terça-feira, 13 de março de 2012

QUERIDO DIÁRIO - X I V


Porque o conceito cultural é muito transversal e diversificado, e porque existem vários tipos de personalidades permitimo-nos, por uma questão de antecipação, avançar desde já com os perfis-tipo dos oliveirenses, afinal os utentes e frequentadores desse futuro polo de cultura concelhio.




Oliveirense basicamente inculto: porque não perde um único espectáculo deste artista na EXPOFACIC, em Cantanhede, sentir-se-á frustrado se não houver programação que inclua, pelo menos, quatro espectáculos por ano do Tony Carreira no futuro Centro Cultural. Vê habitualmente a TVI e só muda para a RTP1 para assistir ao Preço Certo em Euros e para a SIC para acompanhar as peripéfias da Floribella. Aos domingos frequenta o Feira Nova de Águeda e o Carrefour, em Aveiro, vestindo um magnífico fato de treino de contra-facção, vermelho, verde ou azul. Lê os livros dos concorrentes dos reality-shows e elege o Manuel Luís Goucha como o português com quem gostaria de almoçar. Janta no Mc’Donalds do Fórum, e depois vai ao cinema onde come pipocas alarvemente e indigna-se porque a Academia ainda não atribuíu um Óscar ao Van-Dame. É fã dos programas do António Sala, tem nas anedotas do Fernando Rocha o êxtase da diversão e não perde as análises comportamentais do Cláudio Ramos e da taróloga Maya. Vota no PS para as autárquicas mesmo que nunca tenha ouvido falar do cabeça-de-lista. Dá o que tem e ainda pede crédito para poder passar uma semana de Agosto num T0 em Armação de Pêra ou Quarteira, com o resto da família.

Oliveirense medianamente inculto, mas com esperanças de melhorar: vai ao Glicínias a Aveiro comprar livros mas apenas consegue ler o índice e o prefácio, a seguir decora a prateleira com as aquisições para os amigos verem. Compra os CDs da Shakira e do Boss AC mas ouve às escondidas o José Malhoa e o José Cid. Gosta de aparecer na televisão e por isso tenta concorrer ao Um contra Todos, mas não passa da segunda pergunta dos que estão sentados na bancada com um número luminoso à frente. Entra nas galerias de arte de entrada livre e começa a dizer que também era capaz de fazer igual. Nas autárquicas vota alternadamente no CDS ou no PSD, dependendo do candidato a líder. Marcará presença no Centro Cultural de Oliveira do Bairro em todos os concursos de Miss Bairrada, não perdendo a oportunidade de virar costas ao palco para ver os famosos que estiverem a assistir ao desfile.

Oliveirense em transição para o medianamente esclarecido, mas com altos e baixos: gosta de ler os livros da Margarida Rebelo Pinto porque tem poucas páginas. Está com vontade de ler o José Rodrigues dos Santos mas hesita devido ao volume dos livros. Interessa-se por música e ouve umas coisas interessantes, essencialmente em língua portuguesa. É capaz de aguentar até ao intervalo um filme do Manoel de Oliveira e adorou ver a versão moderna do Crime do Padre Amaro. Ouve a RFM e a Rádio Comercial, acha piada ao Nuno Markl e sorri timidamente com as piadas do José Carlos Malato. Gosta de ir à loja da Valentim de Carvalho, no Dolce Vitta do Porto e entretém-se a ouvir música nos auscultadores de consulta dos CD’s. Usa um i’POD. Adora ir à Serra da Estrela na passagem do ano. Assiste medianamente interessado aos telejornais. Estará presente no Centro Cultural de Oliveira do Bairro sempre que o Pelouro da Cultura da autarquia aí organizar um qualquer evento. Só vota nas autárquicas se não estiver a chover e por uma questão de mania, coloca sempre a cruzinha no terceiro quadrado.

Oliveirense moderadamente culto, e com tendência para evoluir – Apesar de ainda não ter conseguido ler até ao fim nenhum livro do António Lobo Antunes, interessa-se por autores portugueses, mas também gosta da Isabel Allende. Leu o Equador, do Miguel Sousa Tavares, em 10 meses e quando chegou ao final ficou com a sensação que já conhecia a história. Vai com frequência aos cinemas do Fórum, em Coimbra, e incomoda-se com o barulho que os energúmenos fazem ao engolir alarvemente pipocas e ao sorverem a Coca-Cola por palhinhas. Assiste sempre à cerimónia da entrega dos Óscares e chega a acertar em alguns dos galardoados. No Verão gosta de viajar, preferindo as Caraíbas ou o Brasil, e no Inverno, uma vez por outra, mete-se dentro do carro e vai ao Gerês. Na Páscoa e numa quinzena em Julho vai para Albufeira ou arredores. Vota sempre em função do desempenho de cada Executivo Municipal. Admite a possibilidade de entrar no Centro Cultural de Oliveira do Bairro se, e quando, aí se realizar algum espectáculo de música moderna, portuguesa ou estrangeira, nomeadamente do Rui Veloso, do Luís Represas, do Robbie Williams ou dos U2.

Oliveirense simplesmente culto – Deixou de ler o Saramago porque já há muita gente a ler. Detesta tudo o que os outros gostam. Prefere ler livros que ninguém conheça e que não cheguem à 3ª edição em menos de 15 dias como o do Santana Lopes. Gosta de ver curtas-metragens que ninguém entende e cinema europeu, não comercial. Faz férias nos países nórdicos, mas tem vontade de conhecer outras paragens, nomeadamente a Ásia e o Médio Oriente. Tem horror às praias da Barra, Costa Nova, Vagueira e até mesmo do Algarve e não suporta a ideia de ir a uma praia onde estejam mais de cinco pessoas. Ouve a Antena 2, vê a RTP2 e o canal Mezzo. Vai todos os anos ao Cascais Jazz e detesta concertos com música alta. Aprecia jantares intimistas com amigos onde se possa discutir as novas tendência da música e da literatura. Só frequenta galerias de arte com entrada paga e já esteve várias vezes no Guggenheim em Bilbao. Gosta de arte contemporânea e tem orgasmos psicológicos com as instalações do Pedro Cabrita Reis. Mora no concelho mas nem conhece os vizinhos do lado nem os lugares limítrofes. Nunca vota nas autárquicas nem conhece os candidatos. É-lhe indiferente que Oliveira do Bairro venha, ou não, a ter um Centro Cultural, porque nunca lá irá pôr os seus pés!

Alma de Deus
(Em reposição: anteriormente publicado no extinto http://blog.oliveiradobairro.net/)