terça-feira, 4 de março de 2014

O INDEPENDENTE E OS 'BOYS'

Foi recentemente notícia um estudo feito por uma investigadora da Universidade de Aveiro, Patrícia Silva, sobre a influência dos partidos políticos (leia-se PS/PSD/CDS) nas nomeações para os cargos dirigentes da administração pública.

Analisando cerca de 11 mil nomeações ocorridas desde 1995, a investigadora conclui que essas nomeações tinham, fundamentalmente, duas motivações: o "controlo de políticas públicas" e/ou a "recompensa por serviços prestados anteriormente ou em antecipação aos mesmos".

Qualquer uma destas motivações é, a meu ver, errada. A administração pública tem muitos e bons funcionários com sentido de Estado e empenhamento na causa pública que, com profissionalismo, estão à altura de cumprir as orientações superiores em termos de implementação de políticas. 

Eu próprio, quando assumi o pelouro do Ambiente na Câmara Municipal do Porto, não tive qualquer problema (e até hoje não me arrependi...) por ter mantido várias chefias que, sendo funcionários públicos de carreira, tinham sido nomeadas pelo meu antecessor - que viria a ser, durante o mandato, "apenas" o meu principal adversário. Por outro lado, premiar os correligionários políticos com cargos na administração pública é o recriar da célebre reivindicação de "jobs for the boys" que Narciso Miranda, então líder da distrital do PS Porto, explanou em voz alta dando corpo ao sentimento das hostes socialistas depois de 10 anos de cavaquismo.

Não deixa, aliás, de ser curioso que os mesmos partidos que encheram a administração pública com estes "boys" sejam aqueles que, agora, bradam aos quatro ventos a necessidade de reduzir o número de funcionários públicos......

Atitudes destas contribuem para a descredibilização do sistema político democrático e, em particular, para a descredibilização dos partidos políticos. Sendo que, erradamente, muitos, até para expiar as suas responsabilidades na eleição sistemática dos mesmos, generalizam esta apreciação a "todos" os partidos......

Razão pela qual algumas candidaturas ditas "independentes" tiveram um relativo sucesso nas últimas eleições autárquicas. Como foi o caso do Porto. No entanto, os indícios que surgem nestes primeiros quatro meses de governação de Rui Moreira mostram que, afinal, não parece haver alterações significativas nos procedimentos.

De facto, se é verdade que estes quatro meses, ainda por cima com as limitações legais e orçamentais impostas, não permitiram nomear muitos "boys", salta à vista a cumplicidade do presidente "independente" com os "boys" e "girls" nomeados no consulado do seu apoiante Rio. Que proclamou, ufano, que tinha reduzido em centenas o número de funcionários municipais, esquecendo-se que no mesmo período meteu nos quadros da Câmara e das empresas municipais dezenas de homens e mulheres cujo principal atributo era o de serem seus apoiantes.

Opercurso foi simples: entraram como assessores e adjuntos (cargos esses que, efetivamente, deviam ser de confiança política, cessando com a mudança dos titulares políticos) e, depois, passaram para a estrutura municipal, nomeadamente através das empresas municipais, onde os concursos de recrutamento são mais liberais, com salários, muitas vezes, principescos e sem qualquer relação com a atividade desenvolvida.

Coloca-se então a questão de saber se um presidente "independente", conhecedor desta situação, deve fechar os olhos a esta situação ou se, constatando que, efetivamente, o erário público está a ser delapidado para pagar favores políticos, dá um "murro na mesa" e "limpa" a estrutura municipal.

Bem sei que, por força das circunstâncias, muitos dos "boys" e "girls" nomeados por Rio foram apoiantes, e mesmo candidatos, de Rui Moreira. Mas este é um desafio clarificador: ou Rui Moreira se comporta como o "independente" que faz jus a esse título e abraça, custe o que custar, as causas que diz defender, ou Rui Moreira comporta-se como um "independente" manietado pelos interesses partidários que estiveram na origem da sua candidatura......

A recente nomeação de um dos braços-direitos de Rio para o júri dos concursos para os cargos dirigentes da Câmara Municipal do Porto indicia que Rui Moreira se inclina para a segunda opção! Mas ainda vai a tempo de mudar...

Retirada daqui