que, cada vez mais, assiste à desertificação de vastas zonas do território, como consequência desta política»

Trata-se de uma medida com uma bondade discutível sob o ponto de vista estritamente pedagógico, uma vez que a construção de novos pólos escolares tem como consequência imediata o amontoar de centenas de alunos, muitos destes deslocalizados em ambiente de perfeito distanciamento e claro desenraizamento.

Uma aposta onde o factor humanista prevalecesse sobre o factor economicista, imporia, naturalmente, a opção por um investimento no sentido oposto ou seja, concessão a um maior número de pequenas escolas (sem prejuízo de, em alguns casos, ter de se proceder ao agrupamento de duas ou três escolas mais pequenas de aldeias vizinhas), de meios, professores e outros profissionais diferenciados, alunos e estímulos.

Apesar de não questionarem a necessidade do reordenamento da rede escolar, especialistas em Geografia Humana dizem-se preocupados com o impacto do encerramento de escolas na coesão territorial. "Se abrir uma escola do Ensino Básico não inverte a tendência para a desertificação, fechá-la, em determinadas circunstâncias, pode ser o suficiente para matar uma aldeia", alerta João Ferrão, investigador da Universidade de Lisboa e ex-secretário de Estado do Ordenamento do Território.

Pese embora esta alternativa, o que é facto é que em 2005, ainda antes de o presidente da câmara de Oliveira do Bairro imaginar que uns tempos mais tarde se dedicaria, apenas parcialmente, ao exercício do seu cargo público, ou seja muito tempo antes de ter sido eleito para o seu primeiro mandato, já estava em prática o plano de reordenamento da rede escolar, com a construção de novos pólos escolares, medida esta da qual muitos presidentes de câmara e candidatos aos cargos acabaram por tirar dividendos eleitorais, apresentando-a localmente como uma opção estratégica para as respectivas políticas concelhias.

Este processo, que desde 2005 permitiu o encerramento de cerca de 2500 escolas de pequena dimensão, determinou que mais de 20 mil crianças fossem transferidas para novos pólos escolares; e agora, em Agosto de 2010, com o encerramento de mais 701 escolas em todo o país, outras 15 mil crianças seguem o mesmo caminho, imposto por medidas governamentais e, em alguns casos, com a oposição dos municípios, oposição esta que não é uma birra, mas tem por detrás questões económicas uma vez que, sendo obrigadas a garantir os transportes escolares para os alunos do ensino básico, há câmaras municipais que não obtêm do governo o subsídio equivalente à despesa necessária para garantir o dito transporte.

As directrizes governamentais para a implementação do programa de reordenamento da rede escolar, apontam, no seu todo, para a criação de cerca de 600 novos pólos escolares, modernos e bem equipados, com todas os equipamentos tecnológicos e instalações compatíveis com as necessidades de uma escola dos tempos futuros, e cuja conclusão está prevista até ao fim da presente legislatura.

Só na zona norte do país, 102 centros escolares novos, ampliados ou requalificados vão abrir neste mês de Setembro para substituir as 384 escolas do primeiro ciclo encerradas em Julho, anunciou a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte (CCDR-N).

Deste modo, percebe-se que a cadência de inaugurações dos novos pólos escolares de Oliveira do Bairro, se limita a acompanhar o cronograma estabelecido pelo governo central numa lógica, muito discutível, de ser a única forma de proporcionar a todas as crianças do país um ensino obrigatório de qualidade e que, por isso mesmo, só pode ser visto como um instrumento fundamental para garantir a qualificação das próximas gerações.

