terça-feira, 24 de dezembro de 2013

ERA UMA VEZ...

ENTREVISTA COM O PAI NATAL
Fomos encontrá-lo a fazer embrulhos e a arrumar sacos e malas no porta-bagagens do trenó

Para meter conversa, visto que o Pai Natal, sujeito muito modesto, não gosta de ser entrevistado, perguntámos-lhe: 
- Então, muito trabalho, este ano? 
- Nem calcula! É que as meninas e os meninos estão cada vez mais exigentes. Só querem brinquedos caros e volumosos. Ora, eu, francamente, já não tenho forças para carregar com tanta coisa! Tome o peso a esta caixa, faça favor. 


Nós pegámos na caixa e concordámos que era pesada. 
- É um comboio eléctrico inteirinho, com os comandos, carruagens, baterias, central, estações e apeadeiros. Pois multiplique este peso por centenas e centenas. Veja o meu trabalho! E não tenho ninguém que me ajude. 
Tivemos pena do Pai natal. 
- Claro que os meninos, depois, queixam-se de que eu não trouxe tudo o que eles pedem... Pois como havia de ser de outra forma? Para chegar a todos - e nem faz ideia quanto me custa nem sempre chegar a todos - tenho de reduzir a encomenda de cada um. 

O porta-bagagens do trenó não é elástico e as minhas forças também têm limites. 
- Só a sua paciência, Pai Natal, é infinita - dissemos-lhe nós, a ver o que ele respondia. 
- Nem sempre, meu amigo, nem sempre! Quando recebo cartas como esta, perco a paciência. Ora leia. 
Desdobrou uma folha de papel e deu-nos a ler. A carta era assim: 
"Querido Pai Natal: 
Queria pedir-lhe uma boneca daquelas grandes, que eu vi, no outro dia, numa montra, quando fui sair com a minha mãe. Queria o enxoval completo da boneca, uma banheira para lhe dar banho, um pente, uma escova e um secador para cabelos de bonecas. Queria também um serviço de chá para bonecas, um triciclo, um jogo e uma lapiseira azul. Para a minha irmã não mande nada, porque ela só sabe estragar-me os brinquedos. 
Beijinhos da sua amiga 
Luísa" 

- Leu tudo? Que tal aquele bocadinho em que ela diz para eu não dar nada à irmã? Veja se não é de um pessoa perder a cabeça! 
- Mas não a perca, Pai Natal - dissemos. - A sua cabeça, onde cabem milhões de nomes, moradas e pedidos, é preciosa. 
- Nem me fale disso! Já não tenho memória para tanta coisa. Os pedidos são muitos, as listas aumentam de ano para ano... 
- Não diga que já trocou encomendas? - perguntámos. 
O Pai Natal, com a sua longa experiência, deve ter imensas histórias para contar. 
- Se tenho! - e as bochechas rosadas do Pai Natal alargavam-se num grande riso. - Calcule que, uma vez, num bosque, o Lobo Feroz confundiu-me com o Capuchinho Vermelho. Dei-lhe uma cacetada como prenda, mas deixei-lhe um livro com a ?História do Capuchinho Vermelho", para que ele lesse até ao fim. 
- Que faz o Pai Natal quando o Natal acaba? - perguntámos. 
- Descanso umas semaninhas e, depois, ponho-me a trabalhar para o Natal seguinte. Viajo muito, corro todas as exposições e fábricas de brinquedos, tiro apontamentos, faço as minhas encomendas... Quando calha, disfarço-me de velho mendigo e vou ter com os meninos, que tantos trabalhos me deram. 
- E que sucede? Os meninos acarinham-no, falam consigo, dão-lhe alguma prenda? - quisemos nós saber. 
- Isso sim! Sofro cada desilusão, meu amigo, que é preferível ficarmos por aqui. Talvez para o ano que vem lhe conte mais coisas. 

Couberam ao Pai Natal as últimas palavras da entrevista. Aguardemos um ano e, até lá, vejam se não desiludem o Pai Natal.

António Torrado e Cristina Malaquias, aqui