Viajando por países como Cabo Verde pensa-se muitas vezes no que podemos aprender com os mais pobres.
Desde o espírito de iniciativa, presente em tanto pequeno comércio, mesmo de rua, à poupança de recursos quando são escassos, difíceis de obter ou caros.
Claro que se alguém disser que temos de aprender este espírito de poupança e iniciativa de entreajuda, não faltarão críticas de falsos moralistas a afirmar que a política do FMI diz que vivemos acima das nossas possibilidades e que eles nos querem roubar, matar ou qualquer coisa do estilo.
Mas, por acaso, deparei ontem com um interessante estudioso inglês que, no jornal 'Público' dizia isto mesmo - referindo-se concretamente à medicina e aos serviços de Saúde: que temos muito a aprender com os pobres. Tendo sido responsável, no tempo do governo trabalhista, pelo Serviço Nacional de Saúde Inglês (NHS), tendo estudado com cuidado o que se passa em vários países do mundo, nomeadamente na Índia e em certos países de África, está a fazer um relatório sobre a situação portuguesa a pedido da Fundação Gulbenkian. E, com este manto de respeitabilidade feito de experiência e independência, diz: "A necessidade faz o engenho. As pessoas pobres conseguem ser muito inovadoras".
Se um político o declarasse, cairia o Carmo e a Trindade. Mas esta é a mais pura das verdades. Na Saúde, onde há uma equação quase impossível - a saúde não tem preço, mas tem custo - todos temos de aprender a poupar. Basta ver que, do ponto de vista Nigel Crisp, o especialista que cito, o principal problema de Portugal em termos de saúde está na taxa de crescimento da diabetes tipo 2; o que pode ser radicalmente melhorado com pequenas alterações do estilo de vida.
As outras quatro prioridades que ele identificou, foram por esta ordem, melhor organização dos serviços; melhorar os cuidados primários, baseando-os na comunidade e na família (onde os pobres nos têm muito a ensinar, também); melhorar os serviços de algumas regiões e, em quinto lugar, simplificar o sistema.
Mas, o que me prendeu a atenção foi esta frase: "A lição fundamental que aprendemos com os países pobres é que as pessoas criativas que não têm meios usam as comunidades para dar resposta aos problemas de saúde" adiantando que não separam a saúde de outras questões, como a educação e usam sistema informais de prestações de cuidados. Algo que alguns dos nossos médicos e sindicatos achariam um retrocesso civilizacional.
Porém, a verdade é esta: já não é o ocidente que tem de dar lições. Embora podendo ajudar e ensinar muita coisa, tem de estar disponível para, de igual modo, aprender.
E este é o meu ponto fundamental de hoje.
Henrique Monteiro, aqui