segunda-feira, 22 de julho de 2013

UM FRACASSO ANUNCIADO

A intervenção de abertura de Passos Coelho na reunião do Conselho Nacional do PSD de quinta-feira foi a antecipação do fracasso anunciado por António José Seguro nas negociações para o compromisso de salvação nacional

Abrir à Comunicação Social um discurso onde se reafirmam os méritos do caminho percorrido em dois anos de governação, justamente quando decorriam negociações cujo objetivo era mudar a agulha, foi, a meu ver, uma jogada de antecipação que serviu para pressionar o presidente da República.


Não deixa de ser curioso que durante dois anos toda a comunidade política nacional, Governo incluído, tenha construído a narrativa de descolagem da Grécia e aproximação da Irlanda e que, neste discurso de Coelho mais para fora do que para dentro, se apresente um extenso exercício comparativo com a tal Grécia que nada tinha a ver connosco. 

Na verdade, foi preciso recorrer a este comparador para extrair uma paisagem radiosa da situação económica e social de Portugal e, nessa mesma medida, defender que o caminho é este e há que insistir. Algo que Vítor Gaspar havia já enterrado, quando reconheceu no momento da sua demissão o falhanço das políticas.

Os quadros comparativos que ontem foram abundantemente publicados nos jornais nacionais, procurando trazer à luz do dia as diferenças nas propostas de CDS, PSD e PS, demonstram que os partidos do Governo pretendiam tão-somente manter a mesma linha de governação, esperando dos socialistas uma adesão quase completa, o que significaria corresponsabilização perante o país e perante a troika.

Em traços gerais, o PS recusou-se a patrocinar um tão agressivo programa de austeridade, sobretudo no que se refere à Função Pública e aos pensionistas. Isto significa que o Governo não poderia cumprir o corte de 4700 milhões de euros que prometeu à troika. Por outro lado, defende uma renegociação e redirecionamento do programa de ajustamento com o envolvimento político ao mais alto nível da Comissão Europeia, do Banco Central Europeu e do Fundo Monetário Internacional. Ora isto colide no fundamentalismo do Ministério das Finanças. Mas não se sabia já que se chegaria a este impasse?

Um outro aspeto caricato da negociação foi a questão da calendarização de eleições antecipadas. Cavaco sugeriu meados de 2014, após o fecho do programa de ajustamento. Seguro pretendia maio de 2014, coincidindo com as Europeias. E Coelho trouxe esta cereja: após a aprovação do Orçamento para 2015 e a garantia de que o mesmo entraria em vigor em 1 de janeiro desse ano. Pois, dessa forma, o mandato estaria quase esgotado e, portanto, as eleições não seriam antecipadas.

Passaram três semanas de crise, nada se avançou e há uma pessoa que está, como tão bem sabe, a passar entre os pingos da chuva. Trata-se de Paulo Portas, o ministro da demissão irrevogável, causador da crise, o mesmo que esta semana defendeu no Parlamento, com cara de pau, os valores da estabilidade. É extraordinário! Como é possível que tal comportamento não tenha tido consequências políticas? Como é possível que tenha conseguido o adiamento do congresso do CDS para depois das autárquicas?

No rescaldo desta primeira fase da crise, uma palavra para António José Seguro. A semana não foi fácil. Não podia fugir à negociação, embora mantendo a recusa do caminho da austeridade extrema e a defesa do estímulo à economia. Não podia deixar de votar favoravelmente a moção de censura d'Os Verdes, em consonância com a reiterada exigência de eleições antecipadas. Não podia deixar de ouvir os recados em tom condicionador de Sócrates, Soares e Alegre. Não podia ceder à ofensiva da esquerda mais radical, através da moção e do convite a uma negociação paralela. Pois tudo isto suportou e de tudo isto saiu bem, dando uma resposta clara àqueles que o acusam de impreparado para a liderança.

No fim do dia, e independentemente da decisão final de Cavaco (que não é conhecida à hora a que escrevo esta crónica), fica claro que há duas visões para Portugal, com políticas e protagonistas imiscíveis. Não descortino outra forma de ultrapassar este impasse que não seja a devolução da palavra ao povo e a marcação de eleições.

Retirada daqui