quarta-feira, 30 de abril de 2014

É PECADO TRAIR A SOPA COM O LEITÃO

De 15 em 15 dias, quando as minhas folgas calham à quinta e à sexta, é normal passar boa parte do dia no Arrábida Shopping, que tem muitas (20) salas de cinema e as melhores do país - e uma esplanada de onde se desfruta de uma das melhores (senão mesmo a melhor) vistas do Porto

De manhã, dou uma última vista de olhos pelos jornais da semana anterior, recortando o que me interessa antes de os deitar fora. E à tarde papo um ou dois filmes -posso mesmo chegar às três sessões, se a oferta for boa e os horários se conjugarem. Pelo meio, almoço.

Neste último particular, sofri este mês um rude golpe. A Loja das Sopas, um dos meus locais preferidos para o almoço em dia de folga à semana, travestiu-se em restaurante de leitão. Devia ser pecado trair a sopa com o leitão. Até definir nova rotina alimentar, tenho-me refugiado na loja ao lado, a dos hambúrgueres do H3.

Não façam confusão. Adoro leitão e só não o convido mais vezes para o meu prato pela poderosa razão de ser hipertenso (como 40% dos nossos compatriotas) e não estar nada interessado em passar do grupo dos 3,5 milhões de portugueses pré-obesos para o do milhão que já são mesmo obesos. Como tal, não posso andar sempre a fazer asneiras. 

Abusar de gorduras, sal e doces tem de ser um exceção - não a regra.

A conversão da Loja das Sopas - que sacrificou as saudáveis sopas no altar do chuto de colesterol nas veias que é uma saborosa costela de reco, com a pele estaladiça bem regada pelo molho - tornou-me ainda mais adepto da taxa adicional sobre os produtos alimentares nocivos para a saúde que foi anunciada pela ministra das Finanças - e logo adjetivada de "ficção" e "fantasma" pelo seu colega da Economia, em mais uma demonstração de que o Governo é um coro de desafinados.

Aceito a necessidade de haver impostos sobre o trabalho, mas defendo que a sua percentagem no bolo final das receitas fiscais se deve reduzir em detrimento da fatia assegurada pelos impostos verdes e dos que incidem sobre o consumo, em particular de doces e gorduras saturadas - que arruínam a nossa saúde e a sustentabilidade do SNS.

A criação de novas figuras tributárias, de que falou Maria Luís Albuquerque, tem a bondade de ser um dois em um: evita mais carga fiscal sobre os salários e desencoraja o pessoal de comer porcarias. Para enraizar novos hábitos alimentares, a comida saudável tem de ser mais barata do que a fast food.

Se o nosso consumo de sal é o dobro do recomendado pela OMS (menos de cinco gramas/dia), não há que ter dúvidas. Taxem sem dó nem piedade os produtos com excesso de sal e obriguem a que isso seja destacado no rótulo. E apliquem a mesma tática aos doces e gorduras saturadas. Que não vos doam as mãos. Foi com um misto de repressão, campanhas de sensibilização, legislação adequada e fiscalização persistente que deixamos de ter as estradas mais sangrentas da Europa. 

Agora, trata-se de aplicar a mesma receita para deixarmos de ingerir tantas calorias por dia como os americanos.

Retirada daqui