quinta-feira, 17 de abril de 2014

TANTA CRUZ, SENHOR!

A igreja está a viver a chamada Semana Maior, ao memorar os mais importantes acontecimentos da sua história: a proclamação de Jesus como rei pelas crianças, homens e mulheres, erguendo palmas e estendendo panos e gritos de alegria, rumo a Jerusalém

Para, seis dias depois, a mesma multidão mudar de ideias e pedir a sua morte; a celebração da última Ceia, com a instituição da Eucaristia e do Sacerdócio e a Morte e a Ressurreição, os grandes pilares do Cristianismo.


Antigamente, havia nestes dias muito respeito, punha-se tento na língua. Falava-se menos. Tempo pesaroso. Era bom que pelo menos, esta semana assim fosse, procurando mais as macias vozes do silêncio, a vida interior mais do que os ruídos. A nossa geração é metralhada de ruídos, vive no barulho perverso, alguns muito perturbadores da paz, doentios, sarcásticos. 

Talvez se assim procedermos, se entrarmos em nós pela porta do silêncio e abrirmos as janelas da reflexão, veremos que, neste mundo, continua a crucificação de Cristo em milhões de pessoas. Ou milhões de pessoas continuam a ser crucificadas na Cruz de Cristo. Há milhões de crianças crucificadas nos ventres das mães. 

Há milhões de crianças crucificadas nas facas da fome, enquanto o dinheiro, que se gasta nos armamentos para matar ou brincar às guerras, chegava para matar-lhes a fome e a sede. Há milhões de crianças pegando em armas ou mortas por elas, crucificadas na brutalidade dos homens, na sua ignorância, desmedida ambição ou ignóbil estupidez, não as deixando viver os dias da inocência. Há milhares de cristãos perseguidos e mortos às portas das igreja e muitos deles crucificados. Há milhares de crianças e jovens a quem é dada a pior crucificação, através da violação, um calvário de tantas. 

O Papa Francisco pediu há dias desculpa pelos padres que lançam algumas no calvário das violações, que também são domésticas. Tanta gente em calvário de agonia e sangue neste mundo cão, tata gente crucificada nas espadas de doenças incuráveis, tanto calvário dentro de portas de idosos e doentes. 

Tanto calvário nas chagas das favelas, tanta gente sentada às portas da fome e da solidão, não menor calvário, à nossa beira, quando a pobreza não pode esperar, como disse D. António Francisco, bispo do Porto. 

Tanto calvário à vista, tanta cruz, Senhor, abraçada à dor e ao Amor da Tua Cruz que é VIDA!

Armor Pires Mota, no 'Jornal da Bairrada' de 17 de Abril de 2014