quinta-feira, 8 de maio de 2014

SAÍDA LIMPA

Depois de tantas promessas falhadas e tantas trapalhadas, Passos Coelho e o seu governo tiveram o seu momento de glória, no domingo, na hora nobre dos telejornais

Afinal, Passos anunciou o que vinha insinuando nos últimos tempos: uma saída limpa, sem rede de segurança, “sem recorrer a qualquer programa cautelar”, para eventuais tropeções e inesperados percalços no caminho que continua a ser difícil. 

Isto não é uma vitória limpinha, limpinha, porque o país continua a amargar a crise, uma espécie de amêndoas de páscoa retardada, após uma dolorosa crucificação dos mais fracos e pobres na cruz sangrenta da crise, reformados e pensionistas, desempregados e pobres, alguns pequenos espinhos para os mais ricos. 

Não acabou o nosso calvário, continuamos todos com o mesmo dinheiro de ontem nos bolsos, porque o reconhecimento deste passo em frente, desta janela aberta à esperança, deste anúncio de bons alunos e honestos cumpridores relativamente aos nossos credores, não se pode dizer que seja coisa pouca. Aliás, Passos disse que era o “caminho certo”, “a hora certa” (vêm aí eleições), “bom para Portugal”, reforçou também Seguro. Pudera. 

É evidente que acredito nas razões invocadas pelo primeiro-ministro: a baixa dos juros dos empréstimos, a ida, sozinhos, aos mercados, obtendo bons juros, o crédito do país no exterior, o olhar mais favorável da Europa, há reservas financeiras para este ano e uma almofada de 15 mil milhões para o ano que vem, colocando o  país ao abrigo de “qualquer perturbação externa”. Ou interna, com o Tribunal Constitucional a chumbar medida (até a UE tem medo do TC..) 

Todavia, tenham todos a noção de que os apertos não acabaram. Não, mas é melhor do que morrer o país na praia, isto é, com as suas sua gentes trituradas por mais cortes. Ainda vão aumentar o IVA, a TSU, não muito, mas mais medida abrangente e mais qualquer coisinha que andará na sua manga. A primeira etapa desta corrida contra o tempo estará ganha, à custa de muito sangue e lágrimas nossas, mas virá outra, a da recuperação da esperança e do emprego, a continuação da reforma do Estado, sempre sob a vigilância dos credores. 

A Troika vai embora, mas duas vezes por ano irá passar por aqui alguém a cheirar os passos dados e o cumprimento ou não da Carta de Intenções que obrigou o governo a assinar. Cá por coisas. Não vá o diabo tecê-las…

Armor Pires Mota, no 'Jornal da Bairrada' de 8 de Maio de 2014