Ao que parece, o PS "não pede desculpa pelas suas convicções relativamente à Constituição" e não troca a revisão constitucional pela aprovação do Orçamento do Estado.
E escrevo ao que parece, porque, como é consabido, o PS de Sócrates vai mudando de opinião em função dos dias e da maré. Ao que se sabe, essa troca nunca esteve implícita nas exigências feitas por Passos Coelho para aprovar o OE.
As condições que o PSD colocou estão relacionadas com a necessidade imperiosa de controlar a despesa pública. Ou seja, depois de ter viabilizado o Programa de Estabilidade e Crescimento numa situação de emergência por causa das exigências de Bruxelas e dos problemas de financiamento externo do Estado português, o PSD exige, agora, que o OE reflicta as promessas então feitas pelo Governo de que a redução do défice seria feita, também, através da redução da despesa, e não apenas por via do aumento da carga tributária que na altura foi viabilizado. E, ao fim destes meses, já se percebeu pelas estatísticas que são conhecidas que o Governo não quer (ou não consegue) reduzir a despesa pública primária, que continua a crescer de forma descontrolada.
Não admira, sequer, que o PSD exija uma resposta até ao dia 8 de Setembro, que é precisamente o penúltimo dia em que Cavaco Silva pode dissolver a Assembleia da República. É que, o presidente da República ao ter pressionado o PSD a viabilizar o PEC, passou também ele a ser parceiro deste acordo que o Governo não tem sido capaz de cumprir e, por isso, o PSD pretenderá que, desta vez, Cavaco esqueça a sua condição de candidato, e assuma as suas responsabilidades plenas.
Bem pode Sócrates escudar-se na questão da Constituição, inventando mesmo argumentos falsos como é seu timbre, ao acusar o PSD de pretender retirar a progressividade fiscal. Essa demagogia pode valer-lhe alguma coisa nas sondagens mas não lhe resolve o problema. A questão é que os dotes de equilibrismo do primeiro-ministro estão esgotados. A partir de agora, se quiser governar à esquerda, já não pode contar com o voto favorável do PSD, e nem sequer pode recorrer ao argumento do patriotismo, porque pode sempre pedir a Manuel Alegre que faça a ponte com o Bloco de Esquerda e fazer, ainda, algumas cedências ao PCP. Esse "denouement" pode custar caro ao país no curto prazo, mas implicará uma bipolarização da política portuguesa que é essencial para que, de uma forma ou de outra, seja pela esquerda, seja pela direita, o país escolha um rumo, e deixe de ziguezaguear ao sabor dos estados de alma do primeiro-ministro e dos interesses temporários do PS.
Terá, também, a vantagem de esclarecer de uma vez por todas a questão presidencial. Se o PSD anunciar que não viabiliza o Orçamento, Cavaco terá, finalmente, de fazer uma escolha. Desta vez, não terá refúgio. Mesmo que nada faça, como tem sido seu hábito, estará na mesma a fazer uma escolha.
Quanto a Manuel Alegre, que pregou uma grande partida a Francisco Louçã, de quem recolheu o apoio para agora se encostar a todas as políticas de Sócrates, esta será uma boa altura para se deixar de conversas insossas e de bazófias e explicar ao país se acredita que o "frentismo" de esquerda é a solução que preconiza.
Para todos nós, também, será uma boa altura de fazer opções. É que não se pode continuar a apontar o dedo aos políticos e dizer que é preciso mudar para, depois, quando alguma coisa nos é proposta, nos entrincheirarmos nos nossos sacrossantos direitos e recusarmos qualquer mudança que os possa ferir.
Rui Moreira, aqui