segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

MÁQUINAS DE COSTURA: HÁ QUEM POSSA MAS NÃO QUEIRA VIVER SEM ELAS

Se achava que estavam fora de moda, desengane-se. Os workshops de costura são mais procurados do que nunca e as máquinas continuam a trabalhar.

"Para mim a máquina é como uma Black & Decker: é um meio para chegar a um fim", confirma Rosa, de sorriso fácil, sentada na mesa de madeira, entre máquinas de costura de cores e feitios diferentes. Rosa Pomar, 35 anos, é a dona da "Retrosaria", na Rua do Loreto, onde, além de vender tecidos, bonecos e livros, ensina a costurar. Familiarizou-se com a máquina de costura desde cedo e acredita que é possível fazer qualquer coisa com uma na mão.
 
Ficou a meio do mestrado de História Medieval, estudou ilustração, deu aulas e até já foi motorista de um autocarro de um colégio. Mas através do blog "Ervilha Cor De Rosa", a neta do pintor Júlio Pomar começou a ser conhecida pelos seus bonecos de pano. Da internet à loja foi um salto. Aqui pode fazer compras mas também inscrever-se nos vários workshops que o ajudam a usar a máquina de costura como um instrumento de criação."Comecei com seis, sete anos. Lembro-me que a primeira coisa que cosi à máquina foi um saco para o cachimbo do meu pai" relembra.

Aprendeu com a mãe e a avó a manusear a máquina de costura e garante que "isso nunca foi sinónimo ou contrário de fosse o que fosse". Rosa acredita que esta geração está mais aberta a aprender que a anterior já que nessa altura as mulheres "abandonaram em massa um tipo de vida virada para dentro da casa, para as funções de mãe e esposa". Por isso conclui que "é normal que a costura fosse símbolo de tudo aquilo que queriam renegar".

Mas hoje, a tendência parece estar a inverter-se, aos poucos. Os olhares curiosos viraram-se para estas máquinas e para o que com elas se pode fazer. O grupo interessado em aprender ou reaprender a costurar é vasto e heterógeneo. "Há de todas as idades, dos 18 aos 65 e de muitas áreas diferentes" explica Rosa.

A professora dos workshops pergunta sempre aos interessados porque é que querem aprender a costurar. Conta que a justificação habitual é que "querem fazer algo manual" já que são "pessoas que têm cargos administrativos ou burocráticos".

Mas o que é mesmo comum nestas aulas são as mulheres barrigudas. Rosa brinca com a situação e até elabora uma teoria: "Há um gene da costura que só é activado na gravidez."

APRENDER: Foi o caso de Ana Espírito Santo, que só teve vontade de costurar quando engravidou. "Acho piada à hipótese de eles [os filhos] terem uma coisa feita por mim e poderem contar a alguém que fui eu que fiz", conta a advogada de 32 anos com os olhos postos no tecido e os dedos (demasiado) rente à agulha da Singer.

Começou por seguir as instruções da máquina mas foi no workshop de costura de Rosa Pomar que Ana se entusiasmou a fazer mais. "A melhor maneira de aprenderes uma coisa é veres alguém a fazê-la", explica, antes de exemplificar a teoria: "Eu fazia muita força com as mãos mas depois percebi que elas só servem para orientar o tecido."

Com tantos blogs, sites e workshops sobre o tema, Ana diz que percebeu que "se fazia estas coisas nos tempos modernos e que é possível costurar hoje em dia". Quanto à opinião dos amigos, a mãe de três filhos, esboça um sorriso tímido: "Não me dou com pessoas que achem piada a isso. Só as minhas cunhadas acharam, porque sabiam que ia fazer coisas para os filhos delas."

ENSINAR: É numa sala da Junta de Freguesia de S. José, em Lisboa, que, ora de manhã, ora à noite, se vai aprendendo as artes do ofício. O espaço "Costura Criativa/ Oficina de Roupa" é uma iniciativa de Ana Teresa Antunes que encontrou lugar na Junta quando saiu da cooperativa cultural Crewhassan. O objectivo é transmitir "a tradição de uma experiência pessoal e manual", explica Ana Teresa, formada em artes plásticas que encontrou gosto na costura.

Aqui aprende-se de tudo, desde os passos mais simples, a criar uma peça de roupa - como umas calças ou um vestido. "As pessoas deixaram de pensar que é algo para os mais velhos. É giro andar com roupas diferentes de toda a gente", explica Inês Baptista, 23 anos, uma das colaboradoras da iniciativa.

A sala, repleta de tecidos, máquinas de costura e manequins, podia confundir-se com o local de trabalho de uma modista. "Fazemos roupa à antiga. Não é como no Project Runway", declara Ana Pimpista, colaboradora e finalista de um curso de costura.

A Oficina de Roupa pretende criar uma estreita ligação com a comunidade. Por isso, uma vez por semana está aberta ao convívio de pessoas da freguesia. Aqui fazem-se os fatos para as marchas populares e, por esta altura, sacos para os cabazes de Natal.

Entre as máquinas que ocupam o espaço, das mais antigas às mais recentes, não há problema quando uma se avaria. É o Senhor Paulo que trata do assunto. Este homem não sabe costurar mas conhece as máquinas como ninguém.

MANUSEAR: Paulo Sousa é o senhor que, de fato azul marinho dá a cara pela loja de máquinas de costura do Martim Moniz, com mais de meio século de história. Na Rua dos Cavaleiros, nº 59 está esta loja que, apesar do espaço reduzido, abriga em prateleiras, no chão, à esquerda e à direita, muitas máquinas de costura. Paulo Sousa tanto as vende como as arranja: "Tanto pode ser algo na agulha como dentro da máquina que pode necessitar de óleo por exemplo."

Lá ao fundo, na sala escura, está um verdadeiro cemitério dos aparelhos. Ferramentas, peças e "carcaças" de máquinas ocupam o local.

Com a época festiva a aproximar-se, Paulo Sousa deixa uma dica ao relembrar que "há 14 anos a máquina de costura podia ser uma prenda de Natal."

Maria Espírito Santo, aqui