Importa recordar que o ponto da situação da educação no concelho de Oliveira do Bairro era uma das grandes preocupações eleitorais do CDS-PP, do PPD-PSD, do PS e da CDU, aquando das candidaturas apresentadas para o acto eleitoral de Outubro de 2005; no entanto, na nota introdutória de fls. 10 da Carta Educativa Concelhia aprovada, foi consignado que «O executivo municipal, formado nas eleições de 9 de Outubro de 2005, elegeu como prioridade a Educação – “Apostar no futuro é apostar na educação. Queremos ter das melhores escolas do país. Vamos investir fortemente na área da educação modernizando as escolas desde a pré-primária ao 12.º ano. As escolas têm que ter a mesma dignidade de outros edifícios públicos: boas condições de climatização, informatização a sério, vamos criar um espaço Internet em cada escola (equipamento e formação), boas áreas de recreio, mais e melhores actividades complementares como a língua estrangeira, a música e a actividade física”, in Projecto político do PSD às eleições de Outubro de 2005».

Como se esta fosse uma preocupação exclusiva do executivo no poder, à qual todas as demais forças políticas fossem hostis!

A par disso, não vai faltando quem vá apostando na ignorância alheia para fazer crer que há autarcas a funcionar em contra-ciclo em relação ao poder central, em municípios onde se inauguram pólos escolares novos enquanto o governo fecha escolas velhas… Impertinências próprias de demagogos ou, pior do que isso, de quem tem vistas tão curtas que até acredita que os alunos aprendem mais e melhor só por frequentarem escolas com telhados pejados de clarabóias, com paredes exteriores revestidas a material nobre e as interiores forradas de quadros interactivos, numa atávica demonstração de ignorância de que a aprendizagem escolar é feita à custa de estudo e empenho...

Intervenções deste calibre, míopes na análise e balofas na prosápia, bem poderiam ser encadernadas numa antologia humorística, não fosse esta uma questão da maior relevância para a qualidade de vida de milhares de crianças, das respectivas famílias e, sobretudo, para o futuro de muitas comunidades no interior deserto e desertificado do país.

Aqui chegados, entra-se numa segunda reflexão: percebido que está que a construção dos novos pólos escolares é uma consequência de um reordenamento da rede escolar imposto pelo governo central em cumprimento de directrizes europeias, o que sobrou para os municípios, para além da responsabilidade da sua construção, foi a responsabilidade pela aprovação das respectivas cartas educativas concelhias onde fosse definido o número de pólos escolares.

E é exactamente neste ponto que me permito duvidar da razoabilidade do número de pólos escolares previstos na carta escolar concelhia para serem construídos de imediato no concelho: 2 em cada uma das freguesias de Oliveira do Bairro e de Oiã, 1 em cada freguesia de Palhaça, Troviscal, Bustos e Mamarrosa.

Em relação a esta questão, dou aqui por reiterada a argumentação por mim invocada, sem vencimento, na sessão da Assembleia Municipal de 29 de Junho de 2007, quando votei contra a aprovação da Carta Educativa do Concelho de Oliveira do Bairro nos moldes em que a mesma se encontra concluída.

Como é sabido, a «Escola», em sentido lato, enquanto espaço de formação e educação tem vindo, reconhecidamente, a ser palco de mudanças, não só estruturais, mas também de missões e de públicos. Estas mudanças têm levado ao surgimento de novas problemáticas e necessidades, exigindo posturas novas e respostas articuladas, que vão para além dos muros das escolas, e que contam com os recursos das comunidades e forças locais, com responsabilidade na formação integral dos cidadãos.

Muitas são as entidades que, no nosso município, desenvolvem programas e actividades de cariz educativo; para além dos estabelecimentos de ensino regular podem, entre outras, ser referidas, a Divisão da Acção Social da autarquia; os Projectos Museave, BibRia Digital, BiblioCaixa, Teatroteka e Entre Laços; as Equipas Profissional e de Intervenção Precoce; o Museus de Etnomúsica e da Palhaça; o programa «Escola Segura» da Guarda Nacional Republicana; a Biblioteca Municipal; os Espaços Internet; as Piscinas Municipais; os Agrupamentos de Escuteiros e as Paróquias; a Escola de Artes da Bairrada; a Escola de Línguas; o Instituto de Educação e Cidadania, as instituições particulares de solidariedade social, as diversas associações desportivas, culturais e recreativas e, num futuro que se espera próximo, o Instituto Profissional da Bairrada e o Museu de Olaria e Grés.

A diversidade de proveniência de todas estas experiências, e da sua missão, faz com que exista pouca consistência de conjunto entre as actividades por elas desenvolvidas, sendo prioritário conseguir tirar a máxima vantagem de todo este esforço educador.

Por isso mesmo, para um concelho que, como o nosso, quer apostar na educação, era esperado que a carta educativa concelhia consagrasse a urgente adesão do município à “Rede Portuguesa das Cidades Educadoras”.

Com a sua adesão, o município assumiria compartilhar experiências na procura da criação das melhores condições para uma vivência urbana mais civilizada, mais pacífica, mais democrática e mais acolhedora, subscrevendo os Princípios da “Carta das Cidades Educadoras”, considerados essenciais ao seu impulso educador enquanto cidades.

”Cidades Educadoras” são, assim, todas as que assumem coerente e consequentemente, através de um programa sistemático e intencionalmente dirigido de acção formadora, o imenso potencial que o seu património culturalmente construído lhes proporciona, transformando-o, deste modo, em capital educativo.

No entanto, sobre esta realidade nem uma linha, sequer, está contemplada nas «Medidas a Tomar» previstas na Carta Educativa do Concelho de Oliveira do Bairro, na qual o município devia, desde logo, assumir-se como um município educador.

Com esta omissão, pelo menos duas dúvidas se levantam:
a) pretendendo o município de Oliveira do Bairro, apostar na educação, por que razão não se reconheceu, conscientemente, e desde logo na Carta Educativa, que essa é uma tarefa específica da «Escola» e da «Família», e, antes de mais, uma responsabilidade da sociedade no seu todo e na totalidade da sua acção, quer no espaço quer no tempo?
b) pretendendo o município de Oliveira do Bairro ter das melhores escolas do país, o que obstou a que, e desde logo na respectiva Carta Educativa, se exigisse à cidade, às vilas e às aldeias, enquanto nichos centrais da vida colectiva contemporânea, se humanizem e se transcendam como meios integralmente humanos e humanizantes?

Sob o ponto de vista do conteúdo, não obstante apontar para a criação de 8 pólos escolares no concelho, a Carta Educativa aprovada é absolutamente omissa em relação a um projecto educativo para o concelho.

Um projecto educativo com objectivos definidos e que consagre a cidadania como participação social, comportando direitos e deveres, e tornasse cada cidadão como um construtor activo da sua história e estimulasse atitudes de solidariedade, tolerância, cooperação e diálogo para a construção de uma cultura democrática;

Um projecto educativo que promova e incentive o usufruto dos espaços públicos, organizando actividades de incentivo e mobilização da população para utilização de parques e jardins, de museus e de bibliotecas;

Um projecto educativo que promova o relacionamento intergeracional, através da partilha de saberes, valores e experiências e favorecesse as relações de cooperação entre instituições, nomeadamente da cooperação Escola/Família;

Um projecto educativo que contribua para a diminuição do abandono escolar, da saída antecipada e da saída precoce do sistema escolar, e desenvolvesse competências de pesquisa, selecção, organização e interpretação da informação;

Um projecto educativo que contribua para o conhecimento científico, tratando o conhecimento de uma forma interdisciplinar;

Um projecto educativo que, finalmente, incentive a prática de expressões artísticas e físico-motoras e facilitasse as relações de cooperação com outros municípios, nacionais e estrangeiros, numa óptica de troca de experiências e boas práticas.

Foi pois de forma sustentada e fundamentada, que votei contra a aprovação da Carta Educativa do Concelho de Oliveira do Bairro; e isto, porque muito mais importante do que a previsão da construção de 8 novos pólos escolares no concelho, da Carta Educativa Concelhia aprovada é absolutamente omissa quanto à fundamentação da razoabilidade ou sensatez desse número de estabelecimentos de ensino.

A construção destes 8 novos pólos escolares levanta, de per si, alguns obstáculos; desde logo, em relação aos pais e encarregados de educação, e numa altura em que as famílias vivem com mais dificuldades, e ainda não é conhecido o impacto do PEC (que revê o sistema de apoios) na acção social escolar, suscitam-se questões em relação ao pagamento das refeições que a maioria dos alunos passa a ter de tomar nas escolas, e em relação ao seu transporte.

De facto, para um aluno do Cercal que agora frequenta o novo pólo escolar de Oliveira do Bairro, ou um aluno do Albergue que doravante passará a frequentar o novo pólo escolar da Palhaça, e em relação aos quais a autarquia só assegura o pagamento integral da refeição se integrarem o escalão A da acção social escolar, ou metade deste valor se integrar o escalão B, quem é que assume a responsabilidade pelo respectivo transporte à hora de almoço se os pais preferirem que os alunos almocem em casa? E quem é que assegura o transporte dos alunos entre as suas residências e os novos pólos escolares, uma vez que agora se encontram (embora relativamente) deslocados dos seus lugares de origem?

Parece que tudo se resolveria com a implementação, por parte da autarquia, de uma bem estruturada rede de transportes escolares; e se assim fosse, não só o número de pólos escolares a edificar poderia ser substancialmente reduzido, como a autarquia passaria a dispôr de uma frota capaz de assegurar transportes públicos, não só nos intervalos lectivos, mas principalmente durante os períodos de férias.

Na Carta Educativa do Concelho de Oliveira do Bairro optou-se por ignorar esta questão, seguindo-se o caminho da ausência de custos eleitorais ou seja, optando-se pela construção de 1 novo pólo escolar em cada uma das freguesias mais pequenas e 2 novos pólos escolares nas freguesias de maior dimensão.

Infelizmente não há, em Oliveira do Bairro, a preocupação que, por exemplo, há no município da Régua, onde a câmara local tem preparada «uma frota de dez viaturas para fazer o transporte directo dos alunos do primeiro ciclo do ensino básico das aldeias para os novos centros escolares que abrem portas a 13 de Setembro».

E por isso, não só se perde a possibidade de dotar o concelho com uma razoável rede de transportes públicos como se opta, claramente, pela solução mais dispendiosa: em primeira linha, e desde logo, porque o custo directo da construção de oito pólos escolares é substancialmente mais oneroso do que a construção de um número inferior destes equipamentos; mas principalmente porque a aposta numa quantidade tão grande de novos póolos escolares negligencia o custo da energia, limpeza e manutenção desses oito novos pólos escolares, custo este que, apesar de oculto, gera importantes somas de despesa ao longo da vida útil dos ditos equipamentos.

É claro que esta só é uma preocupação com razão de ser, não só porque «uma em  cada dez câmaras municipais está falida. Endividamento das autarquias superou os mil milhões de euros em 2009, três vezes mais do que em 2008», mas principalmente porque «o governo determinou que todos os ministérios estão obrigados a proceder a cativações e reservas orçamentais de 20% da verba do PIDDAC e de outros fundos. Inicialmente, a verba a reter era de 12,5%, mas, em Junho, o ministro das Finanças, Teixeira dos Santos, aumentou as restrições para 20%».

Principalmente quando se vive num município onde a maioria dos membros do executivo, por não terem sensibilidade para as dificuldades por que passam os pais e encarregados de educação, não aprovaram uma proposta que pugnava pelo reembolso integral, pelo município, do valor pago pelo material didáctico/pedagógico e pelos livros e manuais escolares aos 5 melhores alunos de cada ano dos 2º e 3º ciclos dos estabelecimentos de ensino concelhios, devendo a imputação desta despesa ser feita à verba arrecadada pela participação do Município no IRS colectado aos sujeitos passivos com domicílio fiscal na área territorial concelhia.

Principalmente quando se vive num município cujos destinos, apesar de conduzidos com uma assertividade alegadamente ilimitada, produz frequentemente gastos sem retorno transmitindo a ideia, talvez equívoca, de um desmedido apego ao poder.