quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

A SAGA DO BRASÃO DO SILVEIRO - PARTE I I: HERÁLDICA DA REGIÃO

O concelho de Oliveira do Bairro é pobre em heráldica.

Tendo sido parte integrante do Senhorio dos Sousas, Marqueses de Arronches e, mais tarde, elevados à grandeza de Duques de Lafões, todas essas vilas que haviam recebido foral das mãos de D. Manuel I, não conhecem grandes desenvolvimentos durante quase três séculos.

Só na segunda metade do século XVIII elementos de nobreza, geralmente secundogénitos, irão fundar as suas casas na região. E mandarão esculpir as suas armas.

Vamos hoje lembrar uma pedra de armas existente na Silveiro.

Encontramos referência ao que seria a Quinta do Silveiro na obra 'A Vista Alegre' de Marques Gomes, impressa em Aveiro em 1924.

É em torno da produção de vidros na mesma fábrica que lemos na página 94: ... "Parece-nos não poder restar dúvidas de que os copos que possuía Gomes de Brito, eram, como os que deixamos apontados e outros, da Vista Alegre e não da Marinha Grande. D. Maria II visitou uma única vez a Fábrica da Marinha Grande, e foi por ocasião da sua visita às províncias do Norte, também única (Maio de 1852), acompanhada pelo rei D. Fernando, o Princípe D. Pedro e o infante D. Luís. Os copos com medalhões, contendo um destes o retrato de D. Maria II, que estiveram expostos pela primeira vez em Aveiro em 1882, trouxemo-los para aqui da Quinta do Silveiro, Oliveira do Bairro, onde então vivia e mais tarde faleceu Augusto Ferreira Pinto Basto, a que nos referimos já e que por essa ocasião nos afirmou terem sido fabricados, como outros, na Vista Alegre, antes de 1846, e ninguém mais autorizou para assim os classificar, classificação esta plenamente confirmada então por diferentes pessoas que tinham tido exemplares semelhantes ali adquiridos e da rnesma época"…

Augusto Ferreira Pinto Baslo foi o primeiro administrador da empresa, de 1824 a 1828, tendo a fábrica da Vista Alegre sido fundada por seu pai, José Ferreira Pinto Basto, contratador geral dos tabacos do Reino e a quem D. João VI concederá carta de armas a 2 de Setembro de 1818. Tudo leva a crer que a Quinta do Silveiro terá sido comprada por Augusto Pinto Basto, no final do reinado de D. João VI, ao último descendente do seu fundador original, tendo este deixado a sua pedra de armas na primitiva casa.

Na verdade, a pedra de armas da Quinta do SiÌveiro, sendo uma cartela decorativa esquartelada (com quatro quartéis ou brasões) revela, pelo nível escultórico, datar de cerca de 1750, sobrepondo-a uma coroa ou coronel de nobreza, já mutilado, que tanta gente confunde com a coroa de marquês ou conde e era atribuída a alguns nobres que provavam ter várias gerações de nobreza. Rodeiam estas armas flores e frutos, bem ao gosto do estilo "rocaille" que em Portugal, foi introduzido no início do reinado de D. José I. Os Pinto Basto terão adquirido a Quinta com a decadência das velhas famílias nobres que rejeitavam jurar a constituição e não aceitavam a Monarquia Liberal.

Fazendo a leitura destas armas:
1º - Cabral (de prata, com duas cabras de púrpura, uma sobre a outra);
2º - Seis esporas (?) postas duas, duas e duas;
3º - Sá (xadrezado de prata e de azul, de cinco peças em faixa e seis em pala);
4º - Moura (de vermelho, com sete castelos de ouro).

Sabendo que a Fábrica da Vista Alegre foi instalada num antigo morgadio que havia sido fundado pelo Bispo D. Manuel de Moura Manoel, está fácil de ver que o fundador da Quinta do Silveiro fosse um parente desta família, se esta não tivesse sido mesmo parte integrante do morgadio.

Os Moura têm origem em D. Pedro Rodrigues que, juntamente com seu irmão, D. Álvaro Rodrigues, tomou Moura aos Mouros no ano de 1166. Entre os vários filhos que teve, salienta-se D. Martim Rodrigues que, antes de tomar votos e tornar-se freire de Calatrava, foi casado e pai de D. Pedro Martins e de D. Álvaro Martins, mais tarde ambos cavaleiros da mesma Ordem Militar. Ainda de D. Martim Rodrigues houve Vasco Martins Serrão, que andou nas conquistas do Reino e recebeu mercê do senhorio de Moura em documento assinado Pela Rainha D. Beatriz, mulher de D. Afonso III. Em 1264, Vasco Martins Serrães e sua mulher, D. Maria Dias de Góis, instituíram um vínculo e vários filhos deste casal adoptaram o nome de Moura.

Quanto ao morgadio e Quinta da Vista Alegre, após a morte do Bispo, seu fundador, em 1699, cai na posse de sua filha natural, D. Teodora de Castro Moura Manoel e nos descendentes desta se manterá durante todo o século XVIII. Só uma escritura datada de 7 de Março de 1812 atesta que esta propriedade foi vendida a José F. Pinto Basto, que nela irá instalar a principal manufactura de porceIana de Portugal.

Augusto Ferreira Pinto Basto aparece-nos a liderar a edilidadade camarária de Oliveira do Bairro de Março de 1850 até 1857 e, posteriormente, em l882 - 1863 e 1868 - 1869. No biénio de 1882 – 1883 será presidente da Câmara de Oliveira do Bairro Henrique F. Pinto Basto, morador em Águas Boas, que nasceu na Quinta do Silveiro a 2 de Fevereiro de 1841 e era filho do referido Augusto Pinto Basto, pelo que se comprova que, a esta data, já seu pai possuía a dita Quinta.

Uma dúvida apenas persiste na pedra de armas dos antigos senhores do Silveiro: de que Familia eram as segundas armas que o brasão ostenta? Percorri debalde o Armorial Lusitano e nenhuma exibe seis esporas como se vêem nestas armas. A Família Puga, de origem galela, registou as suas no rei de armas, mas trata-se de duas esporas e dois caldeirões. Sendo as esporas uma peça comum na heráldica espanhola, abre-se a hipótese destas armas terem sido introduzidas nesse brasão à margem das regras da heráldica portuguesa.

Serão estas as armas da família Nolasco, ou da Família Arez que no século XVIII e misturada com ramos nobres portugueses, fundaram várias casas nobres na região? Resta-me apenas acrescentar que na casa do Sr. Luís Costa, de S. João de Azenha, existe uma Pedra de armas do século XVIII, adquirida numa demolição junto de Águeda, onde as seis esporas, expostas do mesmo modo, compõem o segundo quartel do brasão.

Eduardo Proença-Mamede, no ‘Jornal da Bairrada’ de 9 de Agosto de 2